São Paulo, segunda-feira, 05 de outubro de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Cúpula retomará acordo UE-Mercosul

Encontro amanhã na Suécia dará impulso político necessário para retomada das negociações para acordo de livre comércio

Entendimento ganha força com o fracasso da Rodada Doha e um novo mandato de Durão Barroso à frente do "braço executivo" da UE

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A ESTOCOLMO

A cúpula União Europeia-Brasil, a realizar-se amanhã em Estocolmo, dará o impulso político necessário para a retomada das negociações entre o conglomerado europeu e o Mercosul, com vistas ao estabelecimento do que seria a maior zona de livre comércio do planeta, envolvendo os dois blocos.
Essa é, pelo menos, a expectativa tanto da diplomacia brasileira como do presidente da Comissão Europeia, o português José Manuel Durão Barroso. O esboço do comunicado final elaborado pelos europeus diz, literalmente:
"Os dois lados concordam em intensificar o trabalho rumo a uma possível retomada das negociações com vistas a concluir um ambicioso e equilibrado acordo de associação União Europeia/Mercosul".
O impulso político, se tudo der certo, permitiria relançar as negociações numa cúpula mais ampla, entre União Europeia e América Latina-Caribe, a realizar-se no primeiro semestre do ano que vem, pondo fim a um estancamento que já dura cinco anos.
Para que seja possível reiniciar a discussão, diplomatas de ambas as partes trabalham com a ideia de que os números das respectivas concessões comerciais -que é o ponto em que a negociação bate no muro- deveriam ser deixados em segundo plano para focar o debate na moldura mais ampla de acordo estratégico que não é apenas econômico-comercial mas também político.
Há pelo menos três razões para um relativo otimismo quanto à hipótese de que comecem a ser superados os obstáculos que paralisaram as negociações. A saber:
1 - Durão Barroso acaba de ser reconduzido à presidência da Comissão Europeia, o "braço" executivo do conglomerado de 27 países. Está, portanto, anabolizado, e é um entusiasta do acordo.
Foi ele quem deu o maior impulso para a parceria estratégica entre o Brasil e a UE, lançada faz dois anos e meio.
2 - A Espanha assume, no dia 1º de janeiro, a presidência de turno da União Europeia, com sua tradicional vocação para tentar servir de ponte entre europeus e latino-americanos. É natural que pretenda transformar a cúpula UE/América Latina-Caribe, da qual será a sede, no momento de relançamento das negociações com o Mercosul. Ainda mais que é o ano em que se comemora o bicentenário da independência de países latino-americanos.
3 - O ponto principal é, no entanto, econômico-comercial: a negociação entalou sempre na resistência europeia a reduzir seus subsídios agrícolas, a maior queixa do Mercosul. Havia, de parte a parte, a sensação de que a questão dos subsídios só poderia ser resolvida no âmbito multilateral, ou seja, na Rodada Doha de liberalização comercial.

Revés de Doha
Acontece que Doha também caiu no pântano do impasse, o que leva a diplomacia brasileira, por exemplo, a desejar de novo um acordo regional com os europeus.
A cúpula de Estocolmo coincide de todo modo com uma nova tentativa, no âmbito ministerial, de ressuscitar Doha. Por isso, o rascunho de comunicado final condiciona o esforço para relançar as negociações UE/Mercosul ao andamento da rodada multilateral, sobre o qual, no entanto, há pouco otimismo até agora em Genebra.
O contraponto para o cauteloso otimismo é o fato de que o Mercosul está em estado semi-letárgico há algum tempo. Não consegue nem mesmo acertar a solução de um ponto no qual os europeus insistem: a eliminação da dupla cobrança de tarifa de importação.
Hoje, um produto que entre no Brasil, por exemplo, e seja depois reexportado, paga duas vezes a tarifa.
Já entre os europeus e o Brasil houve, durante o ano transcorrido desde a cúpula anterior em Brasília, alguns pequenos avanços em diferentes áreas, inclusive na comercial.
Exemplo: como compensação pelo ingresso de Bulgária e Romênia na UE, o Brasil conseguiu um acordo que, na prática, lhe dá direito a uma cota adicional de açúcar para o mercado europeu da ordem de meio milhão de toneladas.
A cúpula de amanhã também lançará uma iniciativa conjunta para produção de etanol na África. O Brasil entra com sua tecnologia para ajudar a produzir o combustível alternativo na África, e a Europa fornece o mercado para ele.
Além de ser um projeto pelo qual o presidente Lula tem o maior carinho, trata-se de um passo adicional para a pretensão brasileira de que o etanol ganhe o tratamento de commodity negociável internacionalmente.
Como em toda reunião entre chefes de governo, a cúpula de Estocolmo é uma obra em aberto, na qual cada parte pode introduzir o tema que quiser, mesmo que não esteja no comunicado já negociado pelos diplomatas.


Texto Anterior: Oferta: Chinesa quer 30% de mina no Brasil, afirma jornal
Próximo Texto: Folhainvest
Cresce procura por título de longo prazo

Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.