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EUA não estão em recessão, diz analista
Modelo matemático de pesquisadora da Universidade da Califórnia indica apenas crescimento mais lento dos EUA
"Antes da recessão, há baixo crescimento, porém nem sempre uma fase de avanço mais lento do PIB vira uma recessão", destaca Chauvet
DENYSE GODOY
DA REPORTAGEM LOCAL
Recessão ou não, eis a questão. Em torno dela, cresce o debate entre economistas, empresários, estrategistas do mercado financeiro, políticos. O
grupo dos que acreditam que a
economia dos EUA já está em
um período de retração ou caminha aceleradamente para ele
é o que fala cada vez mais alto,
brandindo números como a sofrível elevação de 0,6% do PIB
americano no último trimestre
de 2007 ou o assustador índice
de serviços que saiu ontem e
derrubou as Bolsas.
Mas, observando os indicadores econômicos, a pesquisadora Marcelle Chauvet faz um
diagnóstico mais sereno. "Pode-se dizer que os EUA experimentam um crescimento mais
lento, porém não está configurada uma recessão." O seu cálculo refere-se a dezembro, já
que ela ainda não tem em mãos
os números relativos a janeiro
que usa para a sua análise.
Marcelle é a autora do mais
conhecido modelo matemático
que detecta em tempo real as
probabilidades de recessão na
economia americana. Professora da Universidade da Califórnia em Riverside, ela graduou-se em economia em 1989
pela Universidade de Brasília,
cidade onde nasceu.
Foram as conseqüências econômicas e sociais das recessões
no Brasil que a inspiraram a estudar ciclos econômicos. "Senti
e vivenciei o seu substancial
efeito negativo sobre a confiança das pessoas com relação ao
futuro do país e às suas próprias vidas."
Algumas definições colocam
os períodos de recessão como a
sucessão de dois trimestres de
queda do PIB. Nos EUA, as retrações são oficialmente apontadas pelo Escritório Nacional
de Pesquisas Econômicas
(Nber, da sigla em inglês). Um
comitê de sete economistas se
reúne e delibera a respeito dos
números. Suas decisões podem
demorar de 6 a 18 meses, porque o Nber somente trabalha
com dados finais -muitos indicadores são revisados e atualizados posteriormente- para
não dar alarme falso. Por isso,
freqüentemente, as recessões
são nomeadas após o fim, como
da última vez, em 2001.
O modelo desenvolvido pela
pesquisadora Chauvet foi parte
da sua tese de doutorado pela
Universidade da Pensilvânia,
em 1998, e identificou corretamente todas as recessões americanas a partir da Segunda
Guerra Mundial.
Leia a seguir trechos da entrevista que a pesquisadora
concedeu à Folha, por e-mail e
por telefone.
FOLHA - O conceito de recessão é
bastante complexo. Quais indicadores econômicos o seu modelo considera para poder afirmar se uma economia está em recessão ou não?
MARCELLE CHAUVET - O Comitê de
Ciclos Econômicos do Nber
utiliza as séries mensais de vendas de manufaturados, renda
pessoal, produção industrial e
emprego, além do PIB. No modelo que desenvolvi, emprego
essas mesmas variáveis. O modelo basicamente formaliza o
processo de datação dos ciclos
econômicos, fornecendo probabilidades de recessão mês a
mês. A datação resultante do
modelo coincide com a datação
do Nber. Porém, diferentemente do Nber, o modelo produz
uma análise da situação econômica tão logo os dados se tornam disponíveis, com uma defasagem de um a dois meses somente.
FOLHA - A senhora diria que os EUA
estão entrando em uma recessão
neste momento ou no curto prazo?
CHAUVET - As probabilidades de
recessão nos últimos meses foram de 6,6% em setembro,
11,02% em outubro, 11,53% em
novembro e 13,01% em dezembro [considerando dados disponíveis até ontem]. Em geral,
uma recessão ocorre quando a
probabilidade passa dos 50%
por dois meses consecutivos.
O modelo indica que o crescimento econômico americano
não está tão forte quanto nos
anos anteriores, mas as probabilidades de recessão ainda são
baixas. A questão que se impõe
então é: esse crescimento lento
vai se desenvolver em uma recessão? Nos últimos 57 anos,
houve nove recessões e 13 fases
de crescimento lento. Toda recessão foi precedida de uma fase de crescimento lento, porém
nem todas as fases de crescimento lento se tornaram uma
recessão.
As duas últimas intervenções
do Fed [o Federal Reserve, o BC
americano, cortou os juros nos
dias 22 e 30 de janeiro], o pacote do presidente George W.
Bush e as exportações americanas, afetadas pela significativa
desvalorização do dólar recentemente, podem mudar o curso
da economia nos próximos meses, sobretudo se tiverem efeito
positivo sobre a confiança do
consumidor e do investidor e
estes continuarem consumindo e investindo. Alguns indicadores antecedentes, como os
pedidos de bens duráveis feitos
pelo comércio às indústrias,
mostram melhora.
FOLHA - Segundo os seus cálculos,
qual é a probabilidade de o Brasil entrar em recessão?
CHAUVET - Desenvolvi alguns
modelos para datar recessão no
Brasil em moldes similares ao
que uso para os EUA. No momento, para a maior parte das
variáveis brasileiras que utilizo,
só estão disponíveis dados até
novembro. Houve um decréscimo da produção industrial do
país em novembro, mas outros
itens tiveram crescimento nesse mesmo mês, como vendas,
emprego e renda real. Assim, a
probabilidade de recessão no
Brasil em novembro é de somente 6%.
FOLHA - Os fundamentos da economia brasileira se apresentam hoje
muito melhores do que nas últimas
grandes crises mundiais. Entretanto, não há consenso sobre quão protegido está o país das turbulências
externas. Na sua opinião, quais seriam as conseqüências de uma recessão nos EUA para o Brasil?
CHAUVET - Analisando períodos
anteriores, um crescimento
lento dos EUA não necessariamente afeta a economia brasileira. Já as recessões americanas são de fato relacionadas
com um crescimento negativo
da economia brasileira e dos
países do G7 (Canadá, França,
Alemanha, EUA, Japão, Reino
Unido e Itália) e da OCDE (Organização para a Cooperação e
o Desenvolvimento Econômico) também. Porém, tanto a
economia brasileira como as do
G7 e da OCDE se mostraram
menos sensíveis à última recessão americana, ocorrida em
2001.
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