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OPINIÃO ECONÔMICA
Revolução permanente contra a burocracia
GESNER OLIVEIRA
O relatório de Desenvolvimento 2005 do Banco Mundial divulgado nesta semana
mostra como é dura a vida do
empreendedor brasileiro. Produzir e inovar no Brasil se assemelha mais a uma corrida de obstáculos do que a uma atividade corriqueira que deveria em princípio
contar com o apoio irrestrito do
Estado.
As barreiras podem ser encontradas nas quatro áreas destacadas pelo Banco Mundial que em
seu conjunto determinariam o
clima para o investimento no
país.
A primeira diz respeito à estabilidade e à segurança de regras. A
estabilidade de preços obtida depois do Plano Real foi um grande
avanço. Mas o país engatinha em
termos de segurança de regras. O
enorme custo e dificuldade para
fazer valer os contratos, a elevada
criminalidade no campo e na cidade e o desrespeito freqüente aos
direitos de propriedade inibem a
inversão produtiva e o desenvolvimento dos mercados. De acordo
com o Banco Mundial, 76% das
empresas consultadas no Brasil
consideram a instabilidade de regras um dos principais obstáculos
para o investimento.
A segunda área é a regulatória e
tributária. Não surpreende que o
excesso de regulação (e, freqüentemente, de má regulação), bem
como a estrutura tributária, seja
visto como grandes problemas.
Além da carga tributária asfixiante, a empresa no Brasil enfrenta enorme custo burocrático.
O registro de um negócio no Brasil requer 152 dias, cerca de três
vezes a média mundial. Essa
marca só é ultrapassada por Congo, Haiti, Laos e Moçambique. Na
Austrália, são necessários somente dois dias. O esforço para fazer
valer um contrato requer 566
dias, contra 425 na Índia e 388 na
média dos países pesquisados.
Como hoje é véspera de eleição
para prefeito, é bom lembrar que
uma parcela não desprezível de
dificuldades burocráticas se origina de exigências dos governos locais. E que a desburocratização
vai exigir um esforço articulado
de todas as esferas governamentais.
Há aqueles que julgam que problemas de cumprimento de contratos e estabilidade de regras interessam apenas aos grandes investidores ou às grandes empresas. Nada mais equivocado. As
pequenas e médias empresas e os
pobres são os que mais sofrem,
porque não dispõem de recursos
para travar a guerra burocrática.
A terceira área destacada pelo
Banco Mundial é a de financiamento e infra-estrutura. Dadas a
dificuldade de acesso a crédito no
Brasil e a fragilidade dos serviços
de infra-estrutura, não surpreende que esse tenha sido percebido
como um dos principais obstáculos no Brasil.
A quarta área é a de relações
trabalhistas, destacada por mais
da metade das empresas consultadas como um fator inibidor.
As dificuldades nas quatro
áreas de política pública discutidas pelo Banco Mundial comprometem as taxas de investimento e
inovação e, conseqüentemente, o
crescimento da economia.
Não há solução simples ou pontual para os problemas diagnosticados no Relatório de Desenvolvimento de 2005. É preciso um esforço sistemático e ininterrupto
de mudança. No tocante à desburocratização, é preciso uma verdadeira revolução cultural. Ou,
mais radical ainda, é preciso uma
revolução permanente.
Leon Trostky desenvolveu o
conceito de revolução permanente para demonstrar que a revolução soviética não poderia ter êxito em um só país e que não poderia se restringir a reformas superficiais. Ironicamente, o mesmo
termo pode descrever aquilo que é
necessário não para destruir o capitalismo, como queria Trostky e
os bolcheviques; mas, pelo contrário, para assegurar os direitos de
propriedade e o desenvolvimento
dos mercados nas economias
emergentes!
Gesner Oliveira, 48, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia
(Berkeley), professor da FGV-EAESP, sócio-diretor da Tendências e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
E-mail - gesner@fgvsp.br
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