São Paulo, Sábado, 03 de Julho de 1999
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DIREITO ECONÔMICO
Conselheira fala em "terrível concentração" do mercado de bebidas com o negócio entre a Antarctica e a Brahma
Cade estuda restringir a megafusão

DENISE CHRISPIM MARIM
ISABEL VERSIANI
da Sucursal de Brasília

A conselheira Lúcia Helena Salgado e Silva, do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), afirmou que a fusão entre a Brahma e a Antarctica é um caso de "tremenda concentração" e que a operação não deverá ser aprovada pelo conselho sem restrições.
Mais cauteloso, o presidente do Cade, Gesner Oliveira, disse à Folha em conversa telefônica, de Portugal, que ainda não é possível prever o resultado do julgamento que será feito pelo órgão. Para ele, o fato de a nova empresa controlar 70% do mercado não é, por si, razão para vetar o negócio.
Os dois votam no conselho, que tem sete membros.
A fusão das empresas para a formação da holding AmBev, um negócio de R$ 8 bilhões, deverá ser julgada pelo Cade dentro de 120 dias. Antes, porém, dois órgãos federais farão análises preliminares.
O acordo foi protocolado ontem na SDE (Secretaria de Direito Econômico) do Ministério da Justiça, que terá 30 dias para avaliá-lo.
O caso seguirá ainda para a Seae (Secretaria de Acompanhamento Econômico) da Fazenda, que terá outros 30 dias para analisá-lo.
A conselheira Lúcia Helena disse à Folha que a fusão é preocupante e só terá validade legal depois de aprovada pelo Cade. O aval do conselho à operação, sob seu ponto de vista, dificilmente ocorrerá sem a imposição de restrições que visariam a neutralizar o impacto da operação no mercado.
"Trata-se de uma fusão que nos atemoriza. É uma tremenda concentração porque permitirá às empresas o controle de 75% do mercado de cervejas. Não há nenhum lugar do mundo com tamanha concentração nesse segmento."
A conselheira disse que o Cade deverá fazer uma reunião preliminar com os representantes da Antarctica e da Brahma no início de agosto, na qual poderá apresentar sugestões de restrições à fusão.
Segundo ela, poderá ser proposta a mudança "radical" na atual rede de distribuição dos fabricantes de cerveja, baseada na exclusividade na venda das marcas. Outra sugestão cogitada é a autorização para que outras empresas possam produzir as cervejas da futura AmBev, em um sistema terceirizado.
A conselheira afirmou ainda que os advogados das empresas entraram em contato com ela anteontem. "Me apresentaram a velha história de criar um campeão nacional, capaz de competir com os concorrentes estrangeiros."
Segundo o presidente do órgão, ao analisar uma operação, o Cade não leva em consideração só o nível de concentração, mas também questões como barreiras à importação do produto em questão e possibilidades de cartelização.
"Posso assegurar para o consumidor que, se houver efeitos anticoncorrenciais, o Cade vai tomar as providências para, nos termos da lei, impedir esses efeitos", disse Oliveira. "Se a operação não apresentar nenhum efeito anticoncorrencial, ela será aprovada."
No julgamento das associações entre as cervejarias Brahma e Miller e Antarctica e Anheuser-Bush, em 1997, Oliveira e Lúcia Helena defenderam posições opostas.
Lúcia Helena, relatora do processo Anheuser-Bush, votou que a associação deveria ser desfeita no prazo de dois anos. Sua posição acabou vencendo no primeiro julgamento dos dois processos.
Oliveira, contrário à decisão, expôs, na ocasião, o que chamou de "sinais de xenofobia" nos julgamentos. Depois de as empresas terem recorrido, os dois casos voltaram a ser analisados pelo plenário do Cade e acabaram aprovados.
Segundo Oliveira, em princípio, na análise do caso AmBev, o Cade deve se restringir ao mercado brasileiro, porque os custos de distribuição no setor são altos.
Oliveira disse que o conselho pode julgar de forma diferenciada os mercados de cerveja, de refrigerante e de água. Outro conselheiro do Cade, Mércio Felsky, disse que o caso indica "grande concentração de mercado".


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