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TANGO DA DÍVIDA
Presidente vai ao Congresso, onde calote havia sido anunciado sob aplausos em 2001, e critica antecessores
Kirchner decreta fim da moratória argentina
SILVANA ARANTES
ENVIADA ESPECIAL A MONTEVIDÉU
O presidente argentino, Néstor
Kirchner, escolheu ontem um cenário simbólico para decretar a
saída do país da "mais gigantesca" moratória da história (US$
100 bilhões), com "o maior desconto de dívida" já realizado
(75% do valor total).
Kirchner discursou na sede do
Congresso Nacional, onde, em
2001, o calote foi anunciado, sob
aplausos, pelo então presidente,
Adolfo Rodríguez Saá.
A maioria dos credores nacionais e internacionais apresentou
seus títulos para a troca. A dívida
argentina foi integralmente reestruturada, disse Kirchner, arrancando de deputados e senadores
novo coro de aplausos.
Na platéia estava o ministro da
Economia, Roberto Lavagna, que
amanhã divulgará o índice final
de aceitação da troca de títulos,
encerrada na última sexta.
Durante o fim de semana, o governo divulgou estimativa de adesão entre 70% e 80%.
Sem festejar
Quando apresentou a proposta
de reestruturação, em janeiro
passado, Lavagna reprovou a atitude do Congresso em 2001, afirmando que o "default" nunca deveria ter sido festejado.
Na ocasião, o ministro sustentou que, ainda que a reestruturação argentina terminasse com
êxito, os custos enormes da moratória impostos ao país impediam
que o calote argentino servisse de
exemplo ou precedente para outros países ou "para nós mesmos,
no futuro".
Ontem, Kirchner se referiu também ao calvário argentino e às terríveis feridas que as políticas do
passado produziram no país e
procurou se afastar de seus antecessores.
"Não somos o governo da moratória [Rodríguez Saá], nem o
governo da convertibilidade [Fernando de la Rúa], nem o governo
do endividamento externo [Carlos Menem]", afirmou, para depois anunciar que a Argentina seguirá um novo modelo econômico daqui para a frente.
"Defenderei os interesses do povo argentino com unhas e dentes", disse Kirchner, depois de invocar dos capitalistas que investiram no país boa-fé e o reconhecimento de que todo investimento
implica riscos.
Boa-fé
A utilização da expressão boa-fé
por Kirchner não é aleatória. Durante todo o processo de reestruturação da dívida argentina, o
FMI recomendou que o país vizinho demonstrasse boa-fé com
seus credores e não agisse de maneira unilateral.
Em indisfarçável tom de vitória,
o presidente argentino afirmou
que, pela primeira vez na história
da Argentina, um processo de
reestruturação culmina com
drástica diminuição da dívida -a
relação entre a dívida argentina e
o PIB (Produto Interno Bruto) do
país deve cair de 120% para cerca
de 80% com o processo de reestruturação.
Kirchner fez ainda uma cobrança indireta ao governo brasileiro,
quando abordou a necessidade de
ampliação dos mercados no âmbito do Mercosul e fora dele, citando a China como exemplo.
O presidente argentino afirmou
que o Tratado de Assunção (que
fundou o Mercosul) é hoje cumprido de forma parcial e deve assegurar benefícios equilibrados
entre os países que formam o
Mercosul.
Após o discurso, Kirchner viajou para Montevidéu, onde acompanhou a solenidade de posse do
presidente socialista Tabaré Vázquez.
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