São Paulo, sábado, 05 de março de 2005

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TANGO DA DÍVIDA

Fundo vê resultado como "muito bom", mas deverá pedir reabertura da renegociação para os demais credores

FMI sinaliza aprovação à troca argentina

SILVANA ARANTES
DE BUENOS AIRES

O FMI (Fundo Monetário Internacional) classificou ontem como "muito bom" o resultado da troca da dívida pública argentina -76% de adesão dos credores, anunciado anteontem.
O organismo havia estabelecido percentual mínimo de 75% de aceitação da proposta, para considerar o país vizinho livre da moratória. A avaliação positiva divulgada pelo subgerente do Fundo, Austín Carstens, no entanto, não significa reconhecimento oficial pelo organismo da saída da moratória argentina.
Carstens afirma que o FMI ainda tem de "analisar todos os detalhes e o montante que ficou fora da negociação". Amanhã, quando se encontrará em Washington com o diretor do FMI, Rodrigo Rato, o ministro da Economia argentino, Roberto Lavagna, provavelmente ouvirá um pedido para reabrir a troca, possibilitando a adesão dos 24% de credores que a recusaram.
O representante da Argentina diante do FMI, Héctor Torres, disse ao jornal "Clarín" que o país tem uma resposta pronta para este pedido: "Por acaso você conhece algum credor argentino que não aderiu à troca e esteja arrependido, querendo entrar?".
O governo vizinho estima que os credores que rechaçaram a oferta estão dispostos a ir à Justiça tentar recuperar seus investimentos. "Eles vão para o litígio", disse Torres. O italiano Nicola Stock, presidente do Comitê Global de Detentores de Títulos Argentinos, afirmou ontem que o Comitê está "oferecendo assistência legal aos investidores".
Durante a renegociação da dívida argentina, Stock tentou, sem sucesso, barrar a troca num tribunal de Nova York e no tribunal de arbitragem do Banco Mundial para a proteção de investimentos. O investidor considera "mesquinha" a oferta argentina , que obteve desconto de 65% da dívida.
Com o comentário de ontem, Carstens sinalizou ao governo argentino que a relação do país com os credores contrários à oferta será um ponto central na retomada do diálogo do país vizinho com o FMI. A Argentina pretende retomar seu acordo com o Fundo, que está suspenso.
Os novos títulos da dívida argentina começaram a ser informalmente negociados ontem, no chamado "mercado cinza". A cotação -de US$ 34,8 (R$ 92,9) por lote de cem bônus- é informal, porque os títulos somente serão lançados oficialmente no próximo dia 1 de abril.
Ontem, dia seguinte ao anúncio feito pelo presidente Néstor Kirchner do índice de adesão à oferta, predominaram na Argentina as reações de entusiasmo com o resultado, que reduziu a dívida pública em moratória de US$ 102,5 bi para US$ 35 bi.
"A troca da dívida em moratória é um passo transcendental para o nosso país", avaliou a Associação Empresarial Argentina. Kirchner, que adotou atitude vitoriosa no anúncio, continuou recebendo louros pela operação. A União Operária Metalúrgica publicou anúncio no jornal "Clarín" com a mensagem: "Força, presidente. Vamos juntos por trabalho e produção".
Entre os desafios do futuro imediato do país, o controle da inflação começa a se configurar como um problema. Com a alta de 1% em fevereiro, divulgada anteontem, a inflação acumulada no ano é de 2,5%. O resultado já ameaça ultrapassar a meta anual fixada pelo governo -entre 7% e 10%.
A alta da inflação de fevereiro foi puxada sobretudo pelo aumento de preços de alimentos. A preocupação para os próximos meses é que haja pressão inflacionária decorrente do provável aumento de emissões de moeda pelo Banco Central, para sustentar a competitividade do câmbio, com o dólar no patamar de 2,90 pesos.
Eventuais aumentos de inflação terão reflexo também na nova dívida argentina, já que o Bônus Quase-Par -um dos três papéis lançados- tem emissões exclusivamente em pesos e é corrigido pelo índice de inflação.
Para manter regularizados os pagamentos da nova dívida -cujos juros serão de US$ 3,2 bilhões (R$ 8,5 bilhões) por ano-, a Argentina tem pela frente o desafio de sustentar uma série histórica de superávit em torno de 3% e um crescimento anual de cerca de 6%, segundo a estimativa de analistas.


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