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DESENVOLVIMENTO
Maioria dos países da região, Brasil incluso, passou por processo de "desintustrialização", afirma Unctad
Indústria regride e latinos voltam aos anos 80
CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL
A maioria dos países latino-americanos, incluindo o Brasil, viveu um processo de "desindustrialização" nas duas últimas décadas que os devolveu a patamares iguais ou piores aos que possuíam no início dos anos 80. Essa
é uma das principais conclusões
do relatório anual da Unctad
(Conferência das Nações Unidas
sobre Comércio e Desenvolvimento), divulgado ontem.
Em consequência, a região experimentou no período níveis de
crescimento modestos, bem inferiores aos de outros países em desenvolvimento, especialmente os
asiáticos. Segundo o relatório, a
industrialização é o caminho mais
rápido para o aumento da produtividade e da renda dos países em
desenvolvimento.
A situação da América Latina é
oposta à da Ásia, onde houve elevação da participação de produtos industrializados no PIB ou na
pauta de exportações, o que garantiu à região níveis de crescimento cerca de duas vezes os dos
países latinos.
O embaixador brasileiro Rubens Ricupero, secretário-geral
da Unctad, atribui parte da responsabilidade pela desindustrialização às políticas econômicas
aplicadas na região nos anos 80 e
90. "O ajuste foi feito com políticas que agravaram a dependência
do exterior, e as condições macroeconômicas, ao contrário do
que se diz, nunca melhoraram de
fato", disse Ricupero à Folha.
Em sua opinião, os planos de estabilização foram incapazes de tirar a volatilidade e a vulnerabilidade de dois preços essenciais para o crescimento: a taxa de juros e
o câmbio. "A consequência foi o
desestímulo ao investimento."
Ricupero observa que o cenário
descrito no relatório da Unctad se
aplica à perfeição ao Brasil, onde o
desemprego bate o recorde de
13% e a participação de produtos
industrializados no PIB diminuiu
de 32,6%, nos anos 80, para 23,7%
na década seguinte.
Dados do IBGE também mostram que o investimento caiu no
segundo trimestre de 2003 a
17,88% do PIB, a menor taxa desde 1993. Sem investimento, é impossível que o país amplie sua industrialização e, em consequência, a participação desse setor em
sua pauta de exportações.
Para o embaixador, é pouco
provável que o Brasil retome investimentos com o nível atual dos
juros -a Selic, taxa básica da economia, está em 20%.
O relatório descreve da seguinte
forma o processo das duas últimas décadas no Brasil e na Argentina: "O desempenho dos investimentos tem sido pobre, a indústria tem perdido sua importância
na geração de emprego e de valor
agregado, ganhos de produtividade têm sido cíclicos, o aperfeiçoamento industrial é limitado e as
exportações continuam a ser dominadas por produtos primários
ou bens manufaturados de baixo
valor agregado".
E acrescenta: "Todos os grandes
países latino-americanos estão no
grupo no qual há pouco dinamismo na industrialização, mudanças estruturais e crescimento de
produtividade, enquanto a maioria dos países asiáticos está em diferentes estágios de industrialização bem-sucedida".
O documento da Unctad aponta três linhas de políticas para a
América Latina que, segundo Ricupero, não estão em desacordo
com as adotadas pelo governo de
Luiz Inácio Lula da Silva.
A primeira é a redução do peso
da dívida em relação ao PIB, que,
no Brasil, está em 57,7%. A segunda é a elevação consistente dos
saldos da balança comercial, o
que diminui a dependência do
país de recursos externos, já que
aumenta a entrada de moeda forte. Neste ano, o Brasil deve ter um
saldo recorde de US$ 22 bilhões,
mas o resultado se deve à forte retração da economia interna, que
encolhe as importações.
Nesse ponto, Ricupero sugere
que o governo não permita a
apreciação do real acima do patamar atual, de R$ 2,90.
A última recomendação é o aumento do valor agregado das exportações, com redução da dependência de bens primários ou
de baixo conteúdo industrial.
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