São Paulo, terça-feira, 03 de julho de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

"Ou tudo ou nada"


O que esperar de um país que, em pleno otimismo, tem tantas pessoas sem emprego, sendo disputadas pelo crime?


MILITARMENTE derrotado e humilhado nos anos 1940, o Japão tornou-se a segunda maior potência econômica do mundo na segunda metade do século passado. O modelo bem-sucedido previa emprego para todos os japoneses durante toda a vida. Por isso, quando o Japão enfrentou sua primeira grave crise do pós-guerra, no fim dos anos 1990, os japoneses demitidos pelas empresas tinham vergonha do desemprego. Alguns se suicidaram. Muitos continuavam levantando diariamente no mesmo horário e seguindo para o trabalho, para que vizinhos não soubessem que estavam desempregados.
O sentimento de vergonha do desemprego está bem retratado no filme dirigido pelo inglês Peter Cattaneo, com o título original de "The Full Monty" (1997). Rebatizado no Brasil de "Ou Tudo ou Nada", o filme se passa na Inglaterra no início dos anos 1990, na cidade de Sheffield, que entra em crise social após perder sua indústria de aço. É uma comédia, feita mais para pensar do que rir. Seis homens desempregados montam um show de striptease para mulheres com o objetivo de conseguir algum dinheiro. Um dos personagens, Gerard, não tem coragem de contar à sua mulher que perdeu o emprego. Ao saber da mentira, a mulher o expulsa de casa.
Dramas familiares decorrentes do desemprego não são privilégio japonês ou inglês. O Brasil viveu durante muitos anos -e ainda vive- esse drama, infelizmente, com grande intensidade. Pais e mães desempregados perdem a dignidade humana, ficam impossibilitados de honrar compromissos e são levados a se sentir como párias da sociedade. O desemprego desagrega famílias.
Volto a esse tema porque o país começa a se acomodar com o pífio crescimento da economia, em torno de 4% ao ano, e com a geração de emprego atual, claramente insuficiente. Coberto de elogios pela comunidade internacional, à beira do "investment grade", a tendência do país é de conformismo com índices medíocres e com uma política de juros cada vez mais aceita como inevitável. Um erro. O megainvestidor George Soros, em entrevista ao programa "Roda Viva", recusou-se a criticar o governo Lula, com uma exceção: disse que os juros brasileiros estão muito altos.
A situação do emprego no país está longe do ideal das sociedades capitalistas. Nos últimos 12 meses, foi criado no Brasil cerca de 1,3 milhão de empregos formais. Por uma ironia das estatísticas, o desemprego e o emprego costumam aumentar ao mesmo tempo. Quando uma economia entra em crescimento, como a brasileira neste momento, pessoas que estavam desalentadas e já não procuravam emprego voltam a buscar ocupação. Nesse momento, elas são captadas pelas estatísticas, que só registram entre os desempregados aqueles que procuraram trabalho nas últimas semanas.
Segundo o IBGE, nas seis maiores regiões metropolitanas há 2,3 milhões de desempregados. Em todo o país, estão sem emprego quase 7 milhões de pessoas aptas a trabalhar.
Números como esses são de tirar o sono, mesmo num bom momento da economia. O que esperar de um país que, em plena era de otimismo, tem tantas pessoas, principalmente jovens, sem emprego, sendo disputadas pelo crime? O que será desse país quando vier a próxima e inevitável crise econômica? A busca de índices elevados de crescimento em países emergentes tem de ser obsessiva. Por isso, a decisão do CMN de manter a meta de inflação em 4,5% em 2009 é correta. Ela permite ao país ter juros mais baixos, mais crescimento e mais empregos.


BENJAMIN STEINBRUCH , 54, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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