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ESCÂNDALO
Editores e analistas receberam dinheiro da empresa para prestar assessoria, mas omitiram informação dos leitores
Colapso da Enron atinge jornalistas nos EUA
MARCIO AITH
DE WASHINGTON
O constrangimento causado pelo escândalo da quebra da empresa de energia norte-americana
Enron ultrapassa os limites da política e do mundo corporativo e já
atinge o universo do jornalismo
econômico dos EUA.
Com o desdobramento das investigações sobre a maior concordata da história do país, colunistas e jornalistas estão reconhecendo publicamente que ganharam
dinheiro para aconselhar a companhia, dar palestras para sua diretoria ou escrever discursos para
Keneth Lay, o controverso fundador e ex-presidente da Enron.
Uma miríade de profissionais e
colaboradores está sendo exposta
no turbilhão do escândalo. Entre
eles estão Peggy Noonan, colunista do "Wall Street Journal", Lawrence Kudlow, da rede de TV
CNBC e da revista "National Review", Bill Kristol, editor da revista "Weekley Standard", e Irwin
Stelzer, da mesma revista.
Embora as circunstâncias sejam
distintas, seus nomes se somam
ao do economista Paul Krugman,
que recebeu US$ 50 mil para integrar, em 1999 (um ano antes de
tornar-se colunista do "New York
Times), um grupo de conselheiros da Enron. Diferentemente de
Krugman, alguns ganharam dinheiro da Enron no mesmo período em que emitiam comentários sobre empresas energéticas.
Depois do colapso da Enron,
eles vieram a público (com graus
variados de pressa) para reconhecer suas ligações, para criticar a
companhia com rigor e dizer que,
apesar de terem tirado dinheiro
dela no passado, mantinham e
ainda mantêm isenção para tratar
do assunto.
Krugman tem escrito artigos
duríssimos contra a Enron. Num
deles, publicado pela Folha, responsabilizou a "direita" pelas críticas que recebeu por ter assessorado a companhia. Segundo
Krugman, essas críticas são "um
esforço de conservadores para jogar a lama na esquerda".
Kudlow, que também recebeu
US$ 50 mil para assessorar e dar
palestras para a diretoria da
Enron, chegou a escrever sobre a
companhia sem revelar o fato aos
seus leitores. Hoje, reconhece seu
erro, mas nega ter sido influenciado pelos serviços que prestou à
Enron. "Será que isso compromete minhas críticas recentes à
Enron?", pergunta ele mesmo, referindo-se a recentes artigos que
escreveu atacando a companhia.
Prisão ética
Mas o problema parece não ser
tão simples, como explicou à Folha Howard Kurtz, jornalista especializado em mídia do "Washington Post" e da CNN.
"O problema com os jornalistas
é que o público sempre irá considerar seus argumentos suspeitos,
justa ou injustamente", afirmou.
"Se criticarem a companhia, alguns vão achar que eles estarão
apenas tentando mostrar o quanto são honestos e durões. Se a defenderem, ou mesmo ficarem
quietos, seus críticos dirão que foram comprados. É por isso que,
para os jornalistas, tirar dinheiro
do mundo corporativo é uma
péssima idéia".
Na avaliação de Kurtz, críticas
pesadas à Enron podem ser tão
suspeitas quanto elogios rasgados. É como se esses jornalistas e
colunistas estivessem numa prisão ética, da qual até os mais bem-intencionados e honestos não
conseguiriam escapar.
Por causa dessa prisão ética, redes de TV como a ABC e a NBC
proíbem seus jornalistas de receber dinheiro do mundo corporativo, seja por meio de pequenos
serviços ou de empregos paralelos. O "Washington Post" mantém regra semelhante.
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