São Paulo, sexta-feira, 03 de fevereiro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

INTEGRAÇÃO

Indústria cogita buscar outros clientes e oferecer ao país vizinho menos mercadorias do que o permitido em acordo

Empresa ameaça até cortar venda à Argentina

ADRIANA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Resta à indústria brasileira aprender a se defender dentro do novo acordo de salvaguardas entre Brasil e Argentina, assinado na quarta-feira, se quiser manter o mercado lá fora. Passada a saraivada de críticas feitas por líderes industriais ao pacto defendido pelo governo, empresas sentam com o acordo nas mãos para ver como se preparar, caso o país vizinho comece a se posicionar contra as exportações brasileiras. A Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) já fala sobre como pode, na prática, "reagir" ao acordo.
"Temos produtos competitivos e de qualidade e podemos vender menos para lá e voltar nossas exportações para outros mercados. Com menos oferta no país vizinho, perde o consumidor argentino, com menos opções de compra. Quem vai pagar é o povo", disse ontem Paulo Skaf, presidente da Fiesp, à Folha.
"Estamos mais bem preparados para não cair na armadilha dos prazos do acordo e, com dados nas mãos, mostrar que nossas exportações não são danosas para aquele país. Eles podem ganhar na primeira disputa, mas é como andar de bicicleta. Não vão além disso ", diz Synésio da Costa, presidente da Abrinq (Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos) e membro da federação paulista.
No novo acordo, há diversos prazos definidos para que os países acionem mecanismos de proteção a seus mercados. Essa ferramenta, chamada MAC (Mecanismo de Adaptação Competitiva), pode ser usada caso um setor industrial acredite que há dano a indústria local com as importações. Se ele perceber isso, o governo do país terá 15 dias para julgar se cabe a reclamação. Em caso positivo, o caso vai à chamada Comissão Bilateral de Monitoramento. São mais cinco dias para esse órgão convocar os setores dos dois países e tentar um acordo. Não pára aí. São até 120 dias a mais de prazo para uma solução final.
"Temos acordos fechados para alguns produtos anteriormente a esse anunciado ontem [anteontem]. Alguns estão para vencer e agora precisamos ver o que fazer com eles", diz Paulo Saab, presidente da Eletros (Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos). Um exemplo disso é o item lavadora de roupa. Ficou definida no início de 2005 uma cota de exportação de 180 mil unidades pelo período de cerca de um ano, até março de 2006. O prazo está no final, portanto. O produto deve "cair" dentro desse novo acordo assinado anteontem entre os países, caso a Argentina volte a se contrapor à venda brasileira.
A Argentina é responsável por 8,5% da venda total de itens brasileiros ao exterior, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento. Em 2004, a taxa foi maior 8,9%. O país vizinho tem mais pesa na cesta brasileira que a China. perde para EUA e África.
Empresários e líderes industriais voltaram ontem a rechaçar o acordo assinado pelo governo brasileiro. Para a Abicalçados (Associação Brasileira da Indústria de Calçados), entidade representativa do setor calçadista -foco de várias pendengas comerciais entre a indústria local e vizinha- o pacto "é uma contribuição do governo brasileiro à fuga de empresas nacionais para a terra argentina", diz Elcio Jacometti, presidente da entidade, que se limitou a dizer que só comentaria o acordo após posicionamento do Itamaraty a respeito.
Questionado sobre o risco de que a discussão tenha sido tomada com um pano de fundo fortemente político -haverá eleições presidenciais na Argentina em 2007 e no Brasil em 2006-, Paulo Skaf disse: "Se haverá eleições lá, haverá aqui também".
Para Fernando Pimentel, presidente da Abit (Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção), o acordo não é um sinal positivo para o Mercosul. "Se não há livre comércio na zona que pressupõe isso, como é possível vender a proposta para outras zonas?", questionou.


Texto Anterior: Trabalho: Produtividade cai e custos sobem nos EUA
Próximo Texto: CNI chama novo sistema de "retrocesso"
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.