São Paulo, domingo, 02 de abril de 2000


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CERVEJAS
Empresa rola R$ 190 milhões de R$ 300 mi
Antarctica "força" rolagem de dívida

LEONARDO SOUZA
da Reportagem Local

A Antarctica pressionou investidores para que renovassem parte de um empréstimo contraído no ano passado, no valor de R$ 300 milhões, devido à sua fragilidade financeira.
Em setembro de 99 a cervejaria emitiu notas promissórias nesse valor e rolou R$ 190 milhões que venceram na semana passada. Alegou dificuldade para desembolsar os recursos, mas disse que aumentaria a remuneração para quem ficasse com os papéis por mais 180 dias.
Essa versão foi confirmada por três profissionais do mercado financeiro, que adquiriram os títulos para fundos de investimentos das instituições em que trabalham. Um deles disse que a rolagem foi "meio que compulsória".

Sem pressão
A assessoria da empresa admitiu que a cervejaria requisitou a rolagem dos títulos, devido à demora da aprovação da AmBev, fusão entre a Antarctica e a Brahma. Mas negou quaisquer pressões ilícitas.
Acrescentou também que cerca de R$ 100 milhões dos R$ 110 milhões que faltam para completar a emissão de R$ 300 milhões ainda não venceram, mas que também deverão ser rolados.
As notas promissórias são títulos que representam dívida e pagam juros pelo dinheiro emprestado. Pela taxa básica da economia (Selic) de hoje, que está em 18,5%, os papéis da emissão original pagariam ao investidor 19,10% ao ano. Quando foram renovados, o prêmio aumentou para 20,53% ao ano.
Segundo informações do mercado financeiro, empresas de boa saúde financeira têm conseguido emitir títulos no mercado interno a prêmios entre 19,10% e 19,20%. Empresas em situação complicada pagam juros maiores, por volta de 20,50% ao ano.
O estado financeiro da Antarctica se complicou bastante no ano passado. De acordo com dados da consultoria Austin Asis, as dívidas de curto prazo (que precisam ser pagas em menos de um ano) aumentaram em setembro de 99, em relação ao mesmo mês de 98, 236%. Enquanto o endividamento de longo prazo caiu 92,30%, no mesmo período.
Significa dizer que a cervejaria trocou uma dívida mais fácil de administrar (a de longo prazo) por outra que piora sua situação (a de curto prazo).

Recompra
Na rolagem das notas promissórias a Antarctica estabeleceu cláusula que lhe reserva o direito de recomprar os papéis dentro de 60 dias. Ou seja, o tempo necessário para a aprovação da AmBev. A empresa, então, poderia reaver os títulos e deixar de pagar os juros altos.
Segundo a assessoria da empresa, cerca de 12 investidores institucionais, entre bancos e fundos de pensão, compraram os papéis na emissão inicial.
Diante da dificuldade financeira da companhia, a explicação mais provável para o interesse dos investidores é uma só: a certeza da aprovação da AmBev pelo Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), mesmo acreditando que seriam impostas restrições ao negócio.
Para um dos investidores, a lógica era simples: uma vez realizada a união entre as cervejarias os papéis não seriam mais Antarctica, e sim Brahma.
Para o diretor da área de renda variável de uma empresa de administração de recursos de terceiro, muitos dos detentores dos papéis fariam a rolagem dos títulos naturalmente, por acreditar que iriam se valorizar com a criação da AmBev.

Temores
Contou, no entanto, que uma parcela daqueles que compraram os papéis preferia não ficar com os títulos. A razão foi o temor de que, pela demora da decisão do Cade, a fusão não fosse aprovada pelo órgão.
O diretor da administradora de recursos afirmou que o tratamento dado pela empresa aos que não não queriam continuar com os papéis não foi correto.
Disse que os executivos que estão à frente da AmBev, o que inclui funcionários da Brahma, os pressionaram para manter o investimento porque a situação da Antarctica não era boa e que melhor seria esperarem pela fusão.
Ao contrário da Antarctica, a Brahma está em ótima situação financeira e com bastante dinheiro em caixa.
Em 1998, o lucro líquido da Brahma foi mais de cinco vezes superior ao registrado pela Antarctica.

Prejuízo
Em setembro do ano passado a Antarctica registrou prejuízo líquido de R$ 226,814 milhões em relação ao mesmo mês de 98. Suas dívidas totais no período aumentaram 83,36%.


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