São Paulo, quinta-feira, 05 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

As chances de Lula em 2006

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Lula tem chances de se reeleger? No início do ano passado, ele parecia rigorosamente imbatível. Hoje, muitos o consideram carta fora do baralho.
Fora do baralho? Talvez. Uma coisa ficou clara ao longo do ano passado: uma parte da elite brasileira, possivelmente a maior parte, está mobilizada contra a sua reeleição -e essa é uma das principais barreiras que Lula terá de enfrentar em 2006. No Brasil, as elites formam um clube bastante fechado, que controla os principais meios de comunicação, boa parte do Congresso e do próprio governo federal. Exerce influência avassaladora sobre a área econômica, especialmente sobre o Banco Central.
Em 2005, o ex-metalúrgico descobriu, chocado, que jamais será aceito como membro permanente desse clube. Fez um tremendo lobby, passou anos bajulando os poderosos, tentando se mostrar confiável e inofensivo, mas não adiantou: acabou levando bola preta. Patético.
Os integrantes do clube, por sua vez, descobriram, encantados, que é perfeitamente possível "sangrar" o governo e o presidente da República sem desestabilizar a economia e sem perturbar o andamento da política econômica que tanto lhes favorece. A abordagem funcionou em 2005 e continuará sendo explorada até a exaustão em 2006. Petistas e aliados imaginaram que poderiam lançar mão, impunemente, dos métodos corruptos da política brasileira. Abriram um flanco gigantesco e vão continuar sendo massacrados, a cada dia.
Nesse ambiente, Lula só tem um caminho: acelerar o crescimento da economia. A ampliação do ritmo de crescimento da produção, com aumento mais rápido dos níveis de emprego e renda, é a única forma que ele tem de conquistar o povo e neutralizar o enorme desgaste resultante dos escândalos de corrupção e sua intensa divulgação na mídia nacional. Em outras palavras, restaria ao lulismo tentar reeditar, de alguma maneira, o velho mote adhemarista: "Rouba, mas faz".
É possível? Talvez sim. Para a maioria esmagadora do eleitorado, a questão econômica tem peso preponderante. Além disso, com o passar do tempo, a menos que apareçam novas e graves revelações de corrupção no governo, as denúncias e os escândalos tenderão a perder parte da sua eficácia como arma eleitoral.
Mas Lula tem bala na agulha em termos econômicos? Em tese, sim. As condições da economia permitem acelerar o seu crescimento. Os ventos internacionais continuam soprando a favor. A inflação brasileira está controlada. As taxas de desemprego são altas e existe capacidade produtiva ociosa. As contas externas do país têm registrado excepcional desempenho. O superávit fiscal primário está bem acima da meta oficial.
Suponho que o presidente e seus assessores saibam disso tudo. Nos meses finais de 2005, houve uma queda-de-braço dentro do governo e -ao que parece- o ministro Palocci foi obrigado a aceitar certa inflexão da política fiscal e de outros aspectos da política econômica. O discurso super-ortodoxo da equipe econômica passou para segundo plano e entraram em cena medidas destinadas a estimular a demanda e a distribuição da renda nacional.
Há uma dificuldade, porém. Para o bem ou para o mal, o presidente Lula não controla inteiramente a Fazenda e o Banco Central. Quase todos os postos-chave estão na mão de pessoas identificadas com o pensamento e a agenda dos seus adversários políticos. Muitas dessas pessoas comportaram-se desde o início do governo Lula como se a sua missão fosse completar e aprofundar o programa econômico iniciado por Collor e continuado por FHC.
O Banco Central, em particular, nunca foi tão independente e está dominado por doutrinários ferozes, que parecem dispostos a sacrificar tudo -produção, exportações, renda, emprego (inclusive o do presidente da República) no altar do combate à inflação.
Uma política monetária mais restritiva do que a esperada pode ser a resposta da diretoria do Banco Central a um eventual afrouxamento da política fiscal e a outras medidas de estímulo ao crescimento que venham a ser adotadas pelo governo.


Paulo Nogueira Batista Jr., 50, economista e professor da FGV- EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
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