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São Paulo, sábado, 05 de abril de 2003

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LUÍS NASSIF

A dúvida no câmbio

No congresso , cada batalha é uma batalha. As próximas batalhas do governo -reformas da Previdência e tributária- serão mais complexas do que aquela em torno da emenda que regulamentou o sistema financeiro. Mesmo assim, foi uma vitória graúda, que ajudará Lula a vencer a desconfiança internacional em relação ao seu governo. É questão de tempo para o país obter o ambicionado "upgrade", capaz de reduzir o custo dos financiamentos externos.
Agora é hora de discutir a fundo os limites desse livre fluxo de capitais e, especialmente, de queda do dólar.
No ano passado, a desvalorização do real abriu caminho para a solução da crise externa, ao permitir a explosão dos superávits comerciais. Muitos setores novos viabilizaram suas exportações a partir da nova cotação da moeda.
Houve contra-indicações, as principais das quais o aumento da inflação, o aumento da dívida interna, a pressão sobre as tarifas dolarizadas e, especialmente, o aumento da exposição dos grandes grupos que se endividaram em dólares.
Mesmo assim, a redução da vulnerabilidade externa passou a ser um bem precioso, reduzindo a dependência de capitais voláteis e abrindo espaço para o crescimento sustentado, assim que os feitos nocivos da desvalorização no campo inflacionário fossem controlados.
E agora? O pecado original no modelo de abertura do país foi ter permitido o livre fluxo financeiro, na falsa suposição de que abriria espaço para o investimento produtivo. Não se considerou que, dada a pouca abertura externa da economia brasileira, qualquer aumento ou redução do fluxo criaria um clima permanente de instabilidade cambial. Dolarizou-se bastante a economia, com tarifas indexadas e aumento das importações, e amarrou-se o bode a um balão, a um preço totalmente subordinado aos humores do mercado financeiro internacional.
O resultado foi o artificialismo da contenção do câmbio no primeiro governo FHC, quebrando o setor público; e as explosões do dólar no ano passado, ao menor sinal de instabilidade política.
E agora, vai-se reconstruir esse modelo de volatilidade?
O capital entrou no país visando exclusivamente a arbitragem, com os juros internos ou com ativos tidos como depreciados. Se se permitir novamente que o país seja inundado por capital de curto prazo, se valorizará o real e se comerá parte do superávit comercial que reduziu a perspectiva de risco do país -e se exporá o país ao mesmo movimento de antes.
O país ficou barato com a crise do ano passado, pelo fato de ter juros internacionais quase negativos. O capital vem aos borbotões aproveitar a oportunidade. E quando os ativos brasileiros já tiverem se valorizado ou o superávit comercial tiver perdido o vigor? A saída será tão rápida quanto a entrada.
Há inúmeras vantagens na queda do dólar, mas uma desvantagem básica: sem resolver de forma estrutural a vulnerabilidade externa, o país continuará preso à volatilidade da moeda e sem nenhuma condição de definir horizontes de longo prazo.

E-mail - LNassif@uol.com.br


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