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ARTIGO/MERCADOS FINANCEIROS
Fundos compram na alta, vendem na baixa e derrubam Bolsas
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
O índice FTSE All Share, da
Bolsa de Londres, está hoje
abaixo de seu nível de 1969, em
termos reais, uma informação notável que eu devo a Eric Lonergan,
da corretora Cazenove. Uma conclusão é que se trata de uma queda notável no mercado. Outra é
que "compre e segure", o lema do
mercado de ações nos anos 90, é
uma tolice notável. Ainda outra é
que as ações estão baratas no Reino Unido. Na verdade, as três
conclusões são verdadeiras.
A queda do mercado financeiro,
no momento, se compara em
magnitude à que presenciamos
no começo dos anos 70. Philip
Davis, da Universidade Brunel,
alega na mais recente Revisão
Econômica do Instituto Nacional,
uma pesquisa desenvolvida pelo
Instituto Nacional de Pesquisa
Econômica e Social, de Londres,
que o mercado de ações britânico
caiu 77% em termos reais, no começo dos anos 70, enquanto o
mercado dos EUA perdeu 56%, e
o da Alemanha, 43%. Com base
nos índices totais de mercado da
Datastream, a presente crise vê
declínios reais de 63% na Alemanha, 50% no Reino Unido e 49%
nos EUA.
Todos os que caem
Para as ações alemãs, a queda
nas Bolsas vem sendo pior do que
a dos anos 70. Para o mercado dos
EUA, ela é um pouquinho melhor. No Reino Unido, no entanto,
a severidade da queda continua
bem inferior à que foi registrada
nos anos 70, ainda que a corrida
de alta no Reino Unido no final
dos anos 90 também tenha sido
muito menos intensa do que nos
EUA e na Alemanha.
Depois da última grande baixa
das Bolsas, demorou até junho de
1985 para que os mercados alemães retomassem seu pico de
1972. No Reino Unido, só em
maio de 1987 os índices anteriores
à queda foram alcançados, e, o
mais notável, os EUA levaram até
agosto de 1993 para obter o mesmo resultado.
A menos que um investidor esteja disposto a ser de fato muito
paciente, comprar nos picos de
valorização e vender quando a
ação está em queda é realmente
uma idéia tola. O momento de
uma transação importa. Seria de
esperar que os investidores institucionais sofisticados compreendessem esse fato. Mas essa expectativa, infelizmente, termina em
frustração.
Como ressalta Lonergan, "as
vendas líquidas de ações britânicas pelo setor de seguros são um
indicador bastante útil, e um motivo para adquirir ações hoje". As
seguradoras fizeram aquisições
de ações recorde, no valor de 12,5
bilhões de libras, no primeiro trimestre de 2000, o pico da alta nas
Bolsas. Depois, fizeram vendas líquidas de 7,1 bilhões de libras entre o segundo trimestre de 2000 e
o terceiro trimestre de 2002. Nos
últimos 40 anos, as empresas de
seguros só venderam mais ações
do que compraram durante oito
trimestres. Cinco deles aconteceram durante a atual queda das
Bolsas, e dois durante a queda dos
anos 70. O senso de tempo do setor está sempre impecavelmente
errado.
As recentes vendas pelas instituições são, provavelmente, a
principal explicação para o colapso do mercado do Reino Unido, a
despeito de sua alta relativamente
modesta anteriormente e avaliações atraentes. Como nota Davis,
entre 1998 e 2001, as carteiras de
ações britânicas das empresas de
seguro de vida e dos fundos de
pensão caíram de 35,1% do total
investido para 27,5%.
Em contraste com o acontecido
nos anos 70, "os investidores institucionais de longo prazo não estavam mais preparados para agir
como investidores contrários
[que vendem papéis que se valorizaram e compram ações que estão em baixa" e reduziram acentuadamente suas participações".
As explicações incluem regulamentos de financiamento mínimo para os fundos de pensão,
margens de solvência reduzidas
para as empresas de seguros de vida e preocupações quanto a futuras reformas. A hipótese alternativa, a de uma deterioração dramática das perspectivas econômicas
do Reino Unido depois de 2000,
parece implausível.
Como resultado dessas imensas
correções, as ações britânicas parecem baratas. Uma medida simples é a relação entre os lucros e os
preços das ações. Ela é de 7,4% no
Reino Unido. Lonergan sugere
que a relação preço/lucro (PL)
britânica média, ajustada em termos cíclicos, é ainda mais alta,
chegando a 9%. O mercado britânico também oferece dividendos
médios de 4%. Se os dividendos
crescerem ao mesmo ritmo que a
economia, ou 2,5% ao ano, os retornos reais totais serão de cerca
de 6,5%. Trata-se de retornos
atraentes em termos históricos.
Certamente, são muito mais altos
que os 2% agora obtidos dos títulos do governo.
A relação entre lucros e preços
das ações alemãs, perto de 11%,
parece muito atraente. Mas, com
dividendos médios de apenas 3%
e uma tendência de longo prazo
de apenas 1,5% ao ano para o
crescimento econômico, a medida alternativa de retorno potencial é de apenas 4,5%.
Enquanto isso, a relação entre
preços e lucros de 5% e um dividendo médio de 2% tornam as
ações norte-americanas relativamente caras, com base em seus
padrões históricos e nos padrões
internacionais hoje vigentes.
Mesmo que os dividendos cresçam em 3,5% ao ano, o retorno
total sobre as ações norte-americanas seria de 5,5%, cerca de um
ponto percentual abaixo de sua
medida histórica.
Poço sem fim?
Isso não significa que a queda
nas Bolsas acabou, mesmo em
Londres. Se Wall Street cair ainda
mais, como parece plausível no
momento, é provável que arraste
outros mercados em sua queda.
Os mercados tendem a se corrigir
com exagero, em ambas as direções. Talvez haja más notícias à
frente, em parte devido às incertezas sobre a guerra e em parte devido a quedas nos mercados em si,
que ameaçam o consumo e os investimentos empresariais.
Seria preciso alguém muito
mais audacioso do que eu para dizer que a queda chegou ao fim.
Mas pode-se dizer, com alguma
confiança, que o colapso de mercados europeus, especialmente o
britânico, conduziu-os a níveis
atraentes. Faria muito mais sentido apostar no investimento em
ações hoje do que há três anos, e é
por isso, dada a perversidade humana, que poucos o estão fazendo
no momento.
Tradução de Paulo Migliacci
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