|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ESQUERDA ATACA
Economista defende medida para 'negociar, não para roubar'; Conceição Tavares quer o fim de acordo com o FMI
País precisa planejar moratória, diz Furtado
JULIANA RANGEL
DA SUCURSAL DO RIO
O economista Celso Furtado,
83, disse ontem que o Brasil terá
que declarar a moratória da sua
dívida mais cedo ou mais tarde,
para renegociar prazos e juros
com credores, se quiser crescer.
Sem isso, disse ele, o país só terá
fôlego financeiro pelos próximos
um ou dois anos.
"Hoje o governo tem uma política clara que é consolidar sua situação internacional de cooperação plena com o FMI [Fundo Monetário Internacional] e com credores. Isso está permitindo que o
Brasil sobreviva, mas o país está
parado. Em um ou dois anos teremos que encontrar uma saída."
Furtado participou, ao lado da
economista Maria da Conceição
Tavares, 73, do primeiro dia do ciclo de seminários "Brasil em Desenvolvimento", promovido pela
UFRJ (Universidade Federal do
Rio de Janeiro).
Furtado afirmou que, antes de
promover a moratória, o país terá
que adotar o controle do fluxo de
capitais de curto prazo e reforçar
suas reservas. Segundo ele, o país
tem mais condições de renegociar
sua dívida do que há 40 anos.
"Para negociar, é preciso estar
preparado para enfrentar uma
baixa enorme de capitais. Na minha época, quando eu participei
do governo, tínhamos um temor
grande porque, se o Brasil ficasse
privado de petróleo, parava tudo.
Naquela época importava-se
100% do petróleo. Hoje em dia, o
Brasil tem margem muito maior."
Embora considere a possibilidade do fechamento do mercado
para o Brasil -no caso de moratória-, o economista acha que
essa situação seria temporária.
"O mercado financeiro se fecha
até certo ponto. O Brasil é um
bom cliente e um bom negócio.
Portanto ninguém quer uma briga muito séria com Brasil", afirmou. "Sei que a economia não vai
parar, que o Brasil vai poder importar matérias-primas e o essencial para continuar funcionando."
Mas Furtado vislumbra um período de até quatro anos de "penúria" depois da moratória.
Segundo ele, a moratória não se
traduziria em um calote da dívida:
"Seria uma moratória para negociar, não seria para roubar".
O economista disse ainda que o
país está em recessão grave, mas
não aguda. "O que é grave é que
você tem 20% da população economicamente ativa de São Paulo
parada", disse. "Isso cria uma necessidade social muito grande."
Já Maria da Conceição Tavares
disse que o país não pode crescer
em um cenário de inflação alta.
Ela afirmou não ter dúvidas de
que o governo "exagerou na dose" para controlar o inflação, mas
lembrou que, quando o presidente Lula assumiu, o país enfrentava
um momento de fuga de recursos.
A economista defendeu que o
país "se livre das amarras do FMI"
para investir em políticas de saneamento e infra-estrutura. E disse estar pessimista sobre a renovação, com o Fundo, de um acordo que exclua investimento de estatal do cálculo do déficit público.
"O Fernando Henrique quebrou o Estado, endividou o país
até as orelhas e pediu US$ 40 bilhões [ao FMI]. Você acha que, na
hora de renovar o acordo, a gente
vai convencê-los a nos dar US$ 40
bilhões fazendo o que a gente quiser? Tenho sérias dúvidas de que
qualquer país latino-americano
consiga mudar as regras do FMI."
Tavares e Furtado apoiaram a
candidatura de Luiz Inácio Lula
da Silva à Presidência. Professora
emérita da UFRJ e ex-deputada
federal pelo PT, Tavares indicou o
economista Carlos Lessa para a
presidência do BNDES.
Lessa sofre hoje pressão de empresários descontentes com sua
gestão, vista negativamente pelo
governo. Conceição Tavares criticou as restrições de empréstimos
dos bancos oficiais. "A sorte é que
ainda não nos tomaram todos os
nossos bancos. Mas o FMI não
deixa o BNDES e a Caixa emprestarem para as prefeituras investirem em saneamento."
Questionada sobre o possível
enfraquecimento de Lessa, a economista disse: "Não vou falar nada sobre os meus amigos nem sobre os meus inimigos".
Texto Anterior: Comércio mundial: Brasil já vê risco de "nova Seattle" no encontro da OMC em Cancún Próximo Texto: Saiba mais: Economista criou a Sudene e dirigiu a Cepal Índice
|