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São Paulo, quinta-feira, 05 de junho de 2003

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RECEITA ORTODOXA

Para Henrique Meirelles, sociedade começa a deixar de olhar índices de preços passados e se mirar nos futuros

Inflação vive "momento crucial", diz BC

MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES

O Brasil está vivendo "um momento crucial" para a inflação, segundo o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. "Estamos exatamente no momento da transição, em que a sociedade começa a deixar de olhar a inflação passada e passa a olhar a inflação futura."
Essa mudança de perspectiva pode ser uma primeira indicação de que a política monetária estaria começando a quebrar a chamada "inércia" da inflação. A "inércia" -movimento de preços baseado nos aumentos passados e que realimenta novos reajustes- foi apontada na última reunião do Copom como um dos principais empecilhos para a queda das taxas de juros.
Segundo Meirelles, a quebra dessa inércia está diretamente ligada ao sentimento da sociedade e à confiança no compromisso do Banco Central com o combate à inflação. "Se os formadores de preços acreditam que o Banco Central não terá força suficiente para derrubar a inflação, eles vão se defender fazendo o aumento com base na inflação passada."
"Mas, se eles acreditam que o Banco Central terá força para de fato implantar sua política e fazer a inflação convergir para as metas, apostam na inflação futura."
Na sua avaliação, quanto maior a credibilidade na firmeza das decisões do BC, menor é o custo da política monetária. Pois, quando a sociedade acredita que o BC tem autonomia de ação e vai manter uma política de combate à inflação, aumentam as chances de sucesso, justamente porque a sociedade passa a acreditar que isso vai acontecer. Segundo Meirelles, esse processo de credibilidade do BC está melhorando no país e é medido pelo próprio BC por meio de estatísticas, mas não quis revelar que dados são esses.
"Se o Banco Central tem mais credibilidade, precisa-se de uma política monetária menos rígida para derrubar um mesmo percentual de inflação", argumentou, defendendo a importância da autonomia do BC. "Se tem menos credibilidade, terá que ser mais rígido", acrescentou. É justamente por causa dessa conclusão, segundo ele, que uma das primeiras medidas do primeiro-ministro britânico, Tony Blair, ao assumir o governo, em 1997, foi mandar ao Parlamento o projeto de autonomia do BC.
Para ele, ainda não se sabe qual o efeito que as discussões em torno dos juros podem ter sobre essa credibilidade, mas observou que a decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) do mês passado pode ter tido um efeito positivo. "A sociedade começou a achar que o Banco Central deu uma demonstração de força, apesar do debate", disse. Mas ele insistiu em que a discussão faz "parte da democracia" e que a classe política deve debater. E negou que as pressões sejam uma interferência, pois o BC tem que "encarar com tranquilidade esse debate".
Meirelles contou também que o BC deve anunciar em breve medidas para reduzir os "spreads" bancários -os juros cobrados pelos bancos na ponta, como as taxas do crédito direto, por exemplo. Mas ele não quis dizer quando os "spreads" começam a cair, pois um "BC não trabalha com prazos nessa área". Econômico com as informações, ele disse apenas que o governo deve encaminhar um projeto de lei para o Congresso, passando para o Cade o papel de assegurar a concorrência entre os bancos -conforme antecipou a Folha em abril-, e que estuda medidas para o fortalecimento das cooperativas de crédito e da área do microcrédito.
O presidente do BC se reuniu com um grupo de grandes investidores em um almoço e disse que eles manifestaram confiança no país. Um deles classificou o Brasil como a "estrela dos emergentes", segundo Meirelles, que disse ter sido informado ainda que investidores de mais longo prazo começam a buscar opções de aplicações no país. Seriam aplicações de pelo menos um ano.

Estrela
Administradores de fundos de investimento ouvidos pela Folha confirmam que domina a impressão de que o Brasil é a estrela. Essa percepção resulta especialmente do fato que o volume de bônus do Brasil é muito grande e os títulos se valorizaram de forma acentuada nos últimos meses. Isso dentro de um panorama em que os retornos de aplicações em papéis de primeira linha estão muito baixos, reforçando o apetite para maior risco.
Segundo esse investidores, há duas preocupações atualmente. Uma é em relação à possibilidade de que a alta de fluxos de recursos para os emergentes seja apenas uma "bolha". A outra, específica do Brasil, é com a dificuldades em encontrar o momento certo e a medida certa na busca do equilíbrio da política econômica: nem cortar as taxas de juros a ponto de prejudicar o combate à inflação nem deixá-las tão altas que acabem sufocando a economia.


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