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São Paulo, segunda-feira, 03 de fevereiro de 2003

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CONSUMIDOR

Segundo a ANS, 30% das administradoras enfrentam dificuldades

Debilidade financeira aflige e enfraquece planos de saúde

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

A análise das informações econômico-financeiras fornecidas por 1.514 administradoras de planos de saúde à ANS (Agência Nacional de Saúde), no ano passado, mostra que, até setembro, 314 operavam no vermelho. Outras 145 estavam com patrimônio líquido negativo.
Ou seja, 30% das administradoras de planos de saúde atravessavam dificuldades financeiras. Esses focos de infecção, em um setor que fatura R$ 26,4 bilhões anuais, recomendam cuidado aos usuários, que somam cerca de 34,5 milhões de pessoas no Brasil.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, o quadro pode ficar ainda pior com o fechamento dos dados do último trimestre do ano passado, que serão divulgados até abril, devido ao impacto do câmbio que explodiu naquele período elevando os custos do setor.
De setembro a dezembro, a cotação do dólar passou de R$ 3,286 para R$ 3,5333, uma valorização de 16,7% no período.
Os balanços trimestrais das empresas já mostram que, quatro anos depois das mudanças introduzidas pela lei 9.656/98 para sanear o setor e garantir o atendimento aos usuários, as administradoras continuam com dificuldades. Na semana retrasada, por exemplo, a Unimed da cidade de São Paulo teve decretada sua liquidação pela ANS.
"A qualidade dos serviços melhorou, mas a situação econômico-financeira das empresas piorou", admite Solange Beatriz Palheiro Mendes, diretora de normas e habilitação de operadoras da ANS.
Segundo ela, a lei onerou as empresas, porque elas tiveram de ampliar as coberturas dos planos de saúde e investir na parte administrativa do negócio.

Lucro anêmico
As empresas, segundo a diretora da ANS, estão com lucro operacional (lucro obtido com a operação de venda) declinante e muitas operam no zero a zero. O lucro, quando aparece no final do balanço, é financeiro. Até setembro, a rentabilidade média (lucro sobre o patrimônio líquido) das operadoras, de acordo com a ANS, ficou em 3%.
Já as seguradoras -que representam apenas 13% do sistema privado de saúde- tiveram rentabilidade melhor, de 9,6%.
Mas, segundo Walter Hime, diretor-executivo da Aon Risk Services Consulting, esse nível de lucratividade é insuficiente para remunerar o capital investido pelas seguradoras.
Além disso, a melhor rentabilidade das seguradoras se deve, basicamente, a seus ganhos financeiros. Por lei, as seguradoras sempre tiveram de fazer reservas para garantir a prestação de serviços aos clientes.
Esses recursos são aplicados no mercado financeiro e garantem às seguradoras um retorno que o resto do setor não tem.
Só no ano passado as demais operadoras de planos de saúde começaram a constituir reservas, por exigência legal.

Diagnóstico complicado
Uma boa parte dos problemas financeiros do setor, entretanto, é anterior às mudanças exigidas pela nova legislação. As operadoras de planos de saúde carregam dívidas pesadas, decorrentes de investimentos feitos em equipamentos, a maioria importados (e que sobem de valor na medida em que o dólar se valoriza).
Essa situação afeta principalmente as empresas de medicina de grupo, que respondem pelo atendimento de mais de 44% dos usuários de planos de saúde.
Segundo Wagner Barbosa de Castro, coordenador do departamento econômico da Abramge (Associação Brasileira de Medicina de Grupo), em 2001, para cada R$ 1 que tinham em caixa, as empresas deviam R$ 5. "No ano passado, com a disparada do câmbio, essa situação piorou", diz.
Também debilitam a saúde das operadoras as dívidas fiscais que acumularam ao longo dos últimos anos.
Segundo Mendes, da ANS, na maioria dos casos as empresas que estão com patrimônio líquido negativo encontram-se nessa situação devido aos débitos fiscais.
"As cooperativas, por exemplo, não pagam o ISS [Imposto sobre Serviços], alegando que são isentas. Muitas operadoras não recolhem impostos e outras estão no Refis [programa de refinanciamento de dívidas com a Receita Federal e o INSS]", diz ela.

Receita insuficiente
Mesmo com as receitas bilionárias que têm, as operadoras não conseguem dar conta dos aumentos de custos. "A inflação do setor é sempre mais elevada do que os índices oficiais de inflação", diz Mendes.
Um indicador da pressão de custos, segundo ela, é o chamado "índice de sinistralidade" do setor. Esse índice é calculado com base nas receitas das empresas, nos custos dos serviços e na frequência de uso desses serviços pelos usuários dos planos de saúde. Esse índice saltou de 79%, em 1999, para 82% no ano passado.
Segundo Hime, para que as empresas possam remunerar o capital investido, o índice de sinistralidade teria de ser de no máximo 75%, que é o padrão internacional. "O sistema está todo errado. Não satisfaz o consumidor nem o médico e não remunera o acionista das empresas", diz ele.


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