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Celular com TV vira "hit" na baixa renda
Procura por aparelhos contrabandeados e com sinal analógico surpreende fabricantes, para os quais mobilidade viria com a TV digital
Qualidade da imagem é
inferior à oferecida pelos
celulares com sinal digital,
mas melhor que a das TVs
analógicas de tela grande
Rafael Andrade/Folha Imagem
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O serralheiro Antônio Ratão e o office boy Ronaldo Alves usam celular com TV no Rio
ELVIRA LOBATO
DA SUCURSAL DO RIO
NATÁLIA PAIVA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Apareceram novas siglas no
vocabulário de faxineiros, motoboys, porteiros e auxiliares
de escritório que habitam as
grandes cidades. São os "mpx"
(mp7, mp8, mp9, mp10): telefones celulares contrabandeados
da China, que captam a programação da televisão aberta em
sinal analógico.
Contrabandeados supostamente via Uruguai ou Paraguai
e com preços a partir de R$ 260,
esses aparelhos estão se disseminando, para surpresa dos radiodifusores e das indústrias
eletrônicas, que previram que a
mobilidade da televisão aberta
viria com a TV digital.
Eles se tornaram febre de
consumo entre profissionais de
baixa renda que moram a grandes distâncias do trabalho. ""A
TV ameniza o estresse da viagem", afirmou o faxineiro Roberto Naves, 32. Morador de
Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, ele passa quatro horas por dia em ônibus e trens.
A qualidade da imagem é inferior à oferecida pelos celulares com função de TV digital,
mas melhor do que a dos televisores analógicos de tela grande.
Segundo fonte consultada pela
Folha, 100 mil celulares com
função de TV analógica foram
vendidos, na cidade de São Paulo, nos meses de novembro e
dezembro de 2008.
Na capital paulista e no Rio
de Janeiro, a reportagem constatou a procura por esses produtos nos shoppings populares
de informática e nos camelódromos. Segundo os vendedores, eles já lideram a venda de
celulares, no comércio informal. Como entram no país sem
pagar impostos, há modelos a
partir de R$ 260. As embalagens não identificam o fabricante nem o país de origem. A
marca mais presente é a "Vaic",
imitação da Sony Vaio -linha
de notebooks da Sony.
Tela sensível ao toque, câmera na frente e atrás, internet wireless e espaço para dois chips
são alguns dos atributos dos
aparelhos que são vendidos como "mpx". "Cada um põe o "mp"
que quer", afirmou uma vendedora de uma galeria popular no
centro de São Paulo. A confusão entre tecnologia -mp3 e
mp4 são formatos de compressão de arquivos de áudio e de vídeo, respectivamente- e "evolução tecnológica" dá certo.
Quando o celular Nokia de
R$ 1.200 do técnico judiciário
Mauro Ramirez, 38, deu problemas e teve de ficar dias na
assistência técnica, ele seguiu o
conselho de um amigo e comprou, por 75% menos, um genérico "com mais recursos". Quatro meses depois, já estava à
procura de um novo aparelho,
"mais avançado" -o Nokia, já
consertado, está "encostado".
Na "meca" brasileira do comércio popular de produtos de
informática, é quase impossível
encontrar celulares sem TV
analógica. Em uma das galerias
de Santa Ifigênia, o vendedor
Luis Motoyama, 64, puxou a
antena do celular "Vaic" e mostrou a tela com sinal meio falho
("lá fora é melhor"). Ele disse
vender cerca de 400 aparelhos
do tipo por mês, comprados por
"jovens entre 15 e 30 anos". Ao
menos a cada três meses novos
modelos chegam. "Se a gente
não vende [os antigos] logo, depois ninguém mais quer."
O serralheiro Antônio Ratão,
52, de Vilar dos Teles, zona norte do Rio, foi presenteado com
um desses celulares, com design copiado do iPhone, de R$
330. Ele usa o aparelho, sobretudo, para ver TV nos momentos de folga do trabalho. O mensageiro Ronaldo Marques, 36,
de Paracambi, Baixada Fluminense, pagou R$ 260 por um
menos vistoso. Ele disse que
muitos passageiros dos trens
veem TV durante as viagens.
Opção nacional
A aceitação do produto despertou o interesse de empresas
em comercializar o celular, no
Brasil, legalmente.
A primeira a se aventurar foi
a EUTV, fundada por Yon Moreira, ex-presidente da Telefonica Empresas e ex-diretor da
Brasil Telecom. No ano passado, ele obteve a homologação
da Anatel para um modelo produzido pela chinesa E-Techco,
que está à venda nas lojas e pela
internet por R$ 599.
A diferença de preço para o
produto contrabandeado, de
cerca de 100%, deve-se, segundo ele, aos impostos e à melhor
qualidade do material usado
pelo fabricante na China. A
Anatel também homologou um
telefone com função de TV analógica fabricado pelo grupo estatal chinês ZTE, mas o aparelho ainda não chegou às lojas.
Moreira disse que foi "o primeiro atrasado" a perceber o
potencial do mercado. Afirmou
que, no Brasil, o hábito de ver
TV no celular será criado a partir da população de baixa renda
e que fabricantes do produto
com sinal digital se beneficiarão disso no futuro.
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