São Paulo, domingo, 02 de março de 2008

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Real forte obriga empresa a se adaptar

Para sobreviver com câmbio desfavorável, exportador busca mercados não explorados e importa insumos e máquinas

Especialistas divergem sobre como conter a trajetória de alta do real sem mudar as regras do jogo e causar estragos à economia

DA REPORTAGEM LOCAL

Se o país não quebra com a moeda em seu maior valor real desde 1980 e os economistas não sabem como impedir a trajetória de apreciação do real sem mudar as regras do jogo, alguns exportadores deixaram de fazer coro pedindo uma desvalorização e aprenderam a fazer negócios mesmo com uma taxa de câmbio desfavorável.
Para o consultor Emilio Garofalo, ex-diretor do BC, a maioria dos exportadores se adaptou ao cenário de moeda forte, problema crônico dos principais países emergentes concorrentes, com exceção da China, que tem câmbio fixo.
"Em vez de ficar reclamando do câmbio, o exportador pensou: "Como uso essa taxa a meu favor?" Viu que pode pegar um financiamento mais barato [no exterior] e importar insumos e máquinas. Os calçadistas importam até o revestimento interno do sapato", disse.
O presidente da Abracomex (Associação Brasileira de Comércio Exterior), Primo Roberto Segatto, concorda e cita o exemplo dos calçadistas brasileiros que encontraram um nicho para exportar sapatos com qualidade superior aos produtos chineses, mas inferior aos italianos. "A indústria de calçados tentava competir com a China, mas não conseguia. Também não tinha a qualidade da Itália. Estamos no meio: pegamos uma classe média que demanda produtos mais sofisticados, mas não quer o preço da Itália. O caminho é procurar se diferenciar e agregar algo de que o mercado precisa. Aí está o crescimento das exportações, que permite sobreviver com um câmbio desses", disse.
Para Octávio de Barros, diretor de pesquisa do Bradesco, a competitividade tem de ser buscada "fora dos portões das fábricas". "A busca está nas reformas que reduzem os custos de transação que infernizam a vida das empresas."
O ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira, que pilotou uma desvalorização em 1987, defende a tese de que a valorização do real decorre da combinação da entrada, "a rodo", de capital com o que chama de "doença holandesa" -derivada da exportação de um recurso natural ou humano com preços mais baixos do que no restante do mundo e que inibe o desenvolvimento de outros setores no país. Cita como exemplos os exportadores de petróleo.
"Para neutralizar, coloca-se um imposto sobre a exportação, de modo que a produção deixa de ser rentável a uma taxa de câmbio alta. O câmbio se deprecia e permite a competitividade dos demais setores. Para diminuir a entrada a rodo de capitais, tem de comprar reservas -como o governo está fazendo. Quando não basta, controla a entrada de capital."
O ex-ministro Mailson da Nóbrega vê medidas como controle de capitais ou tributação de exportação como um "retrocesso injustificável". "Tenderiam a depreciar a moeda, menos pelos seus efeitos nos fluxos e mais pelo que gerariam de perda de confiança no país. O dano para a economia e a sociedade seria enorme", disse.
Para Alexandre Schwartsman, ex-diretor do BC, a discussão da sobrevalorização do real não pode ser feita sem considerar o funcionamento da economia. Ele afirma que a sobrevalorização seria percebida por duas distorções: um desequilíbrio nas contas externas ou uma contração na demanda. "Não é o caso. O déficit [externo] é pequeno e a demanda está aquecida. Em 1999, havia déficit e demanda retraída."
Fernando Cardim, da UFRJ, defende a redução dos juros como medida para conter a escalada do real. "A regulação da conta de capitais, a redução dos juros e a intervenção no câmbio permitiriam a sustentabilidade das contas externas." (TS)


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