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OPINIÃO ECONÔMICA
A privatização e o destino dos seus recursos
MAILSON DA NÓBREGA
No Brasil, a privatização de
empresas estatais tem pelo menos três vantagens: (1) aumentar
a eficiência da economia e o
bem-estar da sociedade; (2) assegurar investimentos em áreas
cruciais para o desenvolvimento
do país; e (3) contribuir para a
redução dos graves problemas
fiscais do país.
Segundo o BNDES, o governo
FHC elegeu três objetivos básicos
para o Programa de Privatização: (1) redefinir o papel do Estado mediante a transferência
de suas atividades econômicas
para o setor privado; (2) sanear
as estruturas financeiras nos níveis federal, estadual e municipal; e (3) reduzir o endividamento público.
Com seus altos e baixos, a privatização vai bem. Seus efeitos
são bem visíveis nas telecomunicações. Os serviços melhoraram
substancialmente. Na telefonia,
aumentou a oferta, caiu o preço
e o celular se popularizou.
Menos visíveis (mas não menos importantes) são os efeitos
nas áreas de siderurgia, mineração, petroquímica, energia e
transporte. Em todas elas, aumentou a produtividade do trabalho e a eficiência das empresas.
Ainda há problemas na regulação e nas concessões na área
dos transportes, mas o aprendizado de contribuir para melhorar a situação. Em compensação, a competição chegou a
áreas que antes eram monopólio
e se assiste à inédita aplicação
de multas pela má prestação dos
serviços.
Um aspecto pouco percebido
da privatização foi assinalado
por Sérgio Abranches em estudo
recente. Ele observa que "a economia brasileira deixou de ser
uma economia mista, passando
a ser uma economia privada de
mercado".
O eixo dinâmico do padrão de
produção, acumulação e investimento foi transferido, prossegue
Abranches, para o setor privado,
"dentro de uma nova lógica, que
responde a estímulos muito diferentes".
Segundo o BNDES, o resultado
acumulado atingirá US$ 100 bilhões neste ano, basicamente
aplicados na redução de dívida
(a parte relativa ao custo da
concessão pode financiar gastos). Além disso, as dívidas foram transferidas aos novos controladores.
A privatização estancou o suprimento de recursos do Tesouro
às estatais. Diminuiu o prejuízo
resultante de dividendos inferiores aos juros da dívida pública.
Caíram o tamanho da dívida e
as despesas com os respectivos
juros.
O que mais se vê no Brasil, entretanto, são discussões sobre o
preço de venda das estatais ou
demandas de utilização dos recursos em outras finalidades.
.A proposta para usar os recursos em outras finalidades tem
mais apelo se assinalar que eles
serão aplicados em gastos sociais. No Brasil, muita gente está
convencida de que é absolutamente inofensivo gastar em programas sociais.
Diferentemente do que se pensa, usar os recursos para abater
dívida é tecnicamente correto e
altamente positivo do ponto de
vista social.
Vamos ao argumento técnico.
Ainda que muitos não percebam, o governo se endividou para capitalizar a empresa estatal.
Nada mais correto, pois, do que
reduzir a dívida quando a vende. Não fazê-lo, seria o mesmo
que um indivíduo em dificuldades financeiras vender um imóvel e usar os recursos para gastos
correntes pessoais.
Sob o aspecto social, reduzir a
dívida ajuda a criar o ambiente
para diminuir os juros ou para
evitar que eles subam. A queda
de juros é favorável ao crescimento e à geração de empregos.
A taxa de juros, como se sabe,
reflete a percepção de risco de inflação ou de calote. É por isso
que nos EUA os juros básicos são
de menos de 6% ao ano, enquanto no Brasil chegam a 19%
ao ano. A situação piora quando a relação entre a dívida e o
PIB cresce, pois isso sinaliza tendência explosiva e risco de futura reestruturação.
A redução da dívida é mais
importante aqui do que nos
EUA. Lá, eles estão prometendo
usar os superávits fiscais para liquidar a dívida nos próximos
anos. Paradoxalmente, aqui se
luta para evitar que ela caia.
O curioso é que a defesa do uso
dos recursos em programas sociais ou de "desenvolvimento" é
feita pelas mesmas pessoas que
reclamam das elevadas taxas de
juros.
No México, nos anos 80, o governo usava parte dos recursos
da privatização para obras de
grande apelo popular. O presidente da República inaugurava
a obra e declarava que ela se tornara possível por causa da privatização. Era a forma de angariar apoio para o programa.
No Brasil, onde a privatização
tem grande apoio popular, o
melhor uso social dos seus recursos é aplicá-los na redução da
dívida.
Mailson da Nóbrega, 57, ex-ministro da
Fazenda (governo José Sarney), sócio da
Tendências Consultoria Integrada, escreve
às sextas-feiras nesta coluna.
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