São Paulo, quinta-feira, 06 de abril de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

O Brasil pode crescer mais?

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O período Malan-Palocci foi um fracasso em termos de crescimento. Entre 1996 e 2005, o nosso PIB per capita aumentou em média apenas 0,7% ao ano, uma das menores taxas de crescimento do mundo, segundo levantamento recente da CNI.
O que explica essa performance lamentável? De 1995 a 2002, o problema central foi a vulnerabilidade das contas externas, que resultou da combinação de câmbio sobrevalorizado (até o início de 1999) e abertura unilateral da economia (redução de tarifas e outras barreiras à importação).
Depois de 2003, o balanço de pagamentos deixou de ser a principal restrição. O quadro internacional tornou-se francamente favorável, tanto no plano comercial como no financeiro. Além disso, com as inevitáveis defasagens temporais, as empresas brasileiras responderam vigorosamente ao estímulo proporcionado pela depreciação cambial iniciada em 1999, conquistando mercados no exterior e substituindo importações no mercado interno.
No subperíodo Palocci, o que conteve o crescimento foi fundamentalmente a adoção de políticas macroeconômicas exageradamente restritivas. Prevaleceu uma mentalidade hipercautelosa, que dava prioridade quase absoluta ao combate à inflação e procurava bajular permanentemente os mercados financeiros.
Repare, leitor, que essa é uma interpretação otimista. Nos parágrafos anteriores, está implícita a tese de que o baixo crescimento não tem raízes estruturais. Não é o que pensam outros economistas. Muitos acreditam que o Brasil só crescerá de forma sustentada se passar por reformas profundas, demoradas e politicamente difíceis. Não nego, é claro, que o país precisa de diversas reformas (por exemplo: a reforma tributária, a reforma financeira, a reforma do sistema político). Afirmo apenas que a retomada do crescimento não pressupõe essas reformas e que ela depende, fundamentalmente, de uma reorientação das políticas macroeconômicas. Reorientação que teria dois objetivos: estimular a demanda agregada (especialmente os investimentos produtivos) e impedir o reaparecimento da vulnerabilidade externa.
Estou sonhando? Não creio. A economia possui grande capacidade ociosa. A indústria brasileira opera atualmente com cerca de 80% da capacidade instalada, segundo a CNI. E esses dados tendem a subestimar a efetiva capacidade de produção da indústria. Em resposta a um estímulo de demanda, os níveis de produção podem aumentar para além da "capacidade instalada", mesmo sem grandes investimentos, com base em aumento no número de turnos de trabalho, investimentos marginais e outras adaptações do processo produtivo.
O desemprego da força de trabalho também é alto, apesar da diminuição recente. As taxas de desemprego total (que incluem desemprego aberto, desemprego por trabalho precário e desemprego por desalento) são muito elevadas. Na Região Metropolitana de São Paulo, o desemprego total alcança 16%. No Distrito Federal, 19%. Em Porto Alegre, 13%. Em Recife, 21%. Em Salvador, 24%.
Não há risco apreciável de inflação de demanda. A taxa de inflação brasileira está razoavelmente controlada, situando-se próxima à média dos principais países emergentes e não muito acima da média dos países desenvolvidos.
Os resultados de balanço de pagamentos continuam favoráveis, apesar da apreciação do real. O superávit comercial ainda será muito elevado em 2006. E tudo indica que o balanço de pagamentos em conta corrente será superavitário pelo quarto ano consecutivo, algo muito raro, talvez inédito, na história econômica brasileira.
Há muito tempo que não se vê uma configuração macroeconômica tão favorável ao crescimento vigoroso dos níveis de atividade e de emprego.
Faltou, até agora, governo para aproveitá-la.


Paulo Nogueira Batista Jr., 51, economista e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional: Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
E-mail - pnbjr@attglobal.net


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