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LUÍS NASSIF
Novos tempos, velhos discursos
O último debate entre candidatos, na TV Globo, tem de longe um vitorioso: a cobertura da mídia. E tem de longe um perdedor: idéias-força criativas.
Em geral há uma mistificação nesses debates, dos candidatos se comportando como vestibulandos, com excesso de citação de números e siglas e carência
de conceitos.
O que se espera de um presidente da República não é a decoreba de números, siglas e datas, mas a visão de futuro, a
identificação e publicidade de
novos valores, a definição de
prioridades, a concatenação de
ações, a explicitação da estratégia política.
Apesar de toda a visibilidade
dada aos candidatos durante a
campanha, não se conseguiu
sair das soluções convencionais.
É como se a crise econômica tivesse embotado toda capacidade de inovação do país.
É evidente que há um conjunto de soluções padrão para problemas antigos. Ocorre que os
anos 90 consolidaram alguns
valores fundamentais para o
país, e nenhum deles se transformou em bandeira dos candidatos -como ocorreu com a crítica do modelo econômico fechado, na campanha de Collor, ou
a defesa da estabilização inflacionária na primeira campanha
de Fernando Henrique Cardoso.
Um desses novos paradigmas
é a questão da gestão pela qualidade e dos indicadores de acompanhamento. Esse é o grande
desafio nacional, a ferramenta
que, associada ao governo eletrônico e ao planejamento estratégico, permitirá a implementação das idéias, a melhoria
das contas públicas sem aumento da arrecadação, a boa governança, a transparência de dados.
Com uma idéia-força dessas,
Juscelino Kubitschek criou a
mística do "Plano de Metas",
que influenciou o universo de
empresas brasileiras, introjetando princípios de gestão que foram fundamentais para a modernização dos anos posteriores.
Agora, nem tchum!
Durante a campanha, Lula
chegou a esboçar o slogan do
planejamento estratégico e dos
indicadores, e Serra, o dos indicadores e do governo eletrônico.
Mas não ousaram avançar. Preferiram não correr o risco do
discurso inovador.
Um segundo paradigma importantíssimo é a questão da articulação das iniciativas regionais e setoriais. Embora os discursos políticos possam ser diferentes na superfície, no mais
profundo todos os candidatos
partem da mesma visão de Estado provedor, dissonante com os
tempos modernos e com a crise
fiscal.
O desenvolvimento e a geração de empregos no país cada
vez menos dependerão de investimentos públicos (como pretende Lula) ou da mera criação de
ambiente macroeconômico favorável (como pensa Serra). O
papel do Estado será articular
de maneira horizontal iniciativas existentes, tanto no plano
econômico e científico-tecnológico quanto no social, sem a visão hierarquizada e burocratizada convencional.
Tome-se o caso da bambuzeria Capricho, de Cajueiro (AL),
região com canaviais decadentes, bambuzais inúteis e trabalhadores sem emprego. Bastou
colocar na parada um designer,
que bolou um tipo de cabide
moderno, e uma rede de lojas
que decidiu adquirir a produção para se gerarem instantaneamente 80 novos empregos,
de pessoas recebendo um salário
mínimo para a região, o equivalente a cerca de três salários mínimos nas grandes cidades.
O investimento do Sebrae no
projeto foi de meros R$ 35 mil,
menos de R$ 500 para criar empregos permanentes e em expansão. No seu rastro foram
criados os projetos Pindorama,
em Cururipe, e União dos Palmares, com mais 180 pessoas recebendo o mínimo para montar
legos de bambus.
Em Pernambuco, em Santa
Cruz do Capibaribe não existe
um desempregado, entre os 50
mil habitantes. Lá, em um eixo
que passa por Doritama e Caruaru, foram criados centros
têxteis informais, geração espontânea, com cada família dispondo de uma máquina de costura em casa. Já existem 20 mil
empresas e 8.000 pontos-de-venda. Montado o complexo, o Senai entrou com uma escola de designer; o Sebrae, com um programa de desenvolvimento.
Esses são os novos paradigmas nacionais, ainda à espera de um candidato que ouse inovar o velho discurso.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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