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OPINIÃO ECONÔMICA
A síntese da justiça social
RUY MARTINS ALTENFELDER
SILVA
O conceito de dialética, originalmente caracterizado como
"a arte do diálogo", foi apropriado, ao longo da história, por
diferentes doutrinas filosóficas,
assumindo significados distintos. Para Platão, dialética era sinônimo de filosofia. Para Aristóteles, a lógica do provável. Para
Immanuel Kant, a lógica da aparência.
Friedrich Hegel apresenta a
dialética como um movimento
racional, que permite ultrapassar uma contradição. Ou seja,
uma tese inicial contradiz-se e é
ultrapassada pela antítese, que,
finalmente, é superada pela síntese.
Karl Marx e Friedrich Engels
encampam o conceito hegeliano, o reformam com um novo
conteúdo e formulam a dialética
materialista, que analisa a história à luz dos processos econômicos e sociais, dividindo-a em
quatro momentos: antiguidade,
feudalismo, capitalismo e socialismo. Este último seria a síntese
definitiva da justiça social.
Em que pese o fato de a própria
história ter se encarregado de demonstrar que o socialismo fracassou como modelo de isonomia e justiça social, a teoria de
Marx e Engels deixa um importante legado, ao demonstrar que
não se deve desprezar a realidade
para entender com clareza os cenários contemporâneos e diagnosticar com eficiência as ações
necessárias à solução dos problemas.
E um dos problemas persistentes no mundo globalizado é a
questão da justiça social, que
continua à espera de solução.
Com a prevalência do capitalismo, o capital privado e as empresas tornam-se atores vitais na
promoção da justiça social. A começar pela redistribuição do capital, mediante o pagamento de
salários.
Entretanto, a distribuição do
capital na figura dos salários não
é o único vetor da justiça social,
que deve ser entendida, na prática, como a capacidade de uma
nação de democratizar os indicadores que constituem o Índice
de Desenvolvimento Humano
(IDH), reconhecido pelos organismos internacionais. São eles:
expectativa de vida, grau de escolaridade e renda "per capita".
A rigor, a massa salarial atende
diretamente ao item renda "per
capita", embora também se
possa aludir a sua influência nos
demais. Acontece que o PIB planetário e sua distribuição pouco
equilibrada não permitem -pelo menos até agora- que o salário seja o único instrumento da
justiça social.
Poderíamos imaginar um
mundo perfeito, em que o sistema capitalista suprisse todos
com salários suficientes para garantir à totalidade das famílias
acesso a condições adequadas
nas seguintes necessidades: moradia salubre, saúde e alimentação (esses três indicadores refletem o item "expectativa de vida" do IDH) e grau de escolaridade.
A realidade, porém, é outra.
Historicamente, coube ao Estado suprir a demanda social não
coberta pela massa dos salários.
Ficou também sob sua responsabilidade o investimento em infra-estrutura, como saneamento
básico e ambiental, por exemplo, fator igualmente importante
para o estabelecimento de níveis
adequados de vida (estudo do
Programa das Nações Unidas
para o Desenvolvimento mostra:
cada investimento que amplie
em 1% o acesso da população de
baixa renda aos serviços de saneamento básico corresponde a
uma redução de 6% da mortalidade infantil).
Acontece que o Estado, mesmo
nas economias mais desenvolvidas, jamais conseguiu atender
sozinho à demanda social e de
infra-estrutura. O quadro foi se
agravando paulatinamente,
principalmente a partir dos anos
60.
Os déficit públicos de numerosos países, paralelamente ao aumento da demanda social, diminuíram a capacidade de investimento estatal (no caso específico
da infra-estrutura, surge no país
um modelo que possibilita a parceria entre Estado e iniciativa
privada. Cabe ao primeiro estabelecer as normas e fiscalizar; à
segunda, investir e operar os sistemas).
Ao mesmo tempo, a democracia também foi se consolidando
como o sistema político prevalente, com a queda sistemática
dos regimes autoritários na
América Latina, Europa e Ásia.
A somatória da democracia
com a demanda social não coberta pelo Estado abre amplo espaço para que a sociedade civil
organizada possa tornar-se
agente significativo das ações
voltadas à melhoria da qualidade
de vida, ao resgate dos excluídos
e à democratização das oportunidades.
No Brasil, que detém o nono
PIB do mundo, mas ocupa o 63º
lugar no ranking do IDH, esse
engajamento é muito importante, podendo configurar-se como
a síntese da justiça social.
Ruy Martins Altenfelder Silva, 58, empresário, é presidente da Aberje (Associação Brasileira de Comunicação Empresarial) e diretor-geral do Instituto Roberto Simonsen da
Fiesp/Ciesp (Federação e Centro das Indústrias do Estado de São Paulo).
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