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LUÍS NASSIF
A estratégia para a crise externa
Pensador sério, criativo,
intelectualmente honesto e
sem vezo ideológico, no final dos
anos 80 o ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira patrocinou
um plano de reestruturação da
dívida que, se implementado,
teria poupado anos de sacrifício
inútil para o país. Tratava-se de
um projeto de securitização da
dívida externa brasileira, que
permitiria estender o prazo de
pagamento e obter deságios,
dentro de uma estratégia negocial legítima -posto que era
matematicamente comprovado
que o país não teria condições
de arcar com os compromissos,
depois que o Cruzado liquidou
com os superávits comerciais.
O plano esbarrou em duas linhas politicamente preconceituosas. De um lado, no discurso
nacionalista-vazio de Dilson
Funaro, que politizou a questão
transformando a inevitabilidade da moratória em desafio político, provocando a ira gratuita
dos credores. De outro, na subserviência medíocre aos interesses internacionais por parte de
seu sucessor, que descartou o
plano e se dispôs a pagar integralmente o serviço da dívida,
ajudando a jogar o país em uma
hiperinflação e prorrogando
inutilmente a crise interna brasileira. Tanto o plano era factível que foi relançado depois,
com o nome de Plano Brady.
Pois é com esse mesmo instrumental analítico que Bresser Pereira analisa o momento atual.
A economia brasileira é solvente
ou não é? A resposta depende
dos credores internacionais, não
de Lula ou Fernando Henrique
Cardoso. Se continuarem financiando o país, será solvente. Se
interromperem o financiamento, insolvente.
O que não pode ocorrer é a repetição da tragédia argentina.
Lá se chegou a uma situação-limite, e o país passou a se socorrer do FMI (Fundo Monetário
Internacional) para quê? Só para prolongar uma situação insolúvel. O país é superavitário hoje
em dia, mas não consegue acumular reservas porque o que entra é remetido para fora.
No plano externo, a situação
da economia brasileira, hoje em
dia, é muito melhor que a da
Argentina por vários fatores. O
país conta com reservas e conseguiu virar a sua balança comercial. Deve fechar o ano com superávit comercial superior a
US$ 8,5 bilhões, e há quem aposte em superávit muito maior no
próximo ano.
No plano externo, neste momento, há uma situação até certo ponto confortável, enquanto
o Banco Central tiver reservas
em caixa. Na edição de ontem
da Folha, o correspondente
Marcio Aith apresentou as conclusões do seminário do Institute for International Economics
com um conjunto excepcional
de analistas internacionais.
Com exceção de John Williamson, houve certo consenso de
que o Brasil terá que reestruturar a dívida.
Se o estupro é inevitável, como
agir? Confira-se que a inevitabilidade ou não depende apenas
dos agentes internacionais. Se
não se restabelecer o fluxo de investimentos após as eleições, de
nada adiantará contar com os
recursos do FMI. Servirão apenas para postergar uma situação inevitável, fazendo o país
entrar nela fragilizado.
A melhor situação será a recomposição do fluxo de financiamentos. Se não houver a possibilidade, a melhor alternativa
é o país defender as suas reservas e aproveitar a virada na balança comercial para montar
sua estratégia.
Há dois tipos de credores a
considerar: os pretéritos e os futuros. Uma dívida impagável
compromete a vida do credor
passado (porque uma moratória descontrolada transformaria em pó seus créditos) e impede a vinda do credor futuro. Por
isso mesmo, uma renegociação
controlada seria melhor do que
esperar sentado o "default".
Com reservas e superávit, o país
teria fôlego para renegociar prazos e deságios, viabilizando a dívida passada e abrindo espaço
para o retorno dos fluxos de recursos novos, assim que o mercado internacional se estabilizar.
Para tanto basta apenas ter
clareza nos propósitos, não politizar a discussão nem -do lado
oposto- sacrificar os interesses
nacionais para uma causa impossível.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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