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TRANSPARÊNCIA
Para especialistas, se há proteção a quem vende gasolina adulterada, consumidor está sendo lesado
ANP não divulga nome de posto irregular
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
O fato de a ANP (Agência Nacional do Petróleo) não divulgar
os nomes dos postos que adulteram a gasolina provoca contestações dos especialistas em direitos
dos consumidores e expõe divergências na diretoria da agência.
A ANP colhe amostras de combustíveis em cerca de 5.500 estabelecimentos por mês -cerca de
20% dos postos espalhados pelo
país- por meio de convênios
com universidades e laboratórios
de pesquisa. Os nomes dos postos
que apresentam gasolina adulterada não são, porém, divulgados
para os consumidores. A Folha
apurou que dentro da agência há
quem defenda e quem não defenda a divulgação dos postos.
O que a agência torna público
são apenas os índices de irregularidades por regiões. Em dezembro passado, por exemplo, o Estado de Alagoas apresentou o maior
índice de gasolina adulterada do
país -13,2%. A média do Brasil
foi de 6%.
Órgãos de defesa dos consumidores consultados pela Folha entendem que a agência não age de
forma transparente ao não divulgar os nomes dos postos onde são
constatadas as vendas de combustível irregular.
"Se os laboratórios contratados
pela agência são confiáveis, por
que não tornar o resultado público? A ANP foi constituída para regular e fiscalizar o setor e para
mostrar o resultado à população",
diz Maria Inês Dolci, coordenadora do departamento jurídico da
Pro Teste (Associação Brasileira
de Defesa do Consumidor).
A ANP informa que não libera
os nomes dos postos que fraudaram o combustível porque entende que esses estabelecimentos
têm direito à defesa antes de o
consumidor ser informado. "Sem
direito de defesa, o nome do estabelecimento não pode ser publicado", afirma Antonio Bonomi,
superintendente de qualidade de
produtos da ANP.
A agência reguladora informa
também que o monitoramento de
qualidade serve para dar pistas
para a área de fiscalização da
agência -isto é, mostrar os focos
das fraudes. Somente depois do
julgamento final de um processo
pela Justiça -no caso de um posto ser autuado e depois recorrer, a
ANP considera que o nome de
quem adulterou deve se tornar
público.
A diretoria da Pro Teste entende
que, com essa posição da ANP, o
consumidor acaba sendo lesado,
já que os processos na Justiça brasileira se arrastam muitas vezes
por vários anos. "O procedimento
da agência tem que ser rápido e
transparente. O fato de ela constatar que a gasolina está adulterada
já é crime, apesar de o posto ter
direito à defesa."
A Folha apurou que pode levar
semanas até que a informação sobre a qualidade dos combustíveis
chegue ao departamento de fiscalização da agência. Esse tempo é
mais do que suficiente para que a
gasolina adulterada de um posto
já tenha sido comercializada.
Isto é, quando a fiscalização
chega a um estabelecimento no
qual foi constatada a adulteração
do produto, já houve a troca do
combustível. Como o posto sabe
que há demora nas fiscalizações,
ele pode continuar com a venda
de produto adulterado até terminar seu estoque.
Especialistas em direitos dos
consumidores citam o Código de
Defesa do Consumidor para defender a publicação do levantamento de qualidade nos postos de
gasolina. Eles mencionam especialmente o artigo 4º, que trata da
política nacional das relações de
consumo, que tem como objetivo:
atendimento das necessidades
dos consumidores, respeito à sua
dignidade, saúde e segurança,
proteção de seus interesses econômicos, melhora da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de
consumo.
Para Marcos Diegues, advogado
do Idec (Instituto Brasileiro de
Defesa do Consumidor), o resultado do teste de qualidade dos
combustíveis é informação fundamental para o consumidor.
"Não vejo justificativa para não
divulgar os nomes dos postos. A
informação completa é um direito do consumidor, ainda mais
nesse caso de combustíveis", diz.
Flávio Azevedo, do escritório
Piza & Advogados, lembra que a
Portaria nº 111, de 28 de junho de
2000, da própria agência reguladora do setor, criou o Centro de
Relações com o Consumidor e cita, em seu artigo 4º, que compete
ao centro "promover a orientação
dos consumidores quanto a preço, qualidade e oferta dos produtos e serviços do mercado regulado pela ANP".
"A agência tem de passar as informações que dispõe para os
consumidores. Se o posto entender que a ANP errou, deve discutir isso na Justiça. O que não pode
é o consumidor ficar sem acesso à
informação", diz Azevedo.
A Folha apurou que as distribuidoras recebem da ANP, porém, informações sobre os postos
de suas bandeiras, mas não de
seus concorrentes. Isto é, a Shell e
a Esso, por exemplo, sabem quais
os postos de suas bandeiras fazem
parte da lista dos irregulares. O
Ministério Público e a polícia, se
solicitarem, também podem ter
acesso aos nomes dos postos, informa Bonomi.
Especialistas de órgãos de defesa dos consumidores consideram
que, se há impedimento legal para
a publicação dos nomes dos postos, nem mesmo as distribuidoras
poderiam ter acesso a eles. Isto é, a
ANP diz para quem comete a
fraude que ele está errado, mas
não alerta o principal interessado- o consumidor.
Ildo Sauer, professor de pós-graduação em energia da USP
(Universidade de São Paulo) e nomeado para o cargo de diretor de
Energia e Gás Natural da Petrobras, diz que o fato de a ANP não
publicar os nomes dos postos que
cometem fraude acaba protegendo os estabelecimentos irregulares. "Se o consumidor não tem
acesso ao nome do posto, de que
adianta esse monitoramento de
qualidade dos combustíveis?", indaga.
Flávia Lefevre Guimarães, advogada da Pro Teste, afirma que a
ANP, como agência reguladora e
fiscalizadora, tem o dever de tornar públicas as informações.
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