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GLOBALIZAÇÃO
Países menos desenvolvidos sentem-se excluídos das decisões na OMC; só 30 entre 135 têm voz
Revolta dos pobres é ameaça em Seattle
CLÓVIS ROSSI
enviado especial a Seattle
Uma revolta dos países pobres
está colocando em risco a 3ª Conferência Ministerial da OMC (Organização Mundial do Comércio), que deveria terminar ontem
e convocar a Rodada do Milênio,
novo e abrangente ciclo de negociações comerciais planetárias.
Tais países sentem-se excluídos
do processo decisório, que, na
prática, ocorre na chamada
"green room".
É uma alusão à sala com esse
nome que existe na sede da OMC
em Genebra, na Suíça, para a qual
é convocado periodicamente um
grupo entre 25 e 30 países, os
grandes atores do comércio internacional, para tomar decisões que
depois são impostas aos restantes
135 países-membros da organização.
Esforço
Em Seattle, o sistema se reproduziu. Às 7h (13h em Brasília),
cerca de 25 países, Brasil incluído,
foram convocados para o "green
room", em um esforço de última
hora para tentar dissolver os inúmeros impasses que vêm sistematicamente bloqueando qualquer
progresso na Conferência da
OMC.
Os excluídos protestaram duramente. O Grula (Grupo Latino-Americano e do Caribe), formado
por 33 países, emitiu comunicado
condenando "a forma como estão
sendo conduzidas as negociações".
O grupo ameaçava "não participar do consenso requerido para o
cumprimento dos objetivos desta
Conferência Ministerial" (todas
as decisões na Organização Mundial do Comércio são tomadas
por consenso, não por votação).
Divisão
O Brasil dissociou-se da manifestação do Grula.
Mas a OUA (Organização de
Unidade Africana) assumiu posição rigorosamente idêntica: "Não
há transparência nos procedimentos e os países africanos estão
sendo marginalizados e, em geral,
excluídos de assuntos de vital importância para nossos povos e seu
futuro".
Como os latino-americanos, os
africanos ameaçam não se somar
ao consenso.
O comissário (espécie de ministro) europeu para o Comércio,
Pascal Lamy, admitiu abertamente que os procedimentos adotados são incorretos.
"Com todo o acesso que tenho,
por representar a União Européia, acho extremamente difícil
participar do processo. Posso
imaginar, portanto, a dificuldade
de países que não têm tal acesso",
diria Lamy, em entrevista coletiva
na manhã de ontem.
Ameaça
A revolta dos pobres é uma
ameaça à Conferência pelo seguinte: mesmo os participantes
das reuniões da "green room"
não conseguem pôr-se de acordo.
A reunião, iniciada às 7h, havia
examinado apenas a terça parte
do item agricultura até 12h (18h
em Brasília). E mesmo a parte já
examinada poderia ser reaberta,
dependendo dos acordos e desacordos na discussão dos itens restantes da parte agrícola.
Ainda que se chegue a um acordo sobre agricultura e se passe,
depois, aos demais itens, os países
incluídos na "green room" terão
que vender o documento por eles
produzido aos mais de cem países
excluídos.
Aí, o risco de impasse total cresce substancialmente, até porque,
além de divergências em torno do
conteúdo do documento, há um
extremo mau humor, entre os excluídos, pela maneira como a
Conferência acabou sendo organizada e conduzida.
EUA
O único elemento de distensão,
ontem até a hora do almoço, era o
fato de que Charlene Barshefsky,
a responsável pelo comércio externo norte-americano e, como
tal, presidente da Conferência,
não repetiu a ameaça de agir unilateralmente, se não houvesse
consenso.
Consenso, aliás, não há nem no
mais restrito grupo de incluídos:
por volta de 3h da madrugada (9h
em Brasília), União Européia e
EUA iniciaram um encontro bilateral para tentar resolver as divergências.
Ao final do encontro, Pascal
Lamy, o comissário europeu para
Comércio, admitia: "Temo que
ainda haja algumas grandes brechas entre nós".
Em tese o prazo final para a
Conferência iria até 18h (0h de hoje em Brasília). Mas até o chanceler brasileiro Luiz Felipe Lampreia já admitia a possibilidade,
embora remota, de que a Conferência não terminasse no prazo.
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