|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
COMENTÁRIO
Bom motivo para comemorar
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O mundo entrou na era da baixa
inflação. Nos EUA, há não mais
de um ano a grande preocupação
era com o efeito inverso, a deflação. O Brasil, com certo atraso,
parece também ter aprendido a
domar os preços e trazer a taxa de
inflação para níveis "civilizados".
Por algum tempo, economistas
sugeriram que economias menos
desenvolvidas fatalmente teriam
que conviver com taxas de inflação mais altas. O motivo? As economias em desenvolvimento precisavam enfrentar desequilíbrios
que os países centrais não haviam
enfrentado. Gargalos, restrições
externas, crises cambiais. Tudo
conspirava para que o comportamento dos preços fosse mais instável nas economias subdesenvolvidas. Daí, a conclusão de que era
"normal" conviver com inflação
alta caso esses países quisessem
crescer.
Sem tolerância
A tolerância com a inflação acabou. A alta descontrolada de preços corrói o poder de compra da
moeda. O problema, no entanto,
não é apenas este. Há diversos tipos de detentores de moeda. No
Brasil, por exemplo, havia os mais
pobres, que, com o papel moeda
na mão, viam o valor do salário
derreter com as taxas estratosféricas de inflação. E havia as classes
média e alta, que, longe do papel
moeda, possuíam depósitos financeiros, que mantinham relativamente a salvo da inflação. Assim, a inflação machucava muito
mais o bolso dos pobres. Não à
toa, a relativa estabilidade também iniciou um processo, ainda
que muito lento, de melhora na
distribuição de renda.
Planejar em tempos de inflação
também não era fácil. Qual o preço a que os empresários venderão
seus produtos? Qual será a taxa de
inflação do próximo ano? Com
preços tão instáveis, qual o comportamento da taxa de câmbio,
que, na verdade, é o preços das
outras moedas em relação à moeda nacional? Sem horizonte previsível, os investimentos tendem a
minguar. Grosso modo, a taxa de
investimento tende a melhorar
em um país que foge do descontrole de preços -consideradas
todas as demais condições constantes.
O governo planejava, de certo
modo. Mas planejava contando
com a inflação, ou com a corrosão
que ela geraria nas despesas públicas. As contas se equilibravam
sempre "a posteriori". As receitas
de impostos eram indexadas. As
despesas, não. A estabilização, é
verdade, gerou um grande problema. O Estado brasileiro precisou ajustar suas contas, deixando
de fazê-lo à custa de uma ilusão
monetária.
Os preços de uma economia refletem o valor relativo dos bens e
serviços comercializados no país.
Preços instáveis distorcem os preços relativos, dificultam o planejamento das famílias, do governo,
dos empresários. Distorcem investimentos -no Brasil, durante
muito tempo, investimento era sinônimo de investimento imobiliário, o único bem cujo valor relativo parecia mais ou menos estável para os brasileiros.
Há quem discuta o custo de ter
baixado a inflação. Quem ache
que o governo, ao adotar as metas
de inflação em 1999, poderia ter
adotado uma trajetória mais suave de queda. Que, frente a choques, o Banco Central deveria ter
sido mais flexível e evitado ter
comprometido tanto crescimento
para controlar os preços.
Mas, críticas à parte -e algumas delas fazem sentido-, não
há porque não comemorar o fato
de os brasileiros terem se livrado
do fantasma da inflação.
Texto Anterior: Alimentos têm menor variação desde 2000 Próximo Texto: Câmbio: País tem maior entrada de dólar desde 92 Índice
|