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OPINIÃO ECONÔMICA
Eleições e instabilidade econômica
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Meus amigos, não é fácil acordar todos os dias e ler os jornais. Como dizia Fernando Pessoa, a leitura da imprensa é frequentemente uma agressão ao
senso estético e ao senso moral.
Nos últimos dias, apareceram
formadores de opinião dispostos a estabelecer uma relação de
causa e efeito entre as pesquisas
eleitorais e a instabilidade dos
mercados financeiros e de capitais no Brasil.
Era o que se poderia esperar.
Economistas e consultores econômicos, desses que estão sempre a serviço dos interesses estabelecidos, apressaram-se a atribuir a turbulência financeira à
perspectiva de um segundo turno nas eleições presidenciais.
Um deles, mais afoito, identificou a indefinição do programa de governo da oposição como causa da apreensão dos investidores.
Realmente, o ridículo não tem
limites no Brasil. Não é preciso
ser um observador especialmente atento para perceber que a
instabilidade recente é anterior
à divulgação das pesquisas de
intenção de voto. Ela tem raízes
em um cenário econômico e político que está claramente configurado desde o final do ano
passado, pelo menos.
Esse cenário combina três ordens de fatores: a) a conjuntura
político-eleitoral; b) os focos de
instabilidade internacional (Japão, alguns países "emergentes"
no leste da Ásia, Rússia, risco de
uma queda abrupta da Bolsa de
Valores nos EUA); e c) os desequilíbrios macroeconômicos
acumulados pela política econômica brasileira desde 1994.
Não é incomum que períodos
eleitorais estejam associados à
instabilidade econômico-financeira. A razão é simples. Os
mercados têm conhecimento de
que, nesses momentos, os governos ficam particularmente propensos a postergar decisões econômicas difíceis e podem, inclusive, cair na tentação de adotar
medidas eleitoreiras que aprofundem os desequilíbrios macroeconômicos.
São muitos os exemplos de
crises financeiras que ocorreram em períodos pré-eleitorais
ou logo após a realização de
eleições importantes.
No Brasil, tivemos o colapso
do Plano Cruzado, pouco depois das eleições de 1986, além
de uma hiperinflação nos últimos meses do governo Sarney.
No Peru, houve a hiperinflação do final do governo Alan
Garcia. Na Argentina, a "débâcle" do governo Alfonsin e, em
consequência, a antecipação da
posse de Menem.
Mais recentemente, tivemos a
crise econômica do México, que
ocorreu pouco depois das eleições presidenciais de 1994, a
despeito de uma vitória relativamente folgada do candidato
do governo, Ernesto Zedillo. E,
em fins do ano passado, a Coréia do Sul engrossou a extensa
lista de países que passaram por
colapsos econômicos em períodos eleitorais.
No Brasil de 1998, há uma circunstância específica que pode
agravar o tradicional dilema
entre ajustamento econômico e
prioridades eleitorais dos governos: o instituto da reeleição.
Com o presidente da República
e a maioria dos governadores
lutando não mais para fazer os
seus sucessores, mas pela preservação do próprio emprego,
torna-se mais difícil acreditar
que haverá ajustamento econômico e respeito às exigências de
disciplina fiscal e financeira.
É claro que o quadro eleitoral
(ou reeleitoral) não é, por si
mesmo, capaz de desencadear
uma crise econômica. O que
torna a situação atual delicada
e os mercados nervosos é a já
mencionada combinação de calendário político, turbulências
externas e fragilidades financeiras produzidas pela política
econômica brasileira dos anos
recentes.
Esse último aspecto é o crucial. As turbulências externas
não foram, até agora, suficientemente fortes para desestabilizar senão os países que, como o
Brasil, adotaram políticas econômicas irresponsáveis e ficaram extraordinariamente dependentes da disponibilidade
de capitais externos.
Países que seguiram políticas
mais prudentes sofreram pouco
ou nada nos períodos de instabilidade dos mercados financeiros internacionais. O Chile, por
exemplo, quase não sentiu os
efeitos da crise do México em
1994-95. Taiwan também não
foi muito afetada pela crise no
leste da Ásia, apesar de estar
próxima do seu epicentro.
Já está mais do que na hora,
portanto, de deixar de lado a
conversa fiada e o escapismo
barato, que costumam caracterizar o discurso do governo e de
seus porta-vozes extra-oficiais.
Depois de vários anos de elevados desequilíbrios no balanço
de pagamentos e nas contas governamentais, de rápida expansão do endividamento externo e
da dívida pública, o Brasil ficou
em uma posição extremamente
delicada.
Nessas circunstâncias, não há
muito espaço para terrorismo
eleitoral. É jogar lenha em uma
fogueira que já arde forte há
algum tempo.
Paulo Nogueira Batista Jr., 43, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas, escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjr@ibm.net
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