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Câmbio da Ásia pode ajudar Brasil, diz UBS
Para conter inflação, China deve permitir apreciação de sua moeda, o que melhoraria a competitividade brasileira, prevê relatório
Real deverá ficar menos valorizado ante o dólar, porém mais apreciado em comparação com moedas asiáticas, diz economista
MARIA CRISTINA FRIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
Moedas atreladas ao dólar
norte-americano a taxas competitivas, como a da China, podem ter de se apreciar fortemente para conter a inflação
em seus países. Isso levaria a
um enfraquecimento do crescimento global porque as exportações asiáticas se tornariam
menos competitivas. Essas são
algumas das conclusões de um
relatório global intitulado
"Câmbio: o Delicado Balanço",
do banco suíço UBS, divulgado
ontem. Caso se confirme esse
cenário, a competitividade do
Brasil tenderia a crescer em relação a economias da Ásia.
"As forças globais vão na direção de um real menos apreciado em relação ao dólar, porém mais apreciado em relação
às moedas asiáticas", diz Paulo
Tenani, analista-chefe do UBS
Pactual, responsável pela parte
relativa ao Brasil no relatório.
Além desse movimento global, há os efeitos da política monetária do Banco Central brasileiro, o BC mais conservador do
mundo, segundo Tenani.
Para o banco, o real segue se
valorizando até o BC afrouxar a
política monetária. A projeção
do analista é de o dólar estar em
R$ 1,60 no curto prazo (entre
três e seis meses) e em R$ 1,70
em 12 meses.
FOLHA - As economias asiáticas
têm resistido às pressões para valorizar suas moedas. Por que elas seriam levadas a ceder?
PAULO TENANI - Não é claro
quando isso vai acontecer. Esses países se acostumaram a
um tipo de crescimento que é
baseado em salários baixos. A
manter as taxas de câmbio superdesvalorizadas e competitivas, o que significa salários baixos em relação ao mundo.
Vou ter um crescimento em
que vou trabalhar, trabalhar e
conseguir exportar. Não se pode ter alguém exportando sempre. Significa que alguém estará
importando sempre, o que não
é sustentável. O que está acontecendo agora é que você começa a ter pressões que, talvez, façam esses países pensarem que
vale a pena apreciar o câmbio.
É um dilema para eles. Ter de
passar para um crescimento
em que meu salário aumenta e
as minhas exportações diminuem. Passo a importar mais.
Agora, há pressões inflacionárias, que vêm da desvalorização
do dólar e da existência da própria China, pressionando o preço de commodities. Que não seja este ano, que não seja o próximo, mas pressões inflacionárias surgem, e esses países todos têm conta corrente forte,
positiva, salários baixos e um
câmbio desvalorizado, têm o
PIB real crescendo, emprego
crescendo. Mas, quando você
não consegue ter essas coisas, é
a inflação que cresce, muitos
países vão optar pela valorização cambial. Esse, talvez, tenha
sido o dilema do Brasil. Talvez,
aquela incapacidade de o Brasil
crescer sem ter inflação tenha
levado o Banco Central a escolher: não, eu quero o câmbio se
apreciando. Não é claro esse dilema. Mas é um dilema que os
países asiáticos agora estão
sentindo.
FOLHA - E o Brasil?
TENANI - O Brasil já sofreu com
parte dos custos [para o ajuste
dos Estados Unidos], com a taxa de câmbio apreciada. O emprego cresce menos do que deveria. Com a apreciação da
moeda, o país exporta emprego
para os outros. [Se as moedas
asiáticas se valorizarem] farão
seu papel de suavizar... A exportação de empregos ocorrerá
mais com moedas da Ásia e menos com a do Brasil.
Além disso, tem o efeito interno, da política do Banco
Central brasileiro. Com a taxa
Selic em 11,25% e as taxas de juros sobre a dívida externa soberana do Brasil em 6,5%, o diferencial de juros continua extremamente elevado, mais que
compensa o risco de moeda no
Brasil. Os juros teriam de recuar 9% para que os investidores recebessem uma remuneração justa.
FOLHA - Esse movimento global é
um desdobramento de um problema estrutural dos Estados Unidos?
TENANI - É o ajuste na conta
corrente americana, que chegou a ser 6,7% do PIB e agora
está em 5,5%.
Na medida em que eu tenho
alguns países que controlam a
taxa de câmbio, grande parte
desse ajuste está vindo de países como a Europa e o próprio
Brasil. O Brasil é pequenininho,
mas ele está ajudando muito no
ajuste da conta corrente americana, na medida em que os Estados Unidos estariam exportando muito mais desemprego
para o Brasil do que deveriam,
porque o Brasil é um país de taxa de câmbio flexível num
mundo onde a Ásia inteira fixa
a taxa de câmbio. Não estão
sendo suficientes para resolver
o problema dos Estados Unidos
algumas poucas moedas flexíveis, e o que nós vamos precisar
agora é que uma China também
aprecie, Japão, que as economias da Ásia, que nunca souberam crescer baseadas em salários altos, em importações,
aprendam uma nova maneira
de crescer.
FOLHA - Mas e a China...
TENANI - A China é o tipo de
país que até lembra o nosso,
não é? Desemprego enorme.
Então, na hora em que eu vou
optar por crescer aumentando
o salário ou aumentando uma
unidade de emprego: eu prefiro
dar R$ 100 a mais para um cara
desempregado a dar R$ 100 a
mais para um cara já empregado. Então, a apreciação cambial
na China é algo que eles lutaram violentamente contra pelo
excesso de desemprego que
têm. Pela grande força de trabalho excedente que existe na
China. Só que agora as pressões
inflacionárias estão vindo, e
eles vão entrar nesse dilema
que o Banco Central brasileiro,
também teve, de considerar
uma apreciação cambial e aumento de salário. Emprego não
aumenta tanto, mas ao mesmo
tempo eu amenizo o problema
da inflação, que dobrou num
período bastante curto.
FOLHA - Os grandes beneficiados
seriam Europa e EUA...
TENANI - O setor produtivo fora
da Ásia será incapaz inicialmente de atender à demanda.
Essas mudanças podem beneficiar produtores principalmente da Europa e dos Estados Unidos. A Europa com a inflação
muito acima do que é considerado confortável pelo Banco
Central Europeu, que é um BC
que olha apenas a inflação e que
tem raízes no BC alemão, talvez, o segundo banco central
mais conservador do mundo,
depois do nosso. Mais cedo ou
mais tarde o dólar se aprecia
perante o euro.
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