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LUÍS NASSIF
Vinculação e progresso
Um dos sofismas mais difundidos nos anos 90 pelos
cabeças de planilha foi a idéia de
que a crise fiscal brasileira é decorrência das vinculações orçamentárias previstas na Constituição de 1988. Nos anos 90, a
preponderância absoluta do financeiro sobre todos os demais
aspectos da vida nacional, em
vez de dar eficácia à gestão,
criou a chamada lassidão fiscal,
com ampliação de despesas, aumento desmedido de receitas,
criação de contribuições e fundos especiais visando reduzir a
participação de Estados e municípios. Se posso gastar mais e arrecadar mais, por que me preocupar em ser eficiente?
Depois que a situação fiscal
complicou, os cabeças de planilha passaram a martelar o conceito de que o que importava era
o superávit fiscal, de que natureza fosse. Para eles, o único aspecto que interessava era o governo
assegurar a capacidade do Estado de continuar pagando juros
exorbitantes.
Recentemente, o economista
José Alexandre Scheinkman
apresentou diversos indicadores
de evolução do país, comparativamente à Coréia do Sul. Até
1980 o país avançou em vários
indicadores. Aí, passou a ficar
para trás de quase todos eles, em
termos absolutos e comparativos. Um dos poucos indicadores
em que o Brasil caminhou para
trás até os anos 80 e passou a
melhorar depois disso foi o da
educação básica. Nos anos 90, os
da saúde também.
Os dados de Scheinkman tomaram como base estudos de
Naércio Aquino de Menezes Filho, da Faculdade de Economia
e Administração da USP, publicado em livro em que foi o coordenador ao lado de Marcos Lisboa.
Qual a razão para essa melhora? O pensamento financista que
preponderou depois da era Marcílio? Não, foi a vinculação orçamentária, aquele "anacronismo" previsto na Constituição de
1988, e que resultou na criação
do Fundef. Com todos os problemas fiscais dos anos 90, com os
contingenciamentos, com os juros mais altos do planeta, foi essa
vinculação que impediu que todos os indicadores relevantes de
desenvolvimento virassem pó
em uma mesa de operações do
mercado.
Imagine se a gestão Pedro Malan tivesse a flexibilidade para se
apossar desses recursos. Tudo teria ido para a vala comum do
aumento da dívida pública sem
contrapartida de investimentos.
Já é hora de parar com esse primarismo de aceitar que todo
gasto que não seja para o pagamento de juros seja, por princípio, ineficiente. Todo gasto que
se destina ao cidadão é por princípio mais eficiente que o que se
destina ao pagamento de juros
para sustentar modelos irracionais.
O que se tem a fazer é aprimorar a aplicação dos recursos vinculados, para conseguir cada vez
mais eficácia na aplicação desses
recursos. Nesse sentido, vale a
pena avaliar o requerimento da
deputada Denise Frossard, de
sugerir ao Ministério do Planejamento o encaminhamento ao
Congresso de projeto de lei complementar para incluir, no Plano
Plurianual da União, Estados e
municípios, a obrigatoriedade
do cumprimento de metas baseadas no Índice de Desenvolvimento Humano, para evitar que
os recursos sejam canalizados
para obras não diretamente relacionadas com a melhoria da
educação.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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