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LUÍS NASSIF
A fritura de Malan
Acabou-se o tempo político do
ministro da Fazenda, Pedro Malan. Na quinta, pessoas do círculo
mais próximo a FHC ajudaram
na ampliação das críticas do ministro do Desenvolvimento, Clóvis
Carvalho, contra ele. Antes disso,
seu comportamento já havia sido
alvo de críticas fortes no âmbito da
própria Câmara do Desenvolvimento -ou o nome que se dê à
reunião semanal que ocorre entre
FHC e os ministros da Fazenda, do
Desenvolvimento, da Integração
Nacional, Agricultura e presidentes do Banco do Brasil e do Banco
Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES),
coordenados pela Casa Civil.
Em uma das últimas reuniões,
foi levada à Câmara proposta de
tirar empresários inadimplentes
junto ao fisco da lista do Cadim (o
cadastro dos devedores da União).
A inclusão nessa lista automaticamente impede os empresários de
tomar empréstimo junto a bancos
oficiais e vender para o governo. A
Câmara acordou que se deveria
acabar com esse índex.
No meio da semana, Malan por
conta própria soltou uma portaria
que se limitava a impedir que a inclusão na lista fosse motivo para a
não-concessão de crédito oficial.
Na reunião seguinte da Câmara,
foi severamente admoestado por
Clóvis Carvalho e o ministro-chefe
da Casa Civil, Pedro Parente, que
criticaram o fato de ter agido por
conta própria, atropelando o consenso da Câmara e tomando medida que consideraram insuficiente para sanar a questão.
É apenas um capítulo a mais na
lista de decisões que emperram na
Fazenda por conta da falta de comando de Malan. O caso mais
acintoso é o da regulamentação
dos planos de saúde, que está desde outubro do ano passado na gaveta do superintendente da Superintendência de Seguros Privados
(Susep) -uma demora não apenas escandalosa em si, mas tremendamente negativa para a
imagem do governo, dada a repercussão que cercou a lei dos planos
de saúde. Mas, no caso do Cadim,
a crítica foi do grupo central de poder.
No fundo, o que ocorre é que
Malan já cumpriu o papel que lhe
foi atribuído por FHC. Nesses quatro anos, por conta de uma visão
torta de análise política, atribuiu-se a Malan poder político, ambição na carreira, ligações com
ACM e PFL etc.
Tratava-se de amplo exagero, típico de um certo tipo de análise
brasiliense. Malan nunca deu provas concretas de apego ao poder
nem de se prestar a manobras políticas de facções aliadas. Eventualmente, recebia apoio de ACM
apenas por questão tática da parte
deste, como um anteparo a José
Serra, mas jamais deixou de ser
FHC.
Deu a FHC a liberdade que este
queria para rebater a influência
do PSDB e de outros grupos de
apoio e poder dar trombadas econômicas sozinho, sem ser incomodado. Na época, essa postura reativa e amorfa era enaltecida por
Malan e seu chefe como necessária
para acabar com o nível de adrenalina que sempre cercou a política econômica. O desafio era restabelecer a previsibilidade -foi esta
a fundamentação teórica para a
inércia política que viu, dia após
dia, aproximar-se o desastre dos
juros e do câmbio sem tomar uma
atitude proativa sequer.
Após a crise cambial, mudou a
cabeça de FHC e do país. O presidente percebeu que ou tratava de
governar ou não chegaria ao fim
de seu governo e passou a valorizar outros paradigmas. Em lugar
de enaltecer as posturas previsíveis, passou a cobrar ação, gerenciamento, resultados. E aí não havia mais espaço para Malan.
Como FHC é extremamente lento em seu processo de tomada de
decisão, aparentemente está sendo
auxiliado por seu corpo mais próximo de auxiliares, que dia após
dia adiciona mais óleo à fritura de
Malan.
O aparente recuo de Clóvis Carvalho nas críticas a Malan ameniza, mas não altera, a natureza da
fritura. Demonstra apenas como
esse estilo de FHC é desnecessariamente longo, custoso e cruel para
com os próprios amigos.
E-mail: lnassif@uol.com.br
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