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VINICIUS TORRES FREIRE
Por onde anda o capital no Brasil
Melhora nas finanças pode dar em salto de qualidade, mas mudança da estrutura produtiva ainda é lentíssima
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O CAPITAL no Brasil é um bicho
muito mais paquidérmico do
que sugere a algaravia midiático-mercadista. Sob a perspectiva
ansiolítica do tempo, as mudanças
parecem lentas, se tanto, e dependem dos fatores mais óbvios e fundamentais, aqueles que se lêem em
manuais de economia. Mas há mudança? E a continuidade ruim?
A capacidade e a oportunidade de
o mercado financeiro traduzir poupança em produção ainda são escassas. Mas tome-se uma evidência
anedótica. No ano do Real, 1994, os
fundos de renda fixa, grosso modo
aplicações elementares em dívida
pública, tinham 93% do patrimônio
dos fundos de investimento, contra
35% em 2007. Decerto o dinheiro se
moveu para outras e mais novas
aplicações conservadoras. Ações hoje têm só 9,5%, embora sua participação tenha crescido 48% desde o
fundo do poço de 2001. Fundos de
previdência, inexistentes no final
dos 90, têm agora 8% do mercado.
Mas a poupança nos fundos de investimento, ora em R$ 1 trilhão, fica
menos em dívida do governo.
O volume de emissão e distribuição secundária de ações em 2006
cresceu 121% sobre 2005. No primeiro terço deste ano, aumentou
74% sobre 2006. Isso é inédito, a
Bolsa capitalizar empresas. O grosso
do dinheiro das ações foi para a
construção civil (24% em 2006, 30%
em 2007), um setor reprimido por
anos de instabilidades e juros altos,
aviões, teles, alimentos, metalurgia.
O investimento produtivo estrangeiro no país volta a crescer, sem depender de privatizações. Mas representa só 2% do PIB e, agora, o investimento brasileiro no exterior sobe
muito, em parte porque as empresas
precisam crescer para fora, em parte
porque elas fogem de câmbio, infra-estrutura e tributos desfavoráveis.
Não se observa grande mudança
no padrão de investimento externo,
setores derrotados ou vencedores.
Há variações cíclicas óbvias. Por
exemplo, caiu a fatia dos investimentos em montadoras, mas as empresas estavam faz anos ociosas. Os
setores que, sob Lula 1, se destacam
da média do período do câmbio fixo
ou de FHC 2 são óbvios: alimentos
(o povo come mais), celulose, metalurgia, que andava "subinvestida".
Os líderes do investimento doméstico em 2006 refletem a notória
demanda mundial por recursos naturais (minérios, siderurgia, celulose), uma carência (energia) e a grande novidade na pauta de inversões e
exportações: petróleo, álcool. De
1995 a 2001, combustíveis eram de
1% a 2% do total de exportações,
contra 10% de agora. Mas, sim, ainda
somos movidos a commodities.
Afora combustíveis, em mais de
dez anos a pauta de exportação mudou pouco. As últimas grandes inovações do parque produtivo ainda
ecoam projetos dos anos 70/80: Petrobras, Embraer, Proálcool, Embrapa etc. O país parece incapaz de
lidar com os problemas de produção
e de finanças ao mesmo tempo. Ora
não há inflação, as contas públicas
são menos desastrosas. Mas, na produção, abriu-se o comércio, privatizou-se e só, a eficiência cresceu um tico. É muito pouco. Juros e tributos
são excessivos, não há inovação tecnológica sistemática e se ignora o
efeito duradouro de um real cronicamente forte. A euforia financeira
obnubila a visão de problemas históricos de nossa economia periférica.
vinit@uol.com.br
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