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ARTIGO
Pnad mostra declínio da pobreza
SONIA ROCHA
ESPECIAL PARA A FOLHA
As informações recém-divulgadas da Pnad 2004 mostram uma redução inequívoca da
pobreza e da indigência, considerando, nos dois casos, os conceitos que são relevantes para essa
avaliação: a renda familiar ou domiciliar per capita.
A proporção de pobres cai de
35,6% em 2003 para 33,2% em
2004, o que corresponde a 57,7
milhões de pessoas pobres nesse
último ano, enquanto a proporção de indigentes passa de 10%
para 8%, significando 13,9 milhões de indigentes em setembro
de 2004.
Para chegar a esse resultado,
utilizaram-se 23 linhas de pobreza
e 23 linhas de indigência diferenciadas, de modo a levar em conta
a diversidade de custo de vida entre áreas urbanas e rurais, assim
como entre as regiões brasileiras.
Como exemplo, a linha de pobreza mais alta, relativa à metrópole
de São Paulo, foi de R$ 250,79, enquanto a mais baixa referiu-se às
áreas rurais de Minas Gerais e do
Espírito Santo, de R$ 69,75 (valores por pessoa/mês).
Os cerca de dois pontos percentuais a menos em ambas as proporções são o melhor resultado
verificado desde o Plano Real,
quando houve uma conjunção
propícia de fatores permitindo
uma redução drástica da proporção de pobres de 44,1% para
33,2%.
Os resultados favoráveis verificados em setembro de 2004 para
as famílias situadas na base da
distribuição de rendimentos foram determinados essencialmente por dois fatores.
Por um lado, houve uma robusta criação de postos de trabalho
(mais 2,7 milhões), que beneficiou diretamente os mais pobres.
Isso porque essa criação de postos
de trabalho ocorreu concomitantemente a uma redução forte do
contingente de pessoas ocupadas
que não recebem nenhum rendimento e que anteriormente estavam envolvidas em atividades
não-remuneradas, em geral no
âmbito do grupo familiar.
Por outro lado, verificou-se um
aumento grande do volume de
transferências de renda, tanto da
Previdência Social como dos novos programas focalizados nas famílias mais pobres. No que concerne aos mais pobres, seja participando do mercado de trabalho
ou recebendo benefícios da Previdência, a preocupação do governo em garantir algum aumento
real do salário mínimo -2,25%
entre setembro de 2004 e setembro de 2005- certamente contribuiu positivamente para a melhoria da sua renda.
É importante destacar que esses
resultados favoráveis quanto à
pobreza e à indigência se deram
simultaneamente a uma virtual
estagnação do rendimento médio
do trabalho, que, no entanto, encobre mudanças distributivas favoráveis aos mais pobres.
Assim, para o mesmo salário
médio para o conjunto de ocupados com rendimento, os mais pobres tiveram algum ganho, em detrimento daqueles com rendimentos mais elevados, que, ao
contrário, fizeram face a perdas.
Esse não deixa de ser um resultado surpreendente, levando em
conta a forte expansão da ocupação e os reconhecidos problemas
de escassez de mão-de-obra qualificada, que acabam elevando o
"prêmio" pela posse de qualificação (medida em anos de estudo),
operando, naturalmente, no sentido do aumento da desigualdade.
A redução da desigualdade de
rendimentos do trabalho, assim
como a evolução favorável aos
mais pobres dos benefícios previdenciários e assistenciais, certamente levou a uma redução da
desigualdade da renda domiciliar
como medida pela Pnad.
É razoável afirmar que garantir
a continuidade da redução da pobreza e da indigência é mais fácil
do que garantir uma tendência
sustentada de redução da desigualdade. O crescimento econômico desejado traz consigo tendências inerentes de aumento da
desigualdade no curto prazo via
mecanismos de oferta e demanda
de mão-de-obra no mercado de
trabalho.
Para compensar os efeitos distributivos adversos dessas tendências, é necessário recorrer a
transferências de renda maciças,
para as quais existem limitações
operacionais e orçamentárias evidentes.
A solução da questão crítica da
desigualdade brasileira depende,
mais do que a redução da pobreza
e da indigência, de reformas estruturais, que, pelas dificuldades
institucionais e políticas que envolvem, dependem de um esforço
continuado no médio e longo
prazos.
Sonia Rocha é economista
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