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OPINIÃO ECONÔMICA
O mundo global em crise
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
Enquanto vivemos no Brasil
um período de otimismo com
a economia para 2004, o mundo
que nos cerca passa por um momento de muita insegurança. Os
problemas gerados pelos desequilíbrios estruturais da economia
americana estão chegando às mesas de operações dos mercados financeiros. Até pouco tempo atrás,
essas reflexões estavam restritas
às universidades e a outros centros de pensamento econômico;
hoje fazem parte das análises de
mercado produzidas por instituições financeiras em todo o mundo. Passamos assim da fase do cérebro para a do bolso.
Além das evidências de que a situação de hoje -um déficit em
conta corrente nos EUA da ordem
de 6% do PIB- não pode continuar por mais tempo, o quadro
eleitoral para 2004 acendeu uma
luz vermelha no mercado. As dificuldades crescentes do presidente
Bush e a certeza de que ele não
vai ficar parado vendo seu apoio
popular erodir estão criando o
sentimento de que ele pode tentar
uma jogada perigosa para inverter essa situação. O alvo mais provável do presidente americano é o
valor do dólar nos mercados de
câmbio.
A economia americana tem
apresentado sinais evidentes de
uma melhora, sob a influência de
juros baixíssimos e de um gigantesco déficit fiscal. Mas o aumento
da produção, principalmente no
setor industrial, tem sido acompanhado por um ganho muito
forte na produtividade das empresas americanas. Com isso, o
nível de emprego e o valor dos salários não melhoram. Além da
questão da produtividade, a
transferência da produção para
países emergentes, como a China,
tem destruído empregos americanos. A China transformou-se hoje, com o terrorismo, no grande
satã para uma parte da sociedade
americana.
No raciocínio simplista do presidente Bush e de seus assessores
toscos e presos a um fundamentalismo ideológico caipira, será preciso desvalorizar o dólar em mais
20% para que esse quadro seja invertido. Com isso, as desvantagens competitivas das empresas
americanas seriam corrigidas, o
déficit comercial de hoje seria reduzido de maneira expressiva e a
situação política do presidente se
inverteria.
Mas essa estratégia encontra alguns obstáculos intransponíveis.
O primeiro é que países como a
China, que têm nas exportações
para os EUA o grande motor de
seu crescimento, estão defendendo o valor de sua moeda comprando os dólares gerados pelos
exportadores a uma taxa fixa.
Com isso, o dólar não se desvaloriza e as compras americanas de
produtos chineses não se reduzem. Esse mesmo comportamento
tem sido seguido por países como
Japão, Coréia do Sul e agora o
Brasil.
A única moeda que tem se valorizado em relação ao dólar, sob o
olhar complacente do ultraliberal
Banco Central Europeu, é o euro.
Com isso, a incipiente recuperação econômica do Velho Continente está ameaçada. Essa é a face desconhecida dos caipiras que
ocupam a Casa Branca atualmente: uma valorização das moedas das principais economias do
mundo reduz o crescimento global e recoloca na agenda a possibilidade de um período de deflação que atingiria, também, a economia americana e, por consequência, a reeleição do sr. Bush.
Na última reunião dos países
mais ricos do mundo no Qatar,
sob pressão do governo americano, os ministros da Economia do
chamado G7 assinaram um documento em que se comprometeram com taxas flexíveis de câmbio. Apesar da linguagem pouco
afirmativa sobre esse compromisso, essa decisão provocou uma
verdadeira comoção nos mercados financeiros. Taxas de juros e
câmbio e os preços das ações negociadas nas principais Bolsas de
Valores entraram em um movimento quase histérico de ajustes,
levando uma grande incerteza sobre o futuro da economia mundial.
Por outro lado, um grupo de deputados e senadores apresentou,
no Congresso americano, um projeto de lei que cria um imposto de
importação superior a 30% para
os produtos comprados na China.
Um claro instrumento de pressão
sobre o governo chinês, para que
desvalorize sua moeda nacional.
Uma volta à tradicional política
americana, esquecida durante os
anos Clinton, do "big stick", ou seja, do grande porrete.
Outro sinal de tempos bicudos
também está de volta: o preço do
ouro subiu muito nas últimas semanas. Enquanto isso, se vive,
neste país tropical que é o Brasil, o
início de um doce e otimista verão. A Bolsa de Valores de São
Paulo, apesar da fuga dos investidores estrangeiros, não para de
subir...
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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