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ARTIGO
Riscos são mais políticos que geológicos
MARTIN WOLF
DO "FINANCIAL TIMES"
Os preços do petróleo voltaram a ocupar as manchetes.
Tendo ultrapassado os US$ 40
por barril, ante menos de US$ 20
em dezembro de 2001, o preço
vem causando preocupação
quanto às perspectivas da economia mundial. Por que os preços
subiram? O que pode acontecer
com eles? E, especialmente, será
que a tendência indica o fim do
petróleo barato?
Uma resposta parcial a essas
perguntas é oferecida pelo mais
recente relatório mensal da IEA
(Agência Internacional de Energia, na sigla em inglês): "Atingindo quase 2 milhões de barris ao
dia, o crescimento na demanda
prevista [para 2004] deve ser o
mais alto em 16 anos". Segundo a
IEA, o aumento no consumo
mundial de petróleo atingirá os
3,6 milhões de barris de petróleo
diários entre 2002 e 2004. A China
deve gerar 36% dessa elevação, a
América do Norte, 24%, os demais países em desenvolvimento
da Ásia, 16%, e a Europa, 11%.
O enigma parece ser o fato de
que a produção continue a subir
ainda mais rápido. É verdade que
a produção dos países-membros
da OCDE (Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento
Econômico) continua a cair, de
21,9 milhões de barris ao dia em
2002 para 21,6 milhões, de acordo
com as projeções da IEA, neste
ano. Mas a produção dos demais
países não-integrados à Opep
(Organização dos Países Exportadores de Petróleo) deve aumentar
em 2,3 milhões de barris diários
entre 2002 e 2004.
Esses números não sugerem
que haja baixa oferta no mercado.
De fato, a IEA ressalta que o equilíbrio entre a oferta e a procura
conhecidas, mais as alterações de
estoques, demonstram excedente
de 1,2 milhão de barris diários no
primeiro trimestre deste ano. A
organização conclui que o problema deve estar em uma subestimativa da demanda real.
Explosão
Se isso se confirmar, a demanda
real deve ter passado por uma explosão. Uma possibilidade alternativa seria o fato de que os aumentos nos preços em dólar do
petróleo, de 2001 em diante, reflitam em parte a fraqueza da moeda dos EUA e as especulações
quanto à estabilidade da região do
golfo Pérsico. Se um colapso do
regime saudita removesse o petróleo do país dos mercados mundiais, mesmo que apenas temporariamente, 10% da produção
mundial total desapareceria. O
impacto sobre os preços e a economia mundial seria maior do
que no caso da perda da produção
iraniana de petróleo, em 1979. E a
revolução iraniana bastou para levar os preços mundiais aos US$
100 por barril (em preços atuais).
Essa possibilidade, por mais remota que pareça, ajudaria a explicar os preços elevados que temos
hoje. Mas eles não durariam sem
que haja um grande acúmulo de
estoques em algum lugar.
Suponhamos, ainda assim, que
os preços altos perdurem. Qual
seria o seu impacto sobre o mundo? A resposta mais sombria é sugerida pela correlação histórica
entre o preço real do petróleo e o
índice de desemprego. O aumento atual é modesto, em termos
históricos, mas o nível é semelhante (em termos reais) ao do final de 2000 e, antes disso, de 1990.
Em ambos os casos, aconteceram
recessões logo a seguir.
De acordo com a análise da IEA,
conduzida em colaboração com o
secretariado da OCDE, a situação
não é tão preocupante. A conclusão da agência é que um aumento
sustentado de US$ 10 no preço do
barril de petróleo, de US$ 25 para
US$ 35, reduziria o PIB, caso nenhum outro fator se altere, em pelo menos 0,5%, no ano subseqüente. A transferência de renda
dos importadores para os exportadores atingiria os US$ 150 bilhões -quase 0,5% do PIB mundial. O efeito depressivo dessa
transferência sobre os países que
são importadores líquidos mais
que compensaria o estímulo gerado pelas receitas mais altas nos
países que são exportadores, em
termos líquidos.
Impacto
Os preços mais elevados reduziriam o PIB dos países integrados à
OCDE em 0,4% no primeiro e segundo anos de vigência. Os países
da zona do euro, que dependem
do petróleo importado, sofreriam
mais que todos, com o PIB caindo
0,5% e a inflação subindo 0,5% no
primeiro ano. Os EUA teriam menos problemas. Os países em desenvolvimento importadores de
petróleo continuariam a sofrer
mais efeitos negativos.
A IEA estima que a perda de PIB
seria de 0,8% na Ásia e de 1,6%
nos países pobres e altamente endividados. A África ao sul do Saara perderia até 3% de seu PIB. O
argumento moral em favor de
compensar de alguma maneira
esses países pobres e importadores de petróleo é acachapante.
A análise da IEA sugere que, se
os preços atuais se mantiverem, o
impacto sobre a economia mundial seria significativo, mas -exceto no caso dos países importadores de petróleo mais pobres-
não muito dramático. Se os preços voltarem a subir, a situação
mudará. Mas esse aumento teria
de ser grande para tirar dos trilhos
a recuperação econômica.
A questão final é determinar se a
era do petróleo barato se encerrou. Eu defendo a opinião de que
preços altos hoje são arautos de
preços baixos amanhã. Embora o
impacto dos preços altos sobre a
oferta e a procura seja baixo em
curto prazo, aumenta muito em
prazos mais longos.
Está longe de ser evidente que o
aumento dos preços possa ser explicado pela alta na demanda, já
que a produção está, aparentemente, crescendo mais rápido. Se
for esse o caso, os preços devem
voltar a cair. E as altas de preços
até agora registradas não bastariam para tirar a recuperação econômica dos trilhos, mas mesmo
assim podem ser dolorosos. A
opinião ortodoxa também insiste
em que o mundo está encontrando cada vez mais petróleo.
Se isso for verdade, os riscos são
mais políticos que geológicos
-um motivo de conforto, até
certo ponto. Mas, dadas as atuais
circunstâncias geopolíticas, não
podemos nos sentir seguros. Depois do 11 de Setembro, os EUA
entraram em conflito ideológico
com a superpotência mundial do
petróleo, ela mesma dividida por
cisões políticas internas. Há motivos, portanto, para que todos nós
nos sintamos nervosos.
Tradução de Paulo Migliacci
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