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OPINIÃO ECONÔMICA
A questão da política industrial
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O governo anunciou, com
pompa e circunstância, uma
série de medidas pontuais a que
chamou de política industrial.
Como sempre acontece no Brasil,
o centro da ação do governo está
na criação de linhas de crédito
nos bancos públicos federais. Algo
como US$ 5 bilhões estará disponível para alguns setores eleitos
pelo governo durante os próximos
anos.
Sempre fui um defensor da
aliança entre o setor público e as
empresas privadas para dar ao
Brasil um horizonte de prazo
mais longo para os investimentos
produtivos. A essa ação foi dada,
principalmente pela mídia, o nome de política industrial, embora
seu campo de ação vá muito além
da indústria tradicional. No
mundo produtivo de hoje, as
fronteiras da atividade econômica não podem mais seguir os
marcos históricos.
O desenvolvimento tecnológico
dos últimos anos, principalmente
no campo das telecomunicações,
fez com que a atividade produtiva das empresas pudesse ser dividida em redes espalhadas por vários países. Com isso, novas fronteiras se abriram para economias
menos desenvolvidas e sem a capacidade de desenvolvimento tecnológico dos países mais avançados nesse setor. Por esse caminho,
já trilham países como a Índia, a
China e outras nações da Ásia.
Nesse grande rearranjo mundial, existe espaço para que economias com desenvolvimento
tardio, como a brasileira, possam
recuperar um pouco do tempo
perdido. Mas, para que isso aconteça, uma série de precondições
precisam ocorrer, de modo a permitir que a atividade empresarial
privada canalize suas energias de
modo eficiente. Para mim, política industrial é a construção dessa
agenda estratégica e a definição
da estrutura microeconômica necessária para que ela seja implementada de maneira eficiente. O
crédito dirigido é apenas um entre vários itens dessa agenda.
O passo inicial dessa longa e difícil caminhada deve ser a definição do espaço que a economia
brasileira pode ocupar neste
mundo novo. A fonte para tal
exercício deve ser o próprio mercado, que, naturalmente, envia os
sinais vitais para quem observa
seu funcionamento. Clima, riquezas minerais e tamanho e qualidade do mercado interno são algumas das variáveis que devem
ser observadas para visualizar
quais as cadeias produtivas que
podem ser expandidas em um dado espaço nacional.
Um erro comum cometido no
desenho de uma política industrial -isso ocorreu à época da ditadura militar- é o de não respeitar esses sinais externos e fixar
como seus objetivos o desenvolvimento de setores que não encontrarão condições ideais de competitividade em relação a outras
economias. No caso dos governos
militares, o objetivo estratégico
era o da segurança interna e o poder mundial do Brasil, e não a
construção de uma economia
competitiva e eficiente. É evidente
que esse projeto ambicioso deu
com os burros n'água.
Respeitados esses sinais externos, é preciso construir uma institucionalidade econômica coerente com a que prevalece no mundo
externo. Competir nesse ambiente altamente eficiente exige reformas microeconômicas profundas.
Estrutura tributária, regras atualizadas para o mercado de trabalho, mercado de crédito e de capitais eficientes e competitivos e sistema legal que garanta o cumprimento das regras dos contratos
privados são alguns dos pontos
principais dessa agenda.
Outro ponto crítico desse arcabouço competitivo é a infra-estrutura física -principalmente nas
áreas do transporte e comunicações- do país. Nesse mundo organizado em rede, os movimentos
entre seus vários elos precisam ser
realizados com eficiência e a custos competitivos. A questão energética é outro ponto forte desse
grupo de condições eletivas para
um projeto exitoso de desenvolvimento.
Para que essa tarefa, de colocar
nossa economia no caminho do
desenvolvimento sustentado, possa ser realizada, é necessária,
também, a construção de um consenso nacional de que essa parceria, entre governo e mercado, é a
melhor alternativa existente. Não
sinto que exista hoje esse entendimento. O pensamento dominante
no governo Lula ainda é o de que
cabe ao governo apenas a missão
de manter um equilíbrio macroeconômico adequado. A decisão de
investimento é função apenas do
setor privado.
Enquanto esse entendimento
prevalecer, espetáculos como o
que aconteceu nesta última quarta-feira na CNI, em Brasília, serão apenas fogos de artifício para
equilibrar as demandas políticas
do setor produtivo.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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