São Paulo, quinta-feira, 02 de abril de 2009

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CÚPULA GLOBAL

G20 adotará "regulação do século 21", prevê Obama

Americano diz que reunião dará início a profundas reformas do sistema financeiro

Para Gordon Brown, líderes passarão por 5 testes, que incluem cooperação mundial, ajuda aos mais pobres e rejeição ao protecionismo


CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A LONDRES

O anfitrião da cúpula do G20, o primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, antecipou ontem, ao lado do presidente Barack Obama, o que chamou de "cinco testes" que o grupo das maiores economias do planeta enfrentará na sua cúpula de hoje. Na verdade, mais que "testes", trata-se de uma antecipação do que será anunciado ao término do encontro de líderes.
Obama, de sua parte, definiu um dos cinco pontos como a adoção de "regras do século 21 para todo o sistema financeiro", em alusão à profunda reforma do modelo de supervisão/regulação de bancos e entidades afins que constou do documento dos ministros da Fazenda e presidente de bancos centrais do G20, emitido há três semanas, e figurará em texto complementar assinado hoje pelos chefes de governo.
Com isso, parece pura bravata o fato de tanto o presidente francês, Nicolas Sarkozy, como a chanceler alemã, Angela Merkel, terem ontem insistido, em entrevista conjunta, que uma "forte regulação" é item inegociável para o documento da cúpula. Sarkozy chegou a pedir uma regulamentação "do século 21", exatamente a que Obama anuncia.
Brown, aliás, havia posto a questão da regulação como o primeiro dos testes, aceitando assim a ênfase que Sarkozy e Merkel colocam nessa questão.
Obama disse também que pelo menos em parte a crise atual decorre de um "desencontro" entre sistemas regulatórios nacionais (e "inadequados") e "mercados internacionais altamente integrados".
O problema é que até agora o G20 não definiu se vai criar um novo ente regulador/supervisor supranacional ou se apenas estabelece padrões globais comuns a serem aplicados pelos reguladores nacionais, conforme suas próprias legislações.
No caso dos EUA, a proposta do governo Obama é a de transformar o Federal Reserve, seu banco central, em um super-regulador, mas nacional.
Os demais testes que o G20 enfrentará e superará, ao menos na visão otimista de Brown e Obama, são estes:

Restaurar o crescimento
Os governantes reiterarão o que disseram seus ministros e BCs no dia 14 passado: "Fazer tudo o que for necessário para estimular o crescimento", expressão aliás que Obama utilizou literalmente.

Cooperação internacional
Brown afirmou que "nunca houve um nível de cooperação global" como o que está se dando agora.
O premiê britânico chegou a lembrar que, na crise dos anos 30 do século passado, os governos levaram anos para reagir, ao passo que, agora, em questão de meses, foram tomadas inúmeras providências que, a juízo dos dois governantes, permitirão superar a crise.
Obama aproveitou para negar a insistente versão de que há uma divergência forte entre líderes europeus (Sarkozy e Merkel) e os Estados Unidos, que, segundo a versão, quer mais pacotes governamentais de apoio à economia.
"Não há desacordo sobre a necessidade de os governos agirem", comentou o presidente norte-americano. Lembrou, com razão, que "todos os países do G20 se engajaram em esforços fiscais". Contabilizou, a propósito, algo em torno de US$ 2 trilhões como a quantia envolvida nesse esforço, o que dá mais de um PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil.
Para Obama, a divergência foi "nas margens", porque "o principal não está em questão". Na margem, quer dizer o seguinte: os europeus contabilizam como gasto fiscal o que o jargão chama de estabilizadores automáticos, ou seja, a imensa rede de proteção social comum à Europa e bem menos generosa nos Estados Unidos.
Por essa contabilidade, os gastos foram equivalentes de um lado e do outro do Atlântico.

Rejeitar o protecionismo
Esse "teste" é um clássico de reuniões internacionais, mas o G20 não passou nele, porque, a partir da cúpula de Washington, 17 de seus integrantes adotaram 47 medidas de restrição ao comércio, pelas contas do Banco Mundial.
Resta ver se a nova cúpula, que vai repetir a promessa, passa na segunda época.

Ajudar os mais pobres
Segundo Obama, eles estão, com a crise, "mais desesperados do que já estavam".
O presidente americano, coerente com o tom de sua pregação de campanha, disse que é preciso atentar para a "dimensão humana" da crise: "As pessoas estão perdendo suas casas, seus empregos, suas poupanças".
Nesse teste, o G20 passará. Haverá recursos para os países mais pobres enfrentarem a crise (o ministro Guido Mantega chegou a falar em US$ 1 trilhão) e um pacote de ao menos US$ 100 bilhões para financiar o comércio internacional, que ficou travado pela crise.
Nesse caso, não são só os países mais pobres que se beneficiam. Até o Brasil espera lucrar, na medida em que seu comércio com os países do Sul está em queda justamente pela falta de financiamento que os parceiros enfrentam (o Brasil também enfrenta, mas seu problema de crédito é algo menos grave).
Faltou mencionar, entre os "testes" do G20, a reforma das instituições financeiras internacionais, com um reforço considerável no papel do FMI e maior poder de voz e voto para os países emergentes.
Resumo da história, na palavra sempre otimista de Obama: "Não vamos resolver todos os problemas, mas fazer considerável progresso".


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