São Paulo, sexta-feira, 03 de novembro de 2006

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VINICIUS TORRES FREIRE

Quem fica com a bola?


Lula desconhece economia e desautorizou o mudancismo; Meirelles e técnicos estão sob sítio. Quem vai armar o jogo?


PRIMEIROS DIAS de janeiro de 2003. Antonio Palocci e sua suavidade sibilante haviam deixado o posto de sereia da campanha de Lula entre os financistas para tomar conta de uma economia quebrada por obra de PSDB-PFL e PT. O ministro-médico e ex-político municipal mostrara-se um grande centroavante. Deixara o posto de subcoordenador de programa do PT e se lançara no espaço vazio dentro da área do mercado, que ninguém do PT ocupava. Achou o nicho, recebeu a bola, fez o gol e foi para o abraço da elite. Embora centroavante oportunista e bom de embaixadinhas políticas, Palocci sempre seria um perna-de-pau econômico.
Naquele início de janeiro, foi ao "Roda Viva", o programa de entrevistas da TV Cultura de São Paulo. A gente fazia perguntas específicas e o ministro devolvia bolas quadradas, uma algaravia que, aparentemente, tentava replicar as idéias da "Agenda Perdida", um documento programático elaborado no final de 2002 por um grupo de economistas "liberais", entre os quais Marcos Lisboa. Lisboa estava nos bastidores do "Roda Viva" e seria secretário de Política Econômica de Palocci.
Durante um intervalo do programa, depois de Palocci ter enrolado malandra e toscamente diante de uma pergunta difícil, Lisboa levou um bilhetinho ao ministro. Volta o programa e, Palocci, simpaticíssimo, diz que gostaria de tratar de novo da pergunta do jornalista, "muito boa", à qual ele gostaria de "responder melhor", ou algo assim. No programa, Palocci negava ainda que a meta de superávit primário iria além de 4% (foi) e que a meta de inflação seria relaxada -se mudasse, mudaria seu prazo de cumprimento (a meta foi relaxada). As medidas foram prudentes e sensatas. Mas Palocci não sabia do que falava.
Lisboa acabaria por se tornar o mentor dos melhores planos do Ministério da Fazenda. No lado fiscal, Joaquim Levy mandava. Com os desbastes políticos de sempre, eles eram a política econômica de Lula.
Começa o governo Lula 2, e Tarso Genro, um dos capitães da nau do mudancismo econômico, atira um torpedo contra o próprio navio por falar demais. Fortalece os adversários do mudancismo, Henrique Meirelles, Paulo Bernardo e o segundo escalão técnico da economia. Alguns desses, diretores do BC e secretários da Fazenda, irritados com o bombardeio político e midiático, com problemas de família e dinheiro, já queriam sair antes de a nau mudancista de Guido Mantega e cia.
ir ao mar. Com a falação mudancistas, o barco dos que pretendem dar o fora do governo ganhou novos passageiros potenciais. Como Lula desautorizou o mudancismo e Meirelles e cia. estão sitiados, quem pensará a política econômica de Lula 2? No Banco Central, diz-se que Paulo Vieira da Cunha, diretor de Assuntos Internacionais, seria o "número 2" de Meirelles com a saída de Afonso Bevilaqua, rumorejada desde o ano passado. Antes do BC, Cunha era diretor do HSBC em Nova York e crítico de Mantega. Na Fazenda, o nome da vez seria Carlos Kawall, ex-economista do Citibank antes de ser levado por Mantega para o BNDES e para o governo. Mas o discreto Kawall é um adepto padrão de ajuste fiscal etc. Quem vai ficar com a bola?

vinit@uol.com.br


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