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RECEITA ORTODOXA
Investimento em papéis do governo cresce mais do que operações de financiamento, apesar da queda dos juros
Banco ainda prefere título público a crédito
NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Juros em queda, inadimplência
sob controle, economia em recuperação. Mesmo diante de fatores
aparentemente positivos, os bancos que atuam no Brasil ainda
preferem aplicar boa parte de seus
recursos em títulos públicos, em
vez de utilizá-los na concessão de
empréstimos a seus clientes.
É o que mostram dados do Tesouro Nacional e do Banco Central sobre o assunto. Desde o ano
passado, o total de dinheiro investido pelos bancos em títulos públicos tem crescido a uma velocidade maior do que a registrada
pelas operações de crédito.
Entre dezembro de 2002 e abril
de 2004, o volume de dinheiro
aplicado em títulos públicos passou de R$ 201,318 bilhões para R$
247,723 bilhões (alta de 23%). No
mesmo período, a carteira de crédito das instituições financeiras
subiu de R$ 284,116 bilhões para
R$ 328,420 bilhões (15,6%).
Estão incluídos nas carteiras de
crédito os empréstimos direcionados, que os bancos são obrigados a conceder, por exemplo, para os setores de habitação e agricultura. Se excluídos, os créditos
em abril chegavam a R$ 240,099
bilhões -menos recursos do que
nos títulos. Em dezembro de
2002, eram R$ 212,427 bilhões.
A aplicação em títulos tem a
vantagem de apresentar um menor risco, já que, em tese, as chances de o governo dar um calote
em sua dívida é bastante reduzida. Além disso, há o atrativo das
elevadas taxas de juros.
Do total de títulos públicos que
os bancos possuíam em abril passado, 73% eram do tipo pós-fixado. Esse tipo de papel é considerado a aplicação mais segura existente no país, pois a rentabilidade
é determinada pelo comportamento da taxa Selic -hoje em
16% ao ano. Outros tipos de título
-como os prefixados e os corrigidos pelo câmbio- são mais
procurados por fundos de investimento e fundos de pensão.
Nos empréstimos a clientes, os
juros médios estão em 44,7% ao
ano. Apesar da taxa elevada, os
bancos preferem a aplicação em
títulos por causa dos menores
custos. Para a concessão de financiamentos, é preciso manter uma
estrutura de análise de crédito.
Além disso, há as perdas decorrentes da inadimplência. Nos últimos meses, porém, o atraso nos
pagamentos tem permanecido estável, em torno de 8%.
Para Roberto Troster, economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira dos Bancos), a estagnação do crédito é explicada,
entre outros fatores, pelos elevados recolhimentos compulsórios
praticados no país.
A legislação em vigor exige que,
do total de depósitos feitos em
conta corrente, poupança ou
CDBs (Certificados de Depósito
Bancário), uma parcela seja recolhida pelo BC. Isso é feito para evitar que um aumento muito forte
no volume de dinheiro em circulação no país provoque um aumento da inflação.
No Brasil, os compulsórios recolhidos pelo BC somam R$
114,855 bilhões -dinheiro que
poderia ser direcionado a outras
operações, como o crédito. "Isso
tem que ser mudado, para que o
país possa crescer", diz Troster.
O consultor Alberto Borges Matias, da ABM Consulting, diz que
o aumento da dívida pública e as
altas taxas de juros prejudicam a
expansão dos financiamentos.
"Nos países emergentes, os juros
reais [taxa de juros descontada a
inflação] oscilam de 2% a 3% ao
ano. Aqui, estão em 10%. O rendimento oferecido pelos títulos públicos ainda é muito atrativo."
O baixo volume de crédito é
apontado como um dos obstáculos ao crescimento da economia.
Segundo o BC, os empréstimos
concedidos pelo sistema financeiro representam 26% do PIB. Em
países como o Chile, a proporção
chega a 70%.
Microcrédito
Medidas anunciadas em 2003
para expandir o crédito ainda não
tiveram efeito significativo no total de empréstimos disponíveis.
Em 2003, o governo federal determinou aos bancos que aplicassem 2% do dinheiro depositado
em contas correntes no chamado
microcrédito. Além disso, passou
a permitir que as empresas descontem, direto na folha de pagamento, parcelas de empréstimos
bancários contraídos por seus
funcionários.
O governo não dispõe de um
balanço consolidado dos resultados dos programas. No Banco do
Brasil, por exemplo, os financiamentos somam R$ 25 milhões.
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