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COMÉRCIO EXTERIOR
Propostas não avançam e representantes vão para sala separada para discutir temas mais sensíveis
Negociador da Alca tenta barrar fracasso
CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A PUEBLA
O fantasma do fracasso que começou ontem a assombrar a reunião do CNC (Comitê de Negociações Comerciais), a mais alta
instância técnica da Área de Livre
Comércio das Américas, fez com
que à tarde os principais negociadores decidissem "esconder-se"
para tentar chegar a um acordo
até o meio-dia de hoje (16h em
Brasília), prazo original para encerrar a reunião.
"Esconder-se" significa sair da
secretaria administrativa da Alca,
instalada nos fundos do Centro de
Convenções da cidade mexicana
de Puebla, na qual se concentram
os demais delegados.
Participarão desse esforço final
Brasil e Argentina, pelo Mercosul,
pelo menos Estados Unidos, México e Canadá, pelo G14, e um dos
países caribenhos.
O co-presidente pelo Brasil, embaixador Adhemar Bahadian, garante que há "determinação" de
chegar a um acordo. Mas "a hipótese de fracasso está na mente de
todo mundo, embora ninguém a
queira", como admite o chefe da
delegação brasileira, o embaixador Luiz Filipe de Macedo Soares.
Bahadian já cancelou sua reserva no vôo de volta ao Brasil, marcado para hoje, por temer que a
negociação "entre pela madrugada" (de hoje para amanhã).
A razão para os temores é simples: não houve até as 17h de ontem (21h em Brasília) o mais tênue avanço nas negociações. A rigor, os nós idênticos.
Jantar
O único avanço foi um jantar,
anteontem, entre delegados dos
principais atores (três do Mercosul, cinco do G14, o grupo de países liderado pelos Estados Unidos, e um representante do Caricom, países do Caribe).
"As partes começaram a ouvir
umas às outras, quando, até então, apenas reiteravam suas posições", ouviu a Folha de um delegado de país-chave no G14.
Nesse jantar, o embaixador Bahadian desenhou o seguinte teorema: os vice-ministros (que são
os que compõem o CNC) tinham
recebido um claro mandato da
conferência que seus superiores
realizaram em novembro em
Miami, nos Estados Unidos.
Para cumprir o mandato, "seria
preciso um esforço de negociação, porque as pessoas estavam
todas trancadas em suas posições", disse também Bahadian.
Terminou com a óbvia constatação de que "não há hipótese de
fazer um acordo sobre o conjunto
comum de direitos e obrigações
definido em Miami sem um esforço concentrado no problema
maior, que é agricultura".
Dito e feito: na manhã de ontem, o CNC debruçou-se sobre o
nó agrícola, mas com a cautela de
fazê-lo pelos pontos supostamente mais fáceis de produzir um
acordo entre o G14 e o Mercosul,
que são os dois blocos antagônicos, especialmente nesse tema.
Exemplo: os documentos dos
dois blocos falam em "eliminação" dos subsídios às exportações
agrícolas. Tudo resolvido, então,
ao menos nessa área? Não: o G14
insiste em que a eliminação dos
subsídios por parte dos países
americanos fique condicionada a
uma cláusula segundo a qual serão tomadas medidas para contrabalançar os efeitos nocivos de
exportações agrícolas subsidiadas
de países não-membros do bloco
americano.
Fácil de entender: os EUA se recusam a reduzir seus subsídios
enquanto a Europa puder continuar a adotá-los.
Durante toda a manhã de ontem, os delegados nem sequer entraram nos outros contenciosos
da área agrícola, a saber:
1) a proposta de uma salvaguarda especial para a agricultura, em
caso de redução súbita de preços.
O Brasil não aceita salvaguarda
específica.
2) Os prazos para eliminação de
tarifas (já, cinco anos, dez anos e
mais de dez anos). "Mais de dez
anos não significa abertura", reclama Bahadian, embora o Mercosul esteja propondo esse esquema para bens não-agrícolas.
3) O nó fundamental que é a
proposta do G14 segundo a qual,
tanto em agricultura como em
bens não-agrícolas, haveria a eliminação de barreiras para "substancialmente todo o comércio",
mas não para todo ele, como propõe o Mercosul.
Neste último ponto, a dificuldade não vem apenas do G14. "Há
vários países que não podem aceitar uma liberalização total, como
os do Caribe e os andinos. Não é
só uma questão com os Estados
Unidos", diz Osvaldo Rosales,
chefe da delegação do Chile, um
dos países do G14.
Rosales deixa claro o que outros
delegados do G14 preferem dizer
sem liberar o uso de seus nomes: a
moeda de troca para que o Mercosul obtenha a eliminação da palavra "substancialmente" seria
melhorar a oferta em serviços,
compras governamentais e investimentos.
Em todas essas áreas, o Mercosul prefere que concessões suculentas sejam feitas no segundo trilho da "Alca light" -proposta
defendida pelo Brasil-, que são
as negociações plurilaterais, não
obrigatórias.
"É muito difícil para o Mercosul
aceitar esse cruzamento de concessões", diz o embaixador Macedo Soares.
Retruca o chileno Rosales: "Exigir a eliminação de tarifas para todo o comércio é um exercício
pouco realista".
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