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ANÁLISE
Bush se despluga da economia
SHERYL GAY STOLBERG
DO "NEW YORK TIMES"
O PRIMEIRO indício de
que o presidente Bush
talvez tenha se desligado dos problemas econômicos
do país surgiu em fevereiro,
quando ele reconheceu que não
havia ouvido falar de previsões
sobre o preço da gasolina.
Depois, Bush foi a Wall
Street para alertar contra a "intervenção maciça do governo
nos mercados de habitação".
Isso, dois dias antes de seu governo ajudar a intermediar a
venda do banco de investimento Bear Stearns.
No meio da semana, enquanto o presidente pronunciava na
Europa Oriental seu discurso
de despedida da Otan (Organização para o Tratado do Atlântico Norte), no Senado democratas e republicanos batalhavam para produzir um projeto
de lei que ajudasse os proprietários de imóveis endividados,
exatamente a espécie de intervenção contra a qual Bush havia alertado.
Para um homem que chegou
ao posto como o primeiro presidente americano portador de
um diploma de MBA, Bush
conseguiu se fazer notavelmente invisível em meio à crise
da habitação e do crédito. E à
medida que a economia supera
o Iraque como principal preocupação dos eleitores, até mesmo alguns dos aliados republicanos do presidente dizem que
ele corre o risco de parecer desinteressado dos problemas.
"Ele está lá discutindo quem
deve ser admitido à Otan, e o
povo dos EUA está preocupado
com as suas carteiras", disse
Kenneth Duberstein, chefe da
Casa Civil no segundo mandato
presidencial de Ronald Reagan.
"Ele falou sobre a economia,
mas isso não foi visto como resposta satisfatória."
Com o país absorto na disputa por sua sucessão, vem se tornando cada vez mais difícil para
ele ganhar posição central no
cenário nacional. Bush cedeu
sua posição central na economia a outras figuras de Washington -líderes legislativos, o
secretário do Tesouro, Henry
Paulson, e o presidente do Federal Reserve (Fed, o BC dos
EUA), Ben Bernanke.
Enquanto Bush visitava a Romênia, na quarta-feira, Bernanke estava no Congresso para oferecer opinião muito mais
pessimista que a do presidente
sobre a economia. Bush admitiu apenas que o país está num
"percurso acidentado".
Quando a Casa Branca anunciou seu plano de reforma do
sistema de regulamentação financeira, foi Paulson e não
Bush que falou. E o plano de
Paulson, de acordo com o secretário mesmo, não tem por
objetivo oferecer assistência
imediata aos proprietários que
podem perder suas casas por
força da execução de hipotecas.
"Creio que, em geral, o governo esteja agindo certo no combate aos problemas econômicos que enfrentamos", disse o
deputado Peter King, republicano de Nova York. "Mas acredito que, taticamente, seria melhor que o presidente mesmo
assumisse posição mais visível,
em lugar de deixar tanto a cargo
de Paulson. Quando existe uma
percepção de crise nacional, é
importante que o presidente
tome a dianteira".
Ainda assim, porque o público pouco confia em Bush, poderia ser difícil a ele assumir esse
papel, ainda que conte com um
diploma de MBA por Harvard.
Apenas 25% do público aprova
a condução à política econômica, o que representa total ainda
inferior ao de seu índice geral
de aprovação, segundo pesquisa da rede de TV CBS na metade do mês passado.
Dessa forma, não admira que
Bush esteja deixando que outros falem em seu lugar, dizem
alguns republicanos.
"A boa notícia para Bush é
que ele conta com Paulson, que
desfruta de credibilidade quanto a esse assunto", disse John
Fehery, estrategista do Partido
Republicano. "Paulson está fazendo um bom trabalho em
termos de criar a impressão de
que há algo sendo feito."
Outros presidentes tentaram, com graus variáveis de sucesso, aproveitar a posição de
comando em momentos de crise. Franklin Roosevelt usava
pronunciamentos semanais
pelo rádio para acalmar um
país traumatizado pela Grande
Depressão. Mas Gerald Ford foi
ridicularizado por usar um broche com a sigla de uma campanha contra a inflação. O mesmo
houve com Jimmy Carter,
quando disse que reduziria a
temperatura do sistema de
aquecimento da Casa Branca
para economizar combustível.
Palavra vetada
Bush, em contraste, faz o que
pode para não soar pessimista.
Até agora, por exemplo, ele evitou usar a palavra "recessão".
Dois meses atrás, foi elogiado
por unir republicanos e democratas em apoio a um pacote de
estímulo econômico.
Mas ele resistiu a apelos da
presidente da Câmara, Nancy
Pelosi, pela realização de uma
conferência econômica bipartidária a fim de tratar da crise no
mercado hipotecário.
A resistência talvez tenha razões filosóficas. Como declarou
em Wall Street, Bush não acredita em resgate do governo
àqueles que tenham decidido
assumir riscos no mercado.
Mas, ainda assim, já que o
Congresso parece estar se
unindo em torno de um plano
de alguma espécie, James
Thurber, diretor do Centro de
Estudos Legislativos e Presidenciais da American University, diz que Bush deveria assumir papel central.
"Ele tem a chance de demonstrar que é bipartidário e
que pode se colocar acima das
diferenças e resolver problemas", afirmou Thurber.
Funcionários da Casa Branca
rejeitam vigorosamente a alegação de que Bush não vem demonstrando liderança. Dizem
que foi tratado de maneira injusta por seu comentário sobre
o preço da gasolina.
Representantes da Casa
Branca dizem que Bush anunciou em agosto pacote de propostas com o objetivo de ajudar
os proprietários de imóveis de
baixa renda, e que o Congresso,
sob controle democrata, ainda
não aprovou as medidas.
"Ele sabe muito bem como
anda a economia", disse Tony
Fratto, da assessoria de imprensa da Casa Branca. "Viaja
muito pelo país. Fala sobre a
economia com regularidade",
acrescentou.
Embora Bush possa estar falando, os norte-americanos
não parecem estar ouvindo.
Quando o presidente visitou
um centro de aconselhamento
para pessoas endividadas, em
Nova Jersey, isso não atraiu interesse da mídia. Mas os jornais
estavam repletos de notícias
sobre o apoio do senador Bob
Casey, da Pensilvânia, à candidatura presidencial do senador
Barack Obama.
Alguns republicanos dizem
que isso não vai mudar, não importa o que Bush faça ou diga;
as opiniões do público estão tão
estabelecidas, argumentam,
que Bush seria considerado
culpado mesmo que agisse de
maneira mais agressiva. Mas
Duberstein, ex-chefe da Casa
Civil de Reagan, diz que Bush
deveria tentar.
"Ele precisa voltar a ser tema
de conversas", disse Duberstein. "Hoje, só se conversa sobre Obama, Clinton e McCain."
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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