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"VÔO DE GALINHA'?
Economistas revisam previsão do PIB para cima, mas consideram prematuro o diagnóstico de crescimento sólido
Fôlego da retomada ainda deixa incertezas
DA REPORTAGEM LOCAL
Os indicadores de recuperação
da renda e do emprego e o prognóstico de melhoria do cenário da
atividade industrial brasileira ainda não são suficientes para convencer o mercado de que o crescimento do Brasil é sustentável.
Na visão de representantes de
instituições financeiras e acadêmicos ouvidos pela Folha, o nível
de investimentos permanece modesto para garantir a manutenção
de taxas de crescimento em torno
de 4% pelos próximos anos.
Outro fator que mascara o que
acontece de fato na economia
brasileira, dizem eles, é que a base
de comparação até agora -o primeiro semestre de 2003- é fraca.
No ano passado, a economia brasileira encolheu 0,2%.
"Só saberemos se o crescimento
é sustentável ou não depois de a
economia percorrer um tempo
razoável crescendo [...] Os investimentos pesados não estão ocorrendo, pois exigem horizonte de
confiança maior", diz Francisco
Luiz Lopreato, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
Além disso, alguns economistas
alertam que a recuperação do
consumo doméstico ainda está
apoiada na aquisição de bens de
consumo duráveis (automóveis e
eletrodomésticos), que são atrelados ao crédito. Além disso, a renda ainda não reagiu com intensidade: cresceu pela primeira vez
neste ano em maio, uma elevação
de 3,2% em relação a abril na região metropolitana de São Paulo,
segundo pesquisa Seade/Dieese.
Mas há quem veja com mais otimismo os sinais de retomada da
economia. "O emprego e a economia doméstica têm tido um impulso mais forte agora do que no
começo do ano. Se eles forem
mantidos nesse ritmo, o Brasil pode superar neste ano a taxa de
crescimento do PIB [Produto Interno Bruto] de 4,1% [projeção do
banco]", diz Gustavo Rangel, do
Barclays Capital, em Nova York.
Projeções da OEF (Oxford Economic Forecast) revelam que a
demanda doméstica brasileira deverá crescer 4% em 2004. Em
2003, houve retração de 3,4%.
Tábua de salvação
Se a renda interna ainda é dúvida, o setor exportador continua
sendo a solução. Os economistas
que prevêem a manutenção de taxas maiores de crescimento do
PIB nos próximos anos baseiam
suas expectativas no desempenho
das vendas externas brasileiras.
"O crescimento brasileiro mostra-se fundamentalmente centrado na excelente performance do
setor de agronegócios e das exportações. Acho que será possível
atingir um crescimento de 4% em
2004, que poderá se repetir em
2005", argumenta Antônio Corrêa de Lacerda, da Sobeet (Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica).
Jankiel Santos, do banco ABN
Amro, faz coro. "A manutenção e
a aceleração do quadro externo fizeram com que revíssemos nossa
projeção do PIB para 4,3% em
2004. O saldo comercial deve fechar em US$ 31 bilhões", afirma.
Riscos e "bolhas"
Na esteira do crescimento, entretanto, pode vir o risco de pressão inflacionária. "O quadro hoje
é de um índice de preços no atacado evoluindo a uma velocidade
mais elevada que o índice de preços ao consumidor, em grande
medida porque a recuperação do
poder de compra tem sido lenta",
afirma o economista Rogério Sobreira, professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas). "Quando isso ocorrer, os preços devem crescer no varejo", completou.
O perigo maior, para outros
economistas, não é a inflação de
demanda. "O petróleo está se
mostrando uma ameaça persistente e preocupante. A outra fonte
de pressões inflacionárias tem sido as altas do dólar, propagadas
principalmente por meio de tarifas públicas", analisa Fernando
Cardim, do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
A alta da cotação do petróleo no
mercado internacional não é a
única sombra que paira sobre o
crescimento. O ciclo de elevação
dos juros americanos, iniciado
em junho, pode tornar as condições de crédito para as empresas e
para o governo mais escassas.
Animados com possibilidades
de rentabilidade mais alta nos Estados Unidos, investidores podem migrar de países emergentes,
como o Brasil, para investimentos
considerados mais seguros.
"Uma desvalorização adicional
do real teria como impacto uma
inflação maior no Brasil. Mas esse
não é o principal risco. O maior
perigo no Brasil é o esmorecimento no controle da austeridade fiscal", afirma Sérgio Werlang, diretor do Itaú e ex-diretor do Banco
Central. Mais: "A falta de um
marco regulatório claro e problemas de infra-estrutura são obstáculos para o crescimento", afirma
Jankiel Santos, do ABN Amro.
Entre as incertezas sobre os rumos da economia, está a desconfiança de que o processo de retomada possa ser uma "bolha" de
crescimento. O próprio presidente Lula manifestou esse receio na
semana passada, durante a instalação da Câmara de Política de
Desenvolvimento Econômico.
"Se a economia crescer até 5%
neste ano, acho que estamos razoavelmente seguros. Acima disso, eu já começo a achar que pode
ser uma "bolha". Mas o máximo
que esperaria é o crescimento bater em 4,5%", diz Werlang. "Não é
"bolha". É uma recuperação legítima e já esperada", aponta Gustavo Rangel, do Barclays Capital.
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