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LUÍS NASSIF
Revelações de FHC
Durante uma hora e meia
Fernando Henrique Cardoso falou ao "Programa Econômico" -que estreou ontem na
TV Cultura, às 21h40. Ao final,
considerou a entrevista como
"defesa de tese". Ontem, foram
levados ao ar pequenos trechos
dela, em que o presidente aborda três temas relevantes: o início
do Real; os erros do câmbio e os
erros da política energética.
Em relação ao Real, o plano
começou a ser pensado no final
de 1993, pouco depois de FHC assumir o Ministério da Fazenda
do governo Itamar. A primeira
precondição para o plano foi a
renegociação da dívida externa,
em moratória desde o governo
José Sarney. Pedro Malan empenhou-se na tarefa, primeiro como negociador, depois como
presidente do BC.
Havia muita resistência da burocracia do FMI em endossar o
plano. FHC conseguiu o endosso
pessoal de Michel Camdessus,
então diretor-gerente do FMI,
por meio de uma carta, em francês, que foi encaminhada aos
bancos credores.
Na época, pensou-se em lançar
Antônio Britto à Presidência,
mantendo FHC na Fazenda.
Pensou-se até em Lula, por meio
de tratativas de Tasso Jereissati.
Acabaram não vingando, e FHC
foi lançado.
Em dezembro de 1994, ainda
no governo Itamar, tentou-se
corrigir o câmbio, diz FHC. O futuro ministro do Planejamento,
José Serra, e o economista Pérsio
Arida, indicado para a presidência do Banco Central, prepararam a transição para o novo modelo. Mas a crise do México impediu a mudança.
Depois, se tentou em março.
Não havia discordância sobre a
necessidade de mudar o câmbio,
mas sobre a forma. Serra e Arida
defendiam uma mudança forte
e, depois, a fixação do câmbio
em novo patamar. Outro grupo
defendia a implantação do sistema de bandas, mais lento e cauteloso. Houve erro de implementação, que levou à fuga de US$ 8
bilhões das reservas. Em seguida,
houve a saída de Pérsio Arida do
governo, e, em meados de 1995,
apareceu o fantasma de uma
crise bancária, diz FHC. Constatou-se que a mudança de câmbio precipitaria a crise bancária.
Por isso, manteve-se a política
cambial anterior até que o sistema fosse saneado, o que ocorreu
com o Proer.
Em 1996 e meados de 1997, o
câmbio poderia ter sido alterado. Foi o que o presidente denomina de período de trégua. Ele
chegou a fazer várias reuniões
com economistas no Palácio do
Alvorada, ouvir exportadores,
opiniões das mais variadas. Havia os que não recomendavam
mudar o câmbio, com receio de
volta da inflação e de fuga de recursos, confiando na melhoria
da produtividade interna. Um
grande exportador sustentou
que um ajuste de 5% seria suficiente. Serra e o ministro da Administração, Luiz Carlos Bresser
Pereira, eram os mais radicais.
Bresser dizia ser imprescindível
um ajuste de 30%. Fernando
Henrique ficou em meio a esse tiroteio de opiniões e decidiu
apostar na melhoria da produtividade interna.
Em meados de 1997, quando se
constatou que a aposta tinha sido errada, nada mais havia a fazer, segundo Fernando Henrique. A essa altura, ele recebera
um "paper" do economista José
Roberto Mendonça de Barros,
antecipando a crise da Ásia. Depois, veio a crise da Rússia. Pior
que isso, segundo ele, foi o
"grampo" do BNDES, que acabou tirando do governo praticamente toda a equipe que operaria a mudança do câmbio.
Passadas as eleições, FHC disse
que tomou pessoalmente a decisão de mudar a política cambial,
substituindo Gustavo Franco
por Chico Lopes na presidência
do BC. Admite que se enredou
na mudança, defende a honorabilidade de Lopes e, indagado
acerca de sua inexperiência operacional, afirma que ele foi indicado por todos os defensores da
mudança cambial.
Em fevereiro de 1999, com o
país explodindo, apenas o ministro da Fazenda, Pedro Malan,
ainda insistia em que não havia
necessidade de mudar o câmbio.
Mas FHC deixa a entender que
muitos economistas, que depois
se apresentaram como críticos
acerbos da política cambial, na
época defendiam a sua manutenção.
Não dá nomes. Mas diz que
apenas Serra e Bresser mantiveram durante todo o período a
postura crítica em relação à política cambial.
E-mail - LNassif@uol.com.br
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