São Paulo, Sexta-feira, 05 de Novembro de 1999
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EMPRESAS

Sexto homem mais rico do mundo investe no Brasil e afirma que apoio governamental é importante

Michael Dell defende incentivo fiscal

RODOLFO LUCENA
Editor de Informática

Os incentivos fiscais oferecidos pelo governo do Rio Grande do Sul foram um dos fatores que atraíram a Dell, maior empresa do mundo de venda direta de computadores, para investir no Brasil. Foi o que disse ontem o empresário Michael Dell, presidente da empresa, em entrevista exclusiva à Folha.
Dell, 34, casado, pai de quatro filhos, é o sexto homem mais rico do mundo, segundo a revista "Forbes", com uma fortuna pessoal de US$ 16,5 bilhões. Na quarta-feira, ele participou da inauguração da fábrica da Dell em Eldorado do Sul (na Grande Porto Alegre). Leia a seguir os principais trechos da entrevista concedida ontem em São Paulo.
 

Folha - O fato de a Dell chegar ao mercado brasileiro depois de seus principais concorrentes pode prejudicar seus negócios?
Michael Dell -
O mercado de PCs ainda está em seus primeiros estágios de desenvolvimento aqui. O mercado é razoavelmente grande, está crescendo rapidamente e vai crescer nos próximos 15 a 20 anos. Temos tido um crescimento gradual. Tentamos chegar na hora certa.

Folha - Qual a importância dos incentivos governamentais para a sua decisão?
Dell -
Claro, é um fator em nosso processo de decisão. Queremos ter um ambiente que nos apóie em termos de negócios, infra-estrutura, pessoal. Encontramos um ambiente muito forte em Porto Alegre para apoiar nossas necessidades. Foi tudo muito bem.

Folha - O que os incentivos representam em relação ao total do investimento previsto?
Dell
- Não divulgamos números (o Estado do Rio Grande do Sul deve apoiar a empresa com R$ 20 milhões, originados de um fundo de incentivo ao desenvolvimento tecnológico).

Folha - E quais são suas expectativas em relação ao desempenho da Dell no Brasil?
Dell -
Nós somos a número 5 do mercado latino-americano hoje e acho que temos a oportunidade de ganhar uma fatia significativa do mercado.

Folha - O sistema de venda direta de PCs não é ainda muito usado no Brasil. A Dell pretende modificar sua estratégia para atrair os usuários domésticos?
Dell -
Se você analisar o mercado norte-americano, nós somos o número 1 no mercado corporativo, mas no mercado doméstico somos o número 4. Éramos o sétimo no ano passado. Não pensamos que seja necessário ter um modelo diferente para atrair o consumidor doméstico.

Folha - Os seus preços também mostram que a empresa não tenta atingir, pelo menos já, o usuário doméstico.
Dell -
Se você examinar uma faixa de preço específico, a Dell vai estar oferecendo mais performance e mais recursos pelo mesmo preço. Nós não pretendemos ter o preço mais baixo, pretendemos oferecer o maior valor.

Folha - Nesse momento, duas grandes empresas norte-americanas, MCI e AES, estão em contencioso com as autoridades no Brasil. Esta seria uma má hora para as empresas americanas?
Dell -
Não parece ser uma época ruim para nós. Tive a oportunidade de conversar com o presidente Fernando Henrique Cardoso há uns dois anos e meio, na Suíça, e nós encontramos forte apoio do governo para empresas como a nossa. Particularmente, em Porto Alegre, há um entendimento na comunidade de que isso é um passo positivo em termos de trabalho, oportunidades. Quando as pessoas da comunidade querem, os políticos geralmente apóiam.

Folha - O fato de o Rio Grande do Sul ser hoje governado pela oposição não interfere?
Dell -
Eu me encontrei com o governador do Estado (Olívio Dutra, do PT), ontem (anteontem), e tudo está indo muito bem. Temos tido um bom apoio, apesar dessa mudança no governo local (o acordo com a Dell foi negociado durante o governo de Antonio Britto, do PMDB).

Folha - Outro fator importante para sua instalação no Brasil foi o interesse em atuar no Mercosul. Há dois anos, parecia ser realmente uma opção interessante, mas hoje está praticamente inviabilizado...
Dell -
Nós estamos em um setor que muda muito rapidamente. Portanto, mudanças não são algo que nos surpreenda, nós trabalhamos com mudanças todo o tempo. O Brasil é claramente o principal mercado na região, e nossa intenção é usar o país como base para exportar para os outros mercados. Sempre que há movimentos atrasados, no sentido de aumentar as dificuldades de comércio entre os países, nós não gostamos disso, nós achamos que é ruim para nosso negócio. Não pretendo passar uma mensagem política, mas o que acredito é que o livre comércio é uma boa coisa.

Folha - Passando para a área tecnológica, qual a sua visão da Internet?
Dell -
O que temos hoje é cerca de 5% do que teremos em cinco anos. A digitalização da informação e a colaboração entre as empresas possibilitada pela Internet é sensacional para os negócios.

Folha - Quais são os fatores mais importantes para iniciar uma empresa na Internet?
Dell -
Alguém poderia dizer: "Basta colocar o .com e ter ações em Bolsa", mas acho que é preciso mais. Ter algo na Internet não significa necessariamente que você tem um bom negócio. Você pode ter uma empresa que avance, melhore, se desenvolva com o uso da Internet. O objetivo não deve ser apenas duplicar outras empresas, mas, sim, tentar fazer algo novo.

Folha - O senhor, como Bill Gates, não terminou a faculdade. Seria esse um requisito para ter sucesso?
Dell
- Não (risos). Larry Ellison (presidente da Oracle) não completou a faculdade, mas Charles Manson (líder do grupo que matou a atriz Sharon Tate) também não. Esse não necessariamente é o caminho do sucesso... Mas, veja bem, quando alguém inicia um negócio, realmente não importa qual é sua formação, o que importa é o que ele pode fazer, o que ele pode conseguir. Nosso sistema é uma meritocracia, em que as pessoas são avaliadas em função de suas habilidades, não da idade ou da escola que cursaram. Tudo depende da capacidade de cada um.


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