São Paulo, quarta-feira, 06 de fevereiro de 2008

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Disputa pelos investidores externos fica mais acirrada

Crise reduz liquidez global e alguns bancos não recomendam investir no Brasil

Após a Bovespa ter um dos melhores desempenhos entre as Bolsas em 2007, alguns analistas consideram que preço de ações está alto

TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL

A crise nos mercados tornou escasso o dinheiro para países como o Brasil. Disputado, esse capital agora encontra concorrentes à altura em outros emergentes - como Rússia, Hungria, Polônia e África do Sul, vistos hoje como mais baratos- ou mesmo nos mercados maduros, que tiveram suas ações e dívidas desvalorizados nas últimas semanas.
Depois que a Bovespa subiu 43,65% em 2007, um dos melhores resultados entre as principais Bolsas, as ações brasileiras deixaram de ser vistas como pechincha, mas não há consenso se estão caras ou não.
Para os analistas que afirmam que os papéis brasileiros estão com um preço alto, uma evidência seria o chamado P/L -divisão do preço pelo lucro de uma empresa. A conta indica quanto tempo o investidor deve esperar para receber de volta o dinheiro aplicado -quanto maior o tempo, mais caro é o investimento. No caso da Bovespa, essa relação estava na sexta passada em 14,21, segundo a Bloomberg. Ou seja, para recuperar o capital colocado na Bolsa, o investidor deveria esperar o lucro de 14,21 trimestres.
Entre os países com empresas "mais caras" estão todos os emergentes asiáticos, que crescem acima de 6% ao ano desde o início da década. As ações listadas na Bolsa de Xangai tinham um P/L conjunto de 39,13 na sexta passada, seguido por Índia (24,76), Tailândia (18,96) e Coréia do Sul (15,07).
Já a Europa oriental tem papéis mais baratos que o Brasil, como Hungria (12,02), Polônia (11,93) e Rússia (11,42). A África do Sul também aparece como oportunidade, com 11,66.
"Toda vez que o mundo fica mais pobre, o dinheiro fica mais escasso e mais seletivo. O Brasil deixou de ser barato, mas Ásia e Oriente Médio estão caros. Não está claro que diminuirá a liquidez para o Brasil. Na crise, o risco-país aumentou menos do que o dos demais emergentes", disse Paulo Tenani, chefe de pesquisa para América Latina do banco suíço UBS.
"O Brasil continua sendo atrativo porque tem maior potencial de crescimento. A maior parte da economia da África do Sul está na mineração, muito dependente do crescimento mundial. A Europa do leste tem crescimento baixo e mercados [consumidores] pequenos", disse Luiz Ribeiro, gestor de fundos do HSBC.
Os bancos americanos Citibank e JP Morgan reduziram suas expectativas de valorização para ações no Brasil na semana passada. O Citi cortou sua previsão para o Ibovespa no final do ano de 80 mil para 67 mil pontos, sendo que poderia descer a 50 mil em caso de recessão nos EUA.
Sem citar o Brasil, o UBS disse que as ações de países emergentes podem recuar mais 12% devido à piora nas perspectivas de lucro. Para o UBS, as poucas oportunidades nos emergentes estão em Israel, Rússia, Taiwan, Polônia e México.
Para Fernando Exel, presidente da consultoria Economática, o Brasil pode ter um P/L alto, da mesma forma que o governo conseguiu reduzir os juros para 11,25% ao ano. "Eu me recuso a dizer que todos estão pagando caro pelas empresas [da Bovespa]. Na calculadora, o prêmio de risco é taxa de juro. Se o juro está mais baixo, o risco [de todo o sistema] está baixo. A mudança talvez seja histórica e tão especial quanto é a taxa de juro brasileira nunca ter sido tão baixa", disse.
Ricardo Amorim, diretor de análise de países emergentes do West LB, afirma que o estrangeiro lucra com o Brasil tanto com a valorização das ações quando com o câmbio após trazer dinheiro ao país. "O Brasil é uma aposta de risco e de retorno mais alto. Quando a coisa anda bem, você ganha mais. Quando vai mal, você perde muito", disse.
Conhecido como um dos mais pessimistas no mercado, o economista Marcelo Ribeiro, da Pentágono Asset, teme que o corte agressivo nos juros americanos estimule a entrada de dinheiro nos EUA, levando a uma valorização do dólar e das ações americanas.
"Não faz sentido o Brasil ter se beneficiado tanto do crescimento global nos últimos anos e agora se descolar do mundo. O Brasil vai perder na mesma proporção com que ganhou. Podemos ter o mercado acionário americano subindo, e os emergentes, Brasil incluído, caindo. Será o descolamento reverso", disse, referindo-se à tese do "descolamento", em que os países emergentes seriam pouco prejudicados pela desaceleração nos EUA.
Para Fabio Akira, economista do JP Morgan, o comportamento do câmbio mostra que o fluxo de dinheiro para o Brasil deve seguir firme, apesar de ter desacelerado para novos IPOs [oferta inicial de ações] e papéis de maior risco. "No caso dos IPOs, sobraram só empresas menores, de pouco interesse. Continuo otimista em relação aos fundamentos da economia brasileira. Pode ter havido algum exagero [na Bolsa], mas o fluxo deve continuar alto."


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