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OPINIÃO ECONÔMICA
PPP, eficiência e risco
JOSÉ MÁRCIO CAMARGO
Está em discussão no Senado
o projeto de lei que regulamenta a adoção de PPPs (Parceiras Público-Privadas) no país. O
intuito do presente artigo é discutir o objetivo das PPPs, suas vantagens e desvantagens e os riscos
envolvidos em sua implementação.
As PPPs são parcerias entre os
setores público e privado nas
quais o governo especifica o serviço a ser ofertado e um mesmo
agente do setor privado desenha,
financia, constrói, explora e disponibiliza para a população o ativo que será utilizado para ofertar
o serviço. A propriedade do ativo
ao longo do contrato permanece
com o parceiro privado, e o retorno do investimento é obtido mediante cobrança de tarifa do público e/ou transferência de recursos do Orçamento público. Ou seja, as PPPs são uma junção de licitação e concessão.
Que vantagens as PPPs podem
trazer ao país?
A principal vantagem das PPPs
decorre da impossibilidade prática de desenhar contratos completos, ou seja, contratos que sejam
capazes de prever todos os aspectos necessários para que os objetivos sejam atingidos, todos os
eventos futuros que irão afetar a
lucratividade do investimento etc.
Devido a essa impossibilidade, o
construtor e/ou ofertante do serviço poderá modificar as condições inicialmente contratadas,
dentro de certos limites, sem que
esteja violando o contrato. Isso
gera dois tipos de incentivo para o
investidor privado:
1) realizar investimentos que reduzem o custo e, simultaneamente, aumentam a qualidade dos
serviços ofertados (utilizar tecnologia que minimize o custo de
construção e, ao mesmo tempo,
aumente a qualidade da obra);
2) realizar investimentos que reduzem o custo e, simultaneamente, diminuem a qualidade dos serviços (utilizar material de pior
qualidade na construção da
obra).
A existência de incentivos para
esses dois tipos de investimento
pode transformar a PPP em uma
opção de contrato que gera maior
eficiência microeconômica do
que a combinação de licitação
com concessão. Isso ocorre se a
qualidade da obra estiver diretamente relacionada ao custo de
oferecer o serviço nas condições
desejadas pelo poder público e essas condições puderem ser explicitadas em contrato antes da realização da obra. Nessas condições,
uma PPP conseguirá fazer com
que o parceiro privado tenha incentivo para minimizar o custo de
construção do ativo e maximizar
sua qualidade, sem que o governo
tenha de fiscalizar a obra, pois o
custo de manter a qualidade do
serviço dentro do contratado depende diretamente da qualidade
da obra. Terá apenas que verificar
se os indicadores de qualidade do
serviço estão sendo devidamente
cumpridos, após o início da operação do ativo.
É importante notar que o ganho
de eficiência microeconômica das
PPPs decorre do fato de que o
mesmo agente privado irá construir e utilizar o ativo posteriormente para ofertar o serviço, que
é o objetivo do contrato. Ou seja,
não existe separação entre essas
duas atividades. Os contratos de
PPPs somente devem ser utilizados para a construção e a operação de ativos pelo mesmo agente
privado, para oferecer serviços
públicos cuja taxa de retorno social é maior que a taxa de retorno
privada.
Além da maior eficiência microeconômica, as PPPs têm a vantagem de a obra ser financiada
com recursos privados, o que permite ao governo aumentar o investimento em infra-estrutura
sem aumentar seu endividamento, utilizar a maior capacidade administrativa e de inovação e
transferir pelo menos parte do risco do investimento para o setor
privado. Para o setor privado, as
PPPs abrem novas oportunidades
de investimento em áreas que
sempre foram monopólio do investimento público.
Apesar dessas vantagens, as
PPPs apresentam riscos importantes, do ponto de vista fiscal. O
tratamento fiscal das PPPs depende de quanto dos riscos do empreendimento será transferido
para o setor privado. Existem diferentes tipos de risco em PPPs:
a) o risco de construção (desenho, custos, prazos de construção
etc.);
b) o risco financeiro (variação
da taxa de juros, da taxa de câmbio etc.);
c) o risco de performance (viabilização do ativo no momento
certo, qualidade na provisão do
serviço etc.);
d) o risco de demanda (qual a
demanda futura pelo serviço);
e) o risco correspondente à definição do valor residual do ativo,
no final do contrato.
Quanto menor a parcela dos riscos transferida para o setor privado, mais o investimento se assemelha a um investimento público. No limite, quando todo o risco
é assumido pelo setor público, o
investimento, ainda que tenha sido financiado privadamente, deveria ser contabilizado como investimento público, na forma de
um "empréstimo imputado" do
parceiro privado. Porém, como
cada contrato de PPP deverá definir diferentes níveis de transferência de risco, é difícil definir
uma regra geral na legislação. Daí
a necessidade de estabelecer uma
regra capaz de limitar a utilização
das PPPs para "disfarçar" investimentos públicos como se fossem
privados. A solução que foi apresentada no Senado, de contabilizar os desembolsos de cada projeto como gasto corrente, a cada
momento da duração do contrato, e estipular um percentual máximo da receita do governo que
poderia ser gasto em PPPs é uma
opção que, pelo menos, limita o
risco incorrido.
Um segundo risco é a utilização
de bancos oficiais (BB, CEF,
BNDES) e fundos de pensão de
empresas estatais (Previ, Funcef,
Petros, Fapes etc.) como financiadores ou parceiros dos contratos
de PPPs. Nesse caso, a divisão de
riscos não é clara. Em caso de fracasso do investimento, quem arca
com o risco de crédito? No caso
dos fundos de pensão, o Estado
poderá ter que cobrir déficits futuros desses fundos devido a fracassos em projetos de PPPs. Os
resultados do programa de privatizações do governo anterior
mostram que esse não um risco
desprezível. Especificar limites
para a participação dessas instituições nas PPPs é uma condição
fundamental para que haja efetiva
transferência de risco para o setor
privado.
Em suma, as PPPs são um tipo
de contrato que pode gerar eficiência microeconômica na provisão de determinados serviços
públicos, cuja taxa de retorno privada é muito baixa e menor que a
taxa de retorno social. Nesse sentido, desenhar uma institucionalidade que consiga minimizar os
riscos fiscais envolvidos poderá
trazer um ganho importante no
sentido de incentivar investimentos privados em infra-estrutura
pública de forma eficiente.
José Márcio Camargo é prof. do Departamento de Economia da PUC/RJ e sócio
da Tendências Consultoria Integrada.
E-mail -
josecamargo@tendencias.com.br
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