São Paulo, quinta-feira, 02 de agosto de 2001

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VIZINHO EM CRISE

Risco-país bate novo recorde e chega aos níveis da Nigéria, arrecadação desaba e país espera por socorro

Mercado vê Argentina à beira da moratória

ROGERIO WASSERMANN
DE BUENOS AIRES

A Argentina está mais próxima do que nunca de uma moratória, na visão dos mercados. Apesar do anúncio de um refinanciamento de US$ 1,3 bilhão da dívida de curto prazo, o nível de desconfiança dos investidores sobre a saúde financeira do país voltou ontem a bater seu recorde histórico.
O risco-país Argentina chegou ontem a níveis próximos aos da Nigéria, que tem os maiores índices de desconfiança entre os países emergentes. O indicador chegou a bater em 1.723 pontos, para fechar o dia em 1.686.
O principal fator que provocou o aumento da desconfiança foi a perspectiva do anúncio de uma queda de 8,7% na arrecadação fiscal em julho sobre o mesmo mês de 2000. A queda, confirmada no final da tarde, torna mais difícil o cumprimento da meta de déficit fiscal zero proposta pelo governo.
Ainda existe uma dúvida muito grande entre os investidores sobre a capacidade do país de atingir a meta de déficit zero e de conseguir apoio político para isso. Muitos legisladores, incluindo alguns da própria base parlamentar do governo, continuam criticando o ajuste fiscal proposto. Sem um ajuste muito forte, acreditam os investidores, a Argentina não terá capacidade para honrar os vencimentos de sua dívida pública, que soma US$ 130 bilhões.

Risco-país
O índice de risco-país da Argentina, principal termômetro da desconfiança dos investidores, chegou ao final do dia em 1.686 pontos, 82 acima do fechamento de terça. O recorde anterior do risco-país argentino havia sido 1.629 pontos, no dia 16 de julho.
O risco-país indica a sobretaxa paga pelo país ao tomar empréstimos em relação ao que pagam os EUA, cujos títulos da dívida são considerados os mais seguros. Cada cem pontos de risco-país significam um ponto percentual a mais de sobretaxa.
Especialistas consideram que é impossível para o país retomar o crescimento econômico, após mais de três anos de forte recessão, enquanto o risco-país estiver acima de 800 pontos. Quando o presidente Fernando De la Rúa assumiu o governo, em dezembro de 99, o risco-país era 607 pontos.

Círculo vicioso
Com um risco-país em níveis altos, a Argentina tende a entrar em um ciclo vicioso, no qual a falta de crescimento provoca uma arrecadação menor, mais dificuldades para o cumprimento dos compromissos financeiros e uma alta ainda maior no risco-país.
A Bolsa de Buenos Aires fechou ontem com uma queda de 4,3%. A cotação do Global 2008, principal título da dívida argentina negociado no exterior, caiu 4,8%.
Para inverter o quadro de pessimismo, o governo trabalha para tentar convencer o FMI, outros organismos de ajuda financeira e alguns países desenvolvidos a conceder um novo pacote de ajuda financeira para o país, o que reduziria as especulações sobre uma moratória.
Em 2000, o FMI liderou um pacote de blindagem financeira de US$ 39,7 bilhões. O organismo já admite antecipar para este ano desembolsos previstos pelo pacote, que somam US$ 2,5 bilhões. Mas analistas econômicos consideram que, para eliminar de vez as dúvidas sobre a Argentina, seria necessário um montante ainda maior, de até US$ 10 bilhões.

Letes
As expectativas pessimistas superaram os possíveis impactos positivos que poderia ter ontem o anúncio de um acordo com bancos para refinanciar US$ 1,3 bilhão da dívida de curtíssimo prazo, por meio da troca de Letras do Tesouro (Letes), com vencimento até o final do ano, por outros títulos com vencimento em 2002.
O governo já havia fechado outro acordo com as administradoras locais de fundos de pensão, que se comprometeram a comprar US$ 2,3 bilhões em títulos públicos, que serão utilizados para cancelar outra parte dos US$ 4,3 bilhões em Letes com vencimento até o fim do ano.


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