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São Paulo, domingo, 06 de abril de 2003

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GOVERNO LULA CEM DIAS

Juros altos elevam ganhos das instituições financeiras e prejudicam indústria e consumidor, que perde emprego e vê renda cair

Bancos saem na frente, e trabalhador perde

FÁTIMA FERNANDES
CLAUDIA ROLLI

DA REPORTAGEM LOCAL

Nos cem primeiros dias do governo Luiz Inácio Lula da Silva, perderam o trabalhador, o consumidor, o comércio e setores industriais que dependem do mercado interno. Ganharam os exportadores, o setor agrícola, bancos e financeiras.
É o que mostram os principais indicadores econômicos do país no primeiro trimestre -um período marcado pelo aprofundamento do aperto nos juros e do corte de gastos públicos, pela alta da inflação e pelo reequilíbrio das contas externas por meio de um aumento nas exportações.
Nos últimos três meses, a taxa básica de juros da economia (a Selic) aumentou de 25% para 26,5% ao ano. O superávit primário -esforço que o governo faz para pagar os juros de sua dívida- subiu de 3,75% para 4,25%. A inflação se manteve elevada. O IPCA, do IBGE, está estimado em 4,79% (considerando uma taxa de 0,90% para março). Em igual período do ano passado, foi de 1,49%.
As medidas econômicas adotadas pelo governo favoreceram o Brasil no mercado externo. O risco-país, índice que mede a credibilidade dos papéis brasileiros, caiu de 1.446 para 940 pontos entre 31 de dezembro e sexta-feira.
Dentro do país, porém, as medidas do novo governo ainda não resultaram em estímulo para a economia. O rendimento médio do trabalhador em seis regiões metropolitanas do país caiu de R$ 894,83 em dezembro de 2002 para R$ 849,50 em fevereiro deste ano, segundo o IBGE. A estimativa é que esse valor tenha continuado a cair em março deste ano.
O comércio foi negativamente afetado não só pela queda da renda dos trabalhadores mas também pelos juros. Nos três primeiros meses deste ano, as consultas ao SPC (Serviço de Proteção ao Crédito), indicador das vendas a prazo, caíram 1,4% em São Paulo em relação a igual período de 2002, segundo a Associação Comercial de São Paulo.
"Os primeiros cem dias de Lula foram ruins, sim, para o consumidor e para o comércio. Mas a responsabilidade disso não é só do governo petista. É também do governo passado", afirma Emílio Alfieri, economista da ACSP.
Na indústria, que representa cerca de 35% do PIB brasileiro, quem mais perdeu no primeiro trimestre foram os setores eletroeletrônico e de construção civil, além de outros segmentos que dependem das vendas no mercado interno. O INA (Indicador do Nível de Atividade da Indústria de Transformação), medido pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), caiu 0,26% em fevereiro na comparação com o mês anterior.
Apesar de a economia estar retraída, economistas e empresários dizem que Lula acertou ao aprofundar a estratégia do ex-presidente FHC para recuperar a confiança dos investidores.
"Os primeiros cem dias do governo servem para preparar as mudanças. Não dá para desviar a direção de um Boeing de uma hora para outra sem que ninguém se machuque. É preciso de um certo prazo para fazer alteração na rota", afirma Alberto Borges Matias, presidente da ABM Consulting.
Ainda assim, alguns setores não têm do que reclamar. Beneficiadas pela prioridade do governo de corrigir suas contas externas, as exportações cresceram 26,5% no primeiro trimestre (US$ 15,04 bilhões). O superávit de US$ 3,76 bilhões na balança comercial, registrado no primeiro trimestre deste ano, é quase o mesmo alcançado em todo o primeiro semestre do ano passado (US$ 3,79 bilhões).
"São Pedro deve ser petista. Se não fossem as chuvas, a safra da soja não seria tão farta. Além disso, se não fosse a guerra entre os EUA e o Iraque, não teria aumentado a demanda mundial de grãos e as cotações internacionais não estariam num patamar mais elevado", afirma José Augusto de Castro, diretor da AEB, associação dos exportadores.

Vedete
O setor agrícola já vem sendo a vedete da pauta de exportações brasileiras há pelo menos dois anos. Os preços no mercado internacional são favoráveis porque houve redução nos estoques mundiais de grãos, principalmente no caso da soja. A previsão da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) é que vá haver um acréscimo de US$ 1,8 bilhão nas exportações de grãos, farelo e óleo de soja neste ano, que somaram US$ 6 bilhões em 2002.
Outro setor que se beneficiou neste primeiro trimestre foi o bancário. O aperto monetário adicional engordou o caixa das instituições financeiras. Se a taxa básica da economia (a Selic) sobe, os bancos também cobram mais pelos empréstimos às empresas e aos consumidores - e ganham mais em suas operações.
Os juros cobrados no cheque especial no mês passado, segundo o Procon, foram os maiores desde março de 2000. A taxa média mensal, que era de 8,85% em dezembro de 2002, passou para 9,44% em março. Nos empréstimos pessoais, a alta foi de 5,93% para 6,10% no período.


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