São Paulo, domingo, 04 de dezembro de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

RETRATO DO BRASIL

Pesquisa indica que, há 13 anos, 16,6% das pessoas eram muito pobres; em 2004, percentual recuou para 8%

População indigente cai pela metade desde 92

DA SUCURSAL DO RIO

Menos pessoas viviam no ano passado na pobreza ou na indigência no Brasil. A proporção de indigentes era de 8% da população -1,7 ponto percentual menor do que em 2003, quando 9,96% se encontravam nessa situação. Já o total de pobres baixou de 35,6% para 33,2%.
Os dados são de trabalho inédito da economista Sonia Rocha, especializada em pobreza e desigualdade, feito com exclusividade para a Folha. Pela mesma metodologia, o percentual de pobres e indigentes era bem mais elevado na década de 1990. Em 1992, 44% da população brasileira estava abaixo da linha da pobreza e 16,6% das pessoas podiam ser classificadas como indigentes.
A grande retração ocorreu logo após o Plano Real. Em 1993, os pobres representavam 44,1% da população. Dois anos depois, em 1995, a proporção caiu quase 11 pontos percentuais, para 33,2%. O número de pobres manteve-se sempre ao redor de um terço da população desde então e chegou ao pico em 2001 (35%).
Para a economista, que concebeu uma metodologia inédita de linhas de pobreza, houve uma queda "substancial" da pobreza de 2003 para 2004, propiciada pelo maior aquecimento da economia (o Produto Interno Bruto cresceu 4,9%) e pelo conseqüente aumento do emprego.
O crescimento dos rendimentos na base da pirâmide social, diz ela, também explicam a redução da pobreza no país.
""É uma queda bastante intensa, especialmente em apenas um ano", afirmou a economista.
O rendimento do trabalho cresceu 3,2% para a metade mais pobre dos ocupados. Já entre os 50% mais ricos, a renda teve retração de 0,6%. No topo, os 5% que ganhavam mais perderam 1,6%.
Para Rocha, a expansão da renda dos mais pobres e o fato de ter crescido o emprego e caído o número de lares sem rendimento indicam que houve melhora na distribuição da renda no Brasil.

Suspiro
Rocha diz, porém, que é cedo para dizer que o Brasil tenha ingressado numa fase de redução da desigualdade longa e definitiva: "Basta o país e o rendimento voltarem a crescer que os mais ricos vão ganhar mais e a desigualdade irá piorar. Não dá para afirmar que é tendência de longo prazo".
Para a economista, o que houve foi um "suspiro". "Não vejo tendência de queda de desigualdade. Se o país sair da crise e voltar a crescer, pode ter novamente um crescimento de padrão desigual. É um suspiro."
Na semana passada, o Centro de Políticas Sociais da FGV (Fundação Getulio Vargas) divulgou que nos dois primeiros anos do governo Luiz Inácio Lula da Silva a proporção de pobres caiu, em média, 2,2% no país.
Pelos dados da FGV, o número de pobres chegou, no ano passado, a 25,1% da população, o menor nível desde 1992. Em 2004, a pobreza teve uma redução mais acentuada -de 8%-, graças, principalmente, à melhora da distribuição de renda no país, segundo o economista Marcelo Neri, coordenador da FGV. Em 1992, os pobres eram 35,9% da população.

Metodologias distintas
Os dados de Rocha e de Neri são diferentes porque eles utilizam metodologias distintas.
Sonia Rocha usa linhas de pobreza diferentes para cada lugar do país. Ao usar referências distintas para definir quem é pobre, diz, é possível medir com mais precisão o fenômeno. Isso porque há uma diferença muito grande entre uma família viver em São Paulo com R$ 100 ao mês, por exemplo, e na área rural do país, onde os preços são mais baixos e parte do consumo vem da autoprodução.
Já Neri sustenta que, independentemente da medida utilizada, a pobreza e a desigualdade estão em constante declínio no país. "Qualquer que seja a linha, há queda da pobreza. O mesmo ocorre quando olhamos para o Índice de Gini, que mostra melhora da desigualdade", afirmou o economista da FGV.
Para a economista Lena Lavinas, da UFRJ, um dos motivos para o recuo da proporção de pobres é a queda mais intensa dos preços dos alimentos.
Os dados do IBGE mostram que o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) geral teve alta de 148,7% de 1995 a outubro de 2005, enquanto os preços dos alimentos subiram bem menos -93,4%.
No INPC, que mede o custo de vida de quem ganha até oito salários mínimos, o peso dos alimentos caiu de 33,9%, em 1995, para 28,9%, em 2005 (até outubro). Ou seja: com os alimentos abaixo da média, sobrou, em tese, mais dinheiro para consumir outros itens. Isso, no entanto, pode não ter acontecido na prática por causa da queda do rendimento do trabalho -18% no acumulado de 1996 a 2004, segundo a Pnad.
(PEDRO SOARES)

Texto Anterior: Lições contemporâneas - Aloizio Mercadante: Reconstruindo
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.