São Paulo, segunda-feira, 05 de dezembro de 2005

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ENTREVISTA

Economista afirma que a alta dos preços seria "o pior dos mundos" e que não se surpreendeu com queda do PIB

Para Belluzzo, queda rápida de juros trará pressão inflacionária

CLÁUDIA TREVISAN
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil cometeu a "imprudência" de permitir a excessiva valorização do real sob o regime de câmbio flutuante e enfrentará o risco de pressões inflacionárias quando (e se) o Banco Central acelerar o processo de redução dos juros, afirma o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, professor titular da Unicamp.
Vencedor do "Juca Pato - Intelectual do Ano de 2004", Belluzzo considera que a alta dos preços seria "o pior dos mundos". Mas ressalva que a probabilidade que esse cenário se concretize não é "terrível" em razão da grande quantidade de dinheiro em circulação no mundo, que amenizaria a pressão pela desvalorização do real decorrente do corte de juros.
O economista disse que não ficou surpreso com o resultado do PIB do terceiro trimestre, que atribui aos juros e superávit primário. A seguir, a entrevista:

Folha - Como o sr. recebeu o resultado do PIB?
Luiz Gonzaga Belluzzo -
Não fiquei nem um pouco surpreso. Os indicadores mostravam que a economia estava desacelerando.

Folha - Quais foram as principais razões dessa queda?
Belluzzo -
O crédito consignado deu impulso à demanda de bens duráveis nos trimestres anteriores, mas foi curto em razão dos juros muito altos. Outro elemento dinâmico, que são exportações líquidas, também não tiveram o mesmo ímpeto.
O elemento que talvez tenha contribuído muito para a queda, o elemento dinâmico para a economia, é a indústria e suas ramificações. No desempenho da indústria, o investimento é o elemento que compensaria esses dois outros fatores de expansão, que são exportações líquidas e o consumo, mas ele tem se comportado de maneira bem modesta.
Mas o fator fundamental é realmente a combinação juros e superávit primário, que não foram exatamente expansionistas e tiraram fôlego do crescimento.

Folha - O governo errou na mão?
Belluzzo -
Faz tempo que isso está acontecendo, mas os efeitos demoram um pouco para aparecer. Estava todo mundo dizendo "olha, não tem importância o câmbio, a taxa de juros, o superávit", o que obviamente era uma temeridade. Não há dúvida de que este ano a economia vai ter crescimento bem mais modesto que o do ano passado. Os juros começaram a subir em setembro de 2004, mas o efeito não é imediato.

Folha - Dá para recuperar no quarto trimestre?
Belluzzo -
O quarto trimestre vai ser morno, talvez seja positivo, mas não vai dar para dar um crescimento de 3,5%. Não vai nem chegar a 3%. Vai dar 2,7%, 2,8%.

Folha - E o próximo ano?
Belluzzo -
O próximo ano é outra história, porque espero que, diante desse resultado, o Banco Central acelere a queda dos juros. Mas não é algo isento de risco. Se a queda for muito rápida e houver um movimento um pouco acentuado de desvalorização cambial, isso pode ter efeito sobre a inflação, e aí seria o pior dos mundos.
No Brasil, tem essa coisa do câmbio flutuante, que é uma história mal contada. Se você olha pesquisas do FMI, a maior parte dos países está em regimes de câmbio intermediários, porque não dá para ter câmbio flutuante em um mundo onde há movimentos de capital e arbitragem financeira. O Brasil fez uma coisa de uma imprudência e um risco enorme, que não precisava correr [permitir a valorização do real].
Não creio que com a grande liquidez internacional o risco seja terrível, mas pode acontecer alguma coisa, com efeito na inflação.

Folha - Quando o sr. fala queda mais agressiva de juros, o sr. está falando de quanto?
Belluzzo -
Acho que é ficar em uma taxa real bem menor que os 13% de hoje. Tem gente que está dizendo, não sei com que informação, que o Banco Central considera que o máximo que pode chegar é 10% real, porque a partir daí há o risco de inflação.
Essa é uma visão antiga, justificada até em relação à inflação no caso do passado brasileiro, mas agora a tendência mundial não é essa. Há outros instrumentos para ajudar a combater a inflação.


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