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RECEITA ORTODOXA
Para Henrique Meirelles, sociedade começa a deixar de olhar índices de preços passados e se mirar nos futuros
Inflação vive "momento crucial", diz BC
MARIA LUIZA ABBOTT
DE LONDRES
O Brasil está vivendo "um momento crucial" para a inflação, segundo o presidente do Banco
Central, Henrique Meirelles. "Estamos exatamente no momento
da transição, em que a sociedade
começa a deixar de olhar a inflação passada e passa a olhar a inflação futura."
Essa mudança de perspectiva
pode ser uma primeira indicação
de que a política monetária estaria
começando a quebrar a chamada
"inércia" da inflação. A "inércia"
-movimento de preços baseado
nos aumentos passados e que realimenta novos reajustes- foi
apontada na última reunião do
Copom como um dos principais
empecilhos para a queda das taxas de juros.
Segundo Meirelles, a quebra
dessa inércia está diretamente ligada ao sentimento da sociedade
e à confiança no compromisso do
Banco Central com o combate à
inflação. "Se os formadores de
preços acreditam que o Banco
Central não terá força suficiente
para derrubar a inflação, eles vão
se defender fazendo o aumento
com base na inflação passada."
"Mas, se eles acreditam que o
Banco Central terá força para de
fato implantar sua política e fazer
a inflação convergir para as metas, apostam na inflação futura."
Na sua avaliação, quanto maior
a credibilidade na firmeza das decisões do BC, menor é o custo da
política monetária. Pois, quando
a sociedade acredita que o BC tem
autonomia de ação e vai manter
uma política de combate à inflação, aumentam as chances de sucesso, justamente porque a sociedade passa a acreditar que isso vai
acontecer. Segundo Meirelles, esse processo de credibilidade do
BC está melhorando no país e é
medido pelo próprio BC por meio
de estatísticas, mas não quis revelar que dados são esses.
"Se o Banco Central tem mais
credibilidade, precisa-se de uma
política monetária menos rígida
para derrubar um mesmo percentual de inflação", argumentou,
defendendo a importância da autonomia do BC. "Se tem menos
credibilidade, terá que ser mais rígido", acrescentou. É justamente
por causa dessa conclusão, segundo ele, que uma das primeiras
medidas do primeiro-ministro
britânico, Tony Blair, ao assumir
o governo, em 1997, foi mandar
ao Parlamento o projeto de autonomia do BC.
Para ele, ainda não se sabe qual
o efeito que as discussões em torno dos juros podem ter sobre essa
credibilidade, mas observou que a
decisão do Copom (Comitê de
Política Monetária) do mês passado pode ter tido um efeito positivo. "A sociedade começou a achar
que o Banco Central deu uma demonstração de força, apesar do
debate", disse. Mas ele insistiu em
que a discussão faz "parte da democracia" e que a classe política
deve debater. E negou que as
pressões sejam uma interferência,
pois o BC tem que "encarar com
tranquilidade esse debate".
Meirelles contou também que o
BC deve anunciar em breve medidas para reduzir os "spreads"
bancários -os juros cobrados
pelos bancos na ponta, como as
taxas do crédito direto, por exemplo. Mas ele não quis dizer quando os "spreads" começam a cair,
pois um "BC não trabalha com
prazos nessa área". Econômico
com as informações, ele disse apenas que o governo deve encaminhar um projeto de lei para o
Congresso, passando para o Cade
o papel de assegurar a concorrência entre os bancos -conforme
antecipou a Folha em abril-, e
que estuda medidas para o fortalecimento das cooperativas de
crédito e da área do microcrédito.
O presidente do BC se reuniu
com um grupo de grandes investidores em um almoço e disse que
eles manifestaram confiança no
país. Um deles classificou o Brasil
como a "estrela dos emergentes",
segundo Meirelles, que disse ter
sido informado ainda que investidores de mais longo prazo começam a buscar opções de aplicações no país. Seriam aplicações de
pelo menos um ano.
Estrela
Administradores de fundos de
investimento ouvidos pela Folha
confirmam que domina a impressão de que o Brasil é a estrela. Essa
percepção resulta especialmente
do fato que o volume de bônus do
Brasil é muito grande e os títulos
se valorizaram de forma acentuada nos últimos meses. Isso dentro
de um panorama em que os retornos de aplicações em papéis de
primeira linha estão muito baixos, reforçando o apetite para
maior risco.
Segundo esse investidores, há
duas preocupações atualmente.
Uma é em relação à possibilidade
de que a alta de fluxos de recursos
para os emergentes seja apenas
uma "bolha". A outra, específica
do Brasil, é com a dificuldades em
encontrar o momento certo e a
medida certa na busca do equilíbrio da política econômica: nem
cortar as taxas de juros a ponto de
prejudicar o combate à inflação
nem deixá-las tão altas que acabem sufocando a economia.
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